Economia

Ações da Eletrobras disparam com a perspectiva de privatização

Indicações de que a equipe econômica de Jair Bolsonaro deve se empenhar pela privatização da estatal fazem ações da companhia disparar 8,6% na bolsa. Presidente eleito, porém, havia criticado a desestatização da empresa

Simone Kafruni, Hamilton Ferrari
postado em 17/11/2018 07:00
Usina hidrelétrica
A sinalização de que a equipe econômica do presidente eleito Jair Bolsonaro vai se empenhar para concretizar a privatização da Eletrobras provocou euforia no mercado. As ações da estatal ajudaram a impulsionar o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), com a disparada de 8,6% dos papéis no pregão de ontem. O time de economistas do novo governo aponta para uma discussão firme sobre a desestatização da economia, mas ainda será preciso passar pelo próximo ocupante do Palácio do Planalto, que já se mostrou desfavorável à venda da holding do setor elétrico.

A permanência do secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, no cargo também indica a continuidade do processo de privatização da estatal. Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, ele afirmou que, caso o processo de desestatização não seja concretizado, a União teria de cortar R$ 12 bilhões do orçamento de outras áreas em 2019. Mansueto destacou que a equipe econômica de Bolsonaro está dialogando com a do atual governo para viabilizar a operação.
Infográfico sobre a Eletrobras
;Para mim, a privatização da Eletrobras é uma solução ganha-ganha, inclusive porque o governo federal não dispõe de recursos para aplicar no setor;, disse o secretário do Tesouro. Ele também ressaltou que a decisão é ;política;. Em outubro, durante a campanha presidencial, Bolsonaro afirmou ser contrário à privatização das geradoras de energia. Na época, ressaltou que o Brasil não pode deixar o setor elétrico do país ;na mão da China; e que poderia ;conversar; sobre a desestatização das distribuidoras.

O ex-ministro da Infraestrutura, João Santana, assinalou que a insegurança é grande porque, a dois meses de um novo governo, não há clareza sobre o futuro da Eletrobras. ;Não vimos, ainda, nenhuma ação no sentido da privatização. Os comentários são genéricos;, criticou.

Opinião


Glauco Legat, analista da Spinelli Corretora, destacou que, apesar de Bolsonaro criar barreiras para que a privatização seja concretizada, é possível que mude de ideia. ;Há uma certa incógnita, porque sabemos que as declarações têm um peso grande. Um aspecto que dá suporte à desestatização é que ele se mostrou uma pessoa aparentemente maleável. Foi e voltou em vários pontos, obviamente, em outros contextos, ou seja, pode mudar de opinião;, afirmou.

Legat assinalou que deixar o segmento de geração de energia de fora do plano de privatização ;tira parte do brilho; do processo, já que a área tem um peso expressivo. A sinalização de que vão dar continuidade à venda de empresas de distribuição agrada. ;Se a posição do Bolsonaro não for alterada, já há um incentivo grande. A participação do governo diminuiria e ficaria a cargo de um player privado, que poderá executar uma gestão melhor;, disse o especialista. Recentemente, a Eletrobras divulgou o balanço do terceiro trimestre de 2018, que apresentou prejuízo de R$ 1,6 bilhão.

Para a economista e advogada Elena Landau, ex-conselheira da Eletrobras, a venda da estatal é vital para destravar o setor. ;Se a privatização dela será considerada prioridade pelo próximo governo, não sei. Mas não se vende a Eletrobras sem vender antes a Amazonas Energia e a Ceal (Companhia Energética de Alagoas);, destacou.

O leilão da Amazonas está marcado para 27 de novembro e o da Ceal está suspenso até a reversão da decisão liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) em ação movida contra a União pelo estado de Alagoas. Como o Projeto de Lei n; 10.332/2018, que resolvia pendências para a privatização da Amazonas, foi derrubado pelo Senado, o governo editou duas medidas provisórias na última quarta-feira. A primeira, MP n; 855, tenta tornar a distribuidora mais atrativa, solucionando algumas dívidas e dando fôlego de cinco anos para o novo operador arrumar a casa. A outra, MP n; 856, determina que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) escolha uma operadora provisória para garantir a continuidade dos serviços, caso o leilão seja um fracasso, o que provocará a liquidação da companhia em 31 de dezembro de 2018.

Decisão estratégica


O discurso de Mansueto Almeida reproduz o que está no relatório que o Ministério do Planejamento do governo Michel Temer entregou à equipe de transição. Dentre os 15 temas estruturantes e grandes desafios a serem enfrentados pelo próximo governo, a privatização da Eletrobras é considerada decisão estratégica, com efeitos de curto e médio prazos. Tanto que o documento destaca somente a venda da companhia elétrica como prioridade, embora a Secretaria do Programa de Parcerias de Investimento de Michel Temer tenha outras privatizações qualificadas.

Além do impacto fiscal da ordem de R$ 12 bilhões a R$ 14 bilhões em 2019 com a venda da companhia, o relatório apontou que, a médio prazo, a privatização implica recuperar a capacidade de a empresa investir no setor de energia de forma competitiva. Segundo o documento, a estatal é a maior holding do setor elétrico da América Latina e uma das cinco maiores geradoras hidrelétricas do mundo, com 30,7% da capacidade de geração do país e 70,3 mil quilômetros de linhas de transmissão, 51,7% do total.

Ao justificar a necessidade da privatização, o relatório apresenta os dados financeiros da empresa (veja no quadro). E acrescenta: ;o cenário econômico-financeiro da Eletrobras restringe a atuação da companhia na expansão da oferta de geração e transmissão de energia elétrica, o que se torna oneroso à sociedade por diminuir a competição no mercado em decorrência da limitação de um grande competidor.;


Troca de mãos


Em julho de 2018, foi realizado o leilão de privatização da Companhia Energética do Piauí (Cepisa). Em lance único, a empresa foi vendida para o grupo Equatorial, que ofertou 119% de deságio, o que representa: 8,5% de redução da tarifa dos consumidores de energia do Piauí; assunção pela empresa de dívida de R$ 878 milhões, sem repasse para as tarifas; e pagamento de R$ 95 milhões ao Tesouro a título de outorga. Em 30 de agosto ocorreu o leilão das distribuidoras de Rondônia (Ceron), Acre (Eletroacre) e Roraima (BV Energia). As duas primeiras foram arrematadas pelo Grupo Energisa, que apresentou proposta com deságio sobre a tarifa de 21% para a Ceron e de 31% para a Eletroacre. A BV Energia foi arrematada sem deságio pelo Consórcio Oliveira Energia.

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