Economia

Presidenciáveis têm projetos antagônicos sobre o futuro de estatais

Enquanto Bolsonaro propõe a privatização de empresas para reduzir a dívida pública, Haddad pretende reestatizar companhias com venda em curso. Para especialistas, ambas as propostas não podem ser implementadas da forma como estão

Simone Kafruni
postado em 10/10/2018 06:00
Enquanto Bolsonaro propõe a privatização de empresas para reduzir a dívida pública, Haddad pretende reestatizar companhias com venda em curso. Para especialistas, ambas as propostas não podem ser implementadas da forma como estão
O país fechou o ano passado com 144 empresas estatais federais, das quais 18 totalmente dependentes de recursos do Tesouro Nacional, e mais de 500 mil funcionários públicos. Além de sofrerem com ingerência política e servirem como cabide de empregos, companhias como Petrobras, Eletrobras, Correios, Caixa Econômica Federal e Valec, entre outras, já foram ou são alvo de escândalos de corrupção. Os programas de governo dos dois candidatos à Presidência da República ; Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL) ; são antagônicos no que diz respeito ao futuro das estatais. Para especialistas, no entanto, as propostas de ambos são extremistas e não poderão ser implementadas da forma como foram apresentadas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Bolsonaro promete reduzir em 20% a dívida pública por meio de privatizações de estatais, além de concessões e venda de propriedades imobiliárias da União. No plano, não fica claro quais serão extintas, quais serão vendidas e quais são consideradas estratégicas e permanecerão sob o controle do Estado. Sobre a Petrobras, propõe a venda de ;parcela substancial de sua capacidade de refino, varejo, transporte e outras atividades;. Sobre a política de preços de combustíveis, o plano diz que a paridade com o mercado internacional será mantida, com ;suavização de flutuações de curto prazo;.
Haddad, ao contrário, promete revogar todas as privatizações em curso, inclusive as do setor elétrico. O PT considera a Petrobras uma empresa ;estratégica para o desenvolvimento; e quer a companhia verticalizada, com atuação em exploração, produção, transporte, refino, distribuição e revenda de combustíveis. O programa propõe reverter o plano de desinvestimentos em curso, é contra a paridade de preços internacionais e a favor do regime de partilha no pré-sal.

Para Sérgio Lazzarini, professor de estratégia do Insper, o histórico de interferência política e cabide de empregos das estatais fez com que a ;turma liberal queira acabar com tudo;. ;O PT tem um discurso de que estatal tem objetivo social;, afirmou. No entanto, ressaltou Lazzarini, nenhum dos dois planos são exequíveis. ;Há limites para o que se consegue privatizar. Não dá para vender a Embrapa, por exemplo. A Infraero, ao lidar com aeroportos menores, ficará sem receita própria e não vai despertar interesse;, estimou. Já a privatização do setor elétrico poderia ser mantida. Sobre a Petrobras, o especialista observou que a atividade de refino pode ser feita pelo setor privado, sem prejuízo para o setor considerado estratégico. ;A questão é que nada disso pode ser feito a toque de caixa;, ressaltou. O programa de Bolsonaro prevê acabar com a dívida pública em um ano com as privatizações.

Na opinião do especialista em finanças públicas da Tendências Fabio Klein, os governos petistas criaram muitas estatais. ;Bolsonaro tem uma agenda mais liberal e privatizante, ainda que não esteja claro quais serão vendidas. Ele fala em manter uma ;golden share; nos setores estratégicos;, assinalou. Klein destacou que há muitas empresas dependentes do Tesouro, que está em situação complicada. ;Por outro lado, é por meio das estatais que ocorre a maior parte dos investimentos públicos;, ponderou.

O economista Bruno Lavieri, da 4E Consultoria, afirmou que os dois planos de governo não sinalizam nada de concreto. ;Não são peças a serem levadas 100% a sério, mas há uma diferença muito grande entre os dois. O Paulo Guedes (criador do plano de Bolsonaro) quer privatizar a maior parte das estatais, mas isso depende do interesse do setor privado. O PT tem uma característica estatizante, mas o Haddad tem uma formação em economia mais esclarecida nessa área. Com a necessidade de formar alianças, os planos podem mudar;, alertou.

Relevância


A privatização ganhou relevância, segundo o ex-ministro de Infraestrutura do governo Collor João Eduardo Santana, porque o Estado está quebrado. ;Todas as estatais pesam aos cofres públicos. Nas deficitárias, é dinheiro na veia. Mesmo as que geram receita precisam de injeção de capital;, lembrou. O especialista disse que o diagnóstico de Bolsonaro é mais claro, com venda, extinção e manutenção de estratégicas. ;O PT fala em rever a posição sobre algumas estatais, mas também não diz quais;, pontuou.

O presidente da InterB, Claudio Frischtak, criticou a ideia de Bolsonaro de fazer as privatizações de forma rápida. ;O processo de desestatização demora de cinco a 10 anos. São muitas estatais, cada uma com sua peculiaridade. Algumas sequer têm valor;, sublinhou. O especialista considerou ;muito difícil Haddad embarcar num cronograma de desestatização;. ;A verdade é que nenhuma das campanhas teve tempo para estruturar um programa com começo, meio e fim.

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