Economia

Novo governo dará palavra final sobre Embraer e Boeing

Termos da venda do controle da divisão de aeronaves comerciais da fabricante brasileira para a gigante americana foram definidos ontem. Negócio está avaliado em US$ 5,3 bilhões

Paula Pacheco/Estado de Minas
postado em 18/12/2018 06:00

O negócio entre Embraer e Boeing prevê também a criação de uma segunda joint-venture, responsável por negociar a venda do avião cargueiro militar KC-390São Paulo ; Um acordo entre Michel Temer e Jair Bolsonaro pode selar a venda do controle da divisão de aviação comercial da Embraer para a americana Boeing. As duas empresas anunciaram ontem que acertaram os termos do negócio, avaliado em US$ 5,3 bilhões. O valor exclui a parceria no projeto do KC-390.

A União é dona da chamada ;golden share; (ou ação de ouro, que tem o poder de vetar a negociação) e caberá a ela dar a palavra final sobre a venda. Faltando duas semanas para Jair Bolsonaro (PSL) e sua equipe serem empossados, a decisão praticamente já não é considerada entre as tarefas finais do governo Michel Temer (MDB).

No início da noite de ontem, o vice-presidente eleito, general Hamilton Mourão, disse que se Temer procurar Bolsonaro para conversar sobre o acordo, o aval do governo brasileiro à operação poderá sair rapidamente, segundo informações do jornal O Estado de S. Paulo. O militar defendeu a união entre Boeing e Embraer e disse que é ;fundamental; à companhia brasileira ter um ;peso pesado ao lado dela;.

;O negócio pode ser decidido de comum acordo se o presidente Michel Temer procurar o presidente Jair Bolsonaro, os dois conversarem e concordarem. Aí, já podem fechar isso;, comentou Mourão, que defende o sinal verde para o negócio por acreditar ser ;fundamental para a Embraer diante da concorrência a que ela está exposta internacionalmente.; O vice-presidente eleito se referiu à competidora canadense Bombardier, aliada da Airbus.

Secretário do Tesouro Nacional de Temer e nome já confirmado para seguir no cargo na próxima administração, Mansueto Almeida afirmou ontem, durante o Correio Debate, realizado pelo Correio Braziliense, que o governo tem de analisar as implicações do negócio à golden share. Ele integra o grupo de trabalho do governo que estava analisando o caso Boeing-Embraer.

Essa análise é feita pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Na etapa seguinte, segue para o titular do Ministério da Fazenda ; no caso, Paulo Guedes, o futuro ministro da Economia ; que encaminhará a avaliação para o presidente da República. Cabe ao governo analisar se o acordo entre as duas companhias prejudica de alguma forma as exigências previstas na ação especial.

De acordo com Almeida, a tendência é que o governo permaneça com a golden share da Embraer, mantendo a influência sobre o restante da companhia que não foi alvo do acordo de venda para a Boeing. ;Não sei se dá tempo em uma ou duas semanas. Então talvez seja um processo que tenha começado agora e termine no início do próximo governo;, diz Mansueto.

Depois de a União se manifestar sobre o negócio, será preciso que os acionistas aprovem a proposta, que será encaminhada para avaliação das autoridades regulatórias.

No mesmo evento, Carlos da Costa, futuro secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade, afirmou que o Brasil precisa dar um ;salto de competitividade global e de produtividade, fazendo com que as melhores práticas internacionais sejam internalizadas;. No entanto, ele evitou dizer que o negócio entre Embraer e Boeing poderia ajudar nesse objetivo. ;Temos de avaliar com cuidado.;

Embraer e Boeing divulgaram a assinatura do memorando de entendimento em julho. O acordo prevê que a Boeing terá 80% da companhia a ser criada com a divisão de aviação comercial da Embraer. A empresa brasileira, com sede em São José dos Campos (SP), ficará com os 20% restantes e terá poder de decisão sobre ;alguns; temas estratégicos, informou a Embraer em comunicado ao mercado, divulgado ontem. Segundo os cálculos da fabricante, o resultado da operação, líquido de custos de separação, será de US$ 3 bilhões.

As empresas informaram ainda que esperam pela aprovação do governo brasileiro para que o negócio possa avançar. Até o início da semana passada, havia uma incerteza sobre o futuro da aliança, já que a Justiça havia concedido uma liminar que impedia que as companhias seguissem em negociação. O Tribunal Regional Federal (TRF) da 3; região revogou essa liminar no dia 10.

Assim que o anúncio foi divulgado, as ações da fabricante brasileira de aviões subiram. Isso aconteceu porque os analistas apontaram uma melhora no valor atribuído para toda a divisão de jatos comerciais da Embraer em relação ao memorando, que passou de US$ 4,75 bilhões para US$ 5,26 bilhões.

Caixa

Os executivos da Embraer afirmaram durante teleconferência com analistas que a companhia terá US$ 2,6 bilhões em caixa assim que o acordo com a Boeing for concluído. Eles informaram ainda que seus atuais títulos de dívida serão movidos para a joint-venture. Entre os temas estratégicos em que a companhia brasileira poderia ter poder decisório estaria uma eventual transferência das operações locais da joint-venture.

A parceria não deverá ter impacto no lucro por ação da Boeing em 2020. A partir daí, passará a ter impacto positivo nos anos seguintes. As sinergias anuais com a joint-venture devem chegar a cerca de US$ 150 milhões até o terceiro ano de operação.

Assim que a transação for concluída, a joint-venture da divisão de aviação comercial será liderada por uma equipe de executivos sediada no Brasil e incluirá um presidente e um CEO. Caberá à Boeing o controle operacional e de gestão da nova empresa, que responderá ao atual CEO e presidente da companhia americana, Dennis Muilenburg.

O acordo na divisão comercial dá à Embraer a opção de vender sua participação a qualquer momento. No entanto, os termos preveem um período de ;lock up; de 10 anos (prazo em que os papéis não poderão ser vendidos, a partir da assinatura do contrato) e, caso a Embraer exerça a opção antes disso, o preço por ação a ser pago será igual ao da data de fechamento do negócio, ajustado pela inflação nos Estados Unidos. O preço será o do valor justo no momento do exercício, informaram as empresas.

Paulo César de Souza e Silva, presidente da Embraer: Em teleconferência, Paulo Cesar de Souza e Silva, presidente e CEO da Embraer, afirmou que a empresa está confiante no valor que a parceria trará para o Brasil e para a indústria aeroespacial brasileira. ;A aliança fortalecerá ambas as empresas no mercado global e está alinhada à nossa estratégia de crescimento sustentável de longo prazo;. O executivo brasileiro disse ainda que ;juntos, daremos mais valor aos acionistas, clientes e brasileiros em geral;. O acordo, disse, cria o maior grupo de aviação do mundo.

O negócio entre Embraer e Boeing prevê também a criação de uma segunda joint-venture, responsável por negociar a venda do avião cargueiro militar KC-390, a maior aeronave já desenvolvida no Brasil. Nessa empresa, a Embraer terá 51% de participação, cabendo à Boeing os 49% restantes.

Ambas entrarão com dinheiro e com ativos na nova empresa. Segundo o acerto entre as duas companhias, a Embraer permitirá que a ;joint-venture KC-390 tenha acesso às informações requeridas para que a JV KC-390 opere seus negócios;, conforme comunicado divulgado ontem. Caso todas as aprovações aconteçam, a expectativa é de que o processo esteja concluído no final de 2019.

Bolsa

Com a aprovação da operação, a Embraer seguirá como uma companhia aberta brasileira, registrada na Categoria A, e com ações listadas no segmento especial do Novo Mercado da B3. A União continuará com os direitos que têm segundo a sua titularidade sobre a ação ordinária de classe especial de emissão da fabricante de aviões (a golden share), como prevê o estatuto social da companhia.

Ainda segundo o comunicado da companhia, os negócios relativos a defesa e segurança e a jatos executivos ;não serão segregados para a nova sociedade e permanecerão sendo desenvolvidos e realizados pela Embraer;.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação