Além do reajuste de 16,38% para os salários do Judiciário, aprovado pelo Congresso e sancionado ontem pelo presidente Michel Temer, vários outros projetos em tramitação no Legislativo podem pesar sobre as contas públicas a partir do próximo ano e complicar os planos no novo governo de reduzir significativamente o deficit fiscal, previsto em R$ 139 bilhões. Considerando apenas as propostas mais recentes, aprovadas ou na pauta dos parlamentares, os valores superam a casa dos R$ 50 bilhões.
Pelas contas de especialistas, o impacto do reajuste do Judiciário no Orçamento da União será em torno de R$ 1,5 bilhão por ano, mas o efeito cascata nos estados e municípios pode chegar a R$ 6 bilhões anuais. O programa Rota 2030, que define incentivos para a indústria automobilística, deve gerar uma renúncia fiscal de R$ 3,75 bilhões entre 2018 e 2019. Somente essas duas medidas, já aprovadas, elevarão os gastos em R$ 5,25 bilhões anuais a partir do ano que vem. Mas isso é apenas a ponta do iceberg.
Na lista de itens colocados na pauta em regime de urgência está um projeto de lei do senador Eunício Oliveira (MDB-CE) que amplia em 10 anos o prazo de benefícios fiscais para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, o PL n; 10.160/2018. Pelas estimativas de um consultor legislativo, se a proposta passar, o custo anual para União será de R$ 9 bilhões por ano.
Especialistas, contudo, alertam sobre um projeto mais perigoso que pode ser incluído na pauta a qualquer momento pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). É o PLP 511/2018, que altera a Lei Kandir com a finalidade de compensar os estados pela isenção do ICMS nas exportações e cria uma despesa anual para o governo federal de R$ 39 bilhões. Somando isso aos três itens anteriores, a conta para o próximo ano fica em R$ 53,25 bilhões.
O valor praticamente consumiria toda a receita que União e estados podem obter com outro projeto sob análise do Legislativo, o PLP n; 459/2017, que permite a securitização da dívida pública. A proposta teve requerimento de urgência pedido pelos líderes e está na pauta do plenário da Câmara para ser votado.
Mas a conta pode não parar por aí. Outro projeto da pauta que pode acarretar perda de receitas, segundo os consultores legislativos, é o PLP n; 420/2014, que inclui mais empresas no regime simplificado de cobrança de impostos, o Simples Nacional. A proposta cria a Empresa Simples de Crédito (ESC) para operar com empréstimos, financiamento e de desconto de títulos de crédito (factoring) exclusivamente para microempreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte.
Desafios
O Simples é a maior renúncia fiscal da União. No Projeto de Lei Orçamentária de 2019, os subsídios tributários somam R$ 306,4 bilhões, dos quais R$ 87,3 bilhões se referem ao Simples. ;Há uma falta de solidariedade do Legislativo e do Judiciário diante da situação gravíssima das contas públicas, sem que o Executivo tenha qualquer possibilidade de conter esse movimento de fim de mandato;, lamentou Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas.
;O cenário fiscal é desafiador e o atual balanço de riscos traz preocupações adicionais. O cumprimento da regra de ouro também vai ser colocado à prova;, alertou o economista Gabriel Leal de Barros, diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado. Essa regra, prevista na Constituição, proíbe que a União emita títulos para cobrir despesas correntes.