Economia

Merkel vê acordo entre Mercosul e UE mais distante com Bolsonaro

Chanceler alemã diz que governo de Jair Bolsonaro tornará mais difícil a conclusão das negociações de livre comércio entre os dois blocos, que já duram duas décadas. Especialistas avaliam que europeus não querem ceder na área de produtos agrícolas

Rosana Hessel
postado em 13/12/2018 06:00
Para Angela Merkel, o tempo para concluir um tratado está se esgotando

A chanceler alemã, Angela Merkel, afirmou ontem que o tempo para a conclusão de um acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul está se esgotando. Na avaliação dela, o governo do presidente eleito, Jair Bolsonaro, tornará o tratado de livre comércio entre os dois blocos mais difícil de ser alcançado. Procurada, a assessoria do futuro ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, não respondeu aos contatos do Correio até o fechamento desta edição.

O ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, evitou comentar as declarações de Merkel, mas disse que o Brasil está empenhado na conclusão do acordo. Segundo ele, o ministro Aloysio Nunes (das Relações Exteriores) está pessoalmente empenhado na negociação. ;Tenho acompanhado todos os temas de maneira muito próxima e estamos dando todos os sinais de que Brasil tem vontade e disposição de fechar o acordo, mas os dois lados têm de querer;, disse Guardia, ontem, durante café da manhã com jornalistas.

Desde segunda-feira, técnicos do Mercosul e da UE estão reunidos no Uruguai em busca de um entendimento. De hoje até dia 16, serão realizadas em Montevidéu as reuniões preparatórias da cúpula do Mercosul, que ocorre dia 18. Os países-membros buscam, entre outras coisas, elaborar um protocolo de boas práticas regulatórias no bloco e atualizar o fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul (Focem).

Na avaliação de especialistas, os europeus estão arrumando uma desculpa para não fechar o acordo, porque o Mercosul já cedeu mais do que devia neste ano e, agora, os países sul-americanos esperam um movimento da UE. ;O maior problema é na área agrícola, onde os europeus, principalmente a França, não querem ceder e estão impondo cotas menores do que as propostas anteriormente;, disse Welber Barral, da consultoria Barral MJorge.

Para Barral, resta ao Mercosul olhar para acordos com outros parceiros, como Coreia do Sul, Canadá e México, que estão sendo engatilhados. ;Não há como fechar o acordo UE-Mercosul em pleno fim de governo. Tudo é um jogo de cena;, avaliou o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. ;Politicamente, para o Brasil, é importante que esse acordo saia, mas neste momento de transição, será muito difícil;, resumiu.

Mauro Rochlin, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), demonstrou preocupação com o futuro do Mercosul no próximo governo. ;As declarações de Bolsonaro e de Paulo Guedes (futuro ministro da Economia) sinalizam que o bloco deverá ficar em segundo plano, o que seria muito ruim para a indústria, pois a Argentina é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil e um importante destino de produtos manufaturados brasileiros;, explicou. Para ele, um novo adiamento do acordo Mercosul-UE pode enterrar o tratado de vez, pois, a partir do próximo ano as condições para novas negociações deverão ser piores.

O diretor de Desenvolvimento Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Eduardo Abijaodi, lembrou que as negociações duram duas décadas e que as conversas tinham progredido mais no passado, quando se discutia a Alca (Área de Livre Comércio das Américas). ;Hoje, não há interesse dos europeus em um acordo com o Mercosul, porque não há negociação de outra aliança de porte que possa implicar perda de mercado para eles. Se o novo governo sinalizar algum entendimento com os Estados Unidos, talvez a UE volte a mostrar interesse no Mercosul;, disse.


  • Temas sensíveis

    Agricultura
    ; A abertura está mais difícil para os Europeus, com a crise de popularidade do presidente da França, Emmanuel Macron, e com os impasses sobre a saída do Reino Unido do bloco, o chamado Brexit. A dificuldade é que os europeus abram o mercado para produtos, como carnes, açúcar, etanol e arroz. A Europa não cede e a proposta atual da UE apresenta retrocessos em relação ao que foi proposto no passado, segundo fontes próximas aos negociadores.

    Indústria
    ; As regras sobre questões de origem é um dos temas mais delicados nas negociações sobre bens industriais, uma vez que os países do Mercosul têm normas mais rígidas. No setor automotivo, por exemplo, os sul-americanos exigem um percentual maior de produção local do que os europeus, que são mais flexíveis para a eliminação das tarifas. Outro ponto que ainda não há acordo é sobre a indicação geográfica, que faz parte das negociações sobre propriedade intelectual. O Brasil, por exemplo, não poderia usar o termo queijo parmesão ou presunto Parma para os produtos nacionais, pois o termo seria de propriedade somente para aqueles feitos em Parma, na Itália.

    Serviços
    ; A dificuldade de costurar um acordo para o livre comércio atinge os serviços marítimos, que prevê a abertura do mercado de transporte marítimo para navios de bandeira europeia. Neste ponto ainda não há avanço, apesar de os europeus terem grande interesse.

    Fonte: CNI

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