Hamilton Ferrari
postado em 20/01/2019 08:00
O discurso de austeridade dos gastos transbordou a Esplanada e passou a ser prioridade também dos bancos públicos. O ministro da Economia, Paulo Guedes, escalou dois comandantes liberais para as instituições públicas, que prometem uma nova era no setor. A intenção da equipe é deixar a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil (BB) com mais cara de empresa, ao reduzir subsídios e aplicar taxas de mercado. O governo terá, também, uma tarefa árdua para aumentar a competitividade no setor, que está concentrado nas mãos de cinco instituições financeiras.
A missão será ;desestatizar; o mercado de crédito, ou seja, reduzir a participação pública nos empréstimos em 2019. O crescimento econômico mais forte deve permitir que o estoque de financiamentos seja o maior dos últimos cinco anos.
De acordo com os presidentes da Caixa, Pedro Guimarães, e do BB, Rubem Novaes, é necessário ampliar a concorrência no mercado de crédito e fazer com que os recursos cheguem aos que mais precisam, como consumidores de baixa renda e empresas menores. Economistas ressaltam que o discurso mostra a continuidade de um trabalho que já vinha sendo feito.
A principal preocupação dos presidentes empossados é com o desempenho financeiro dos bancos públicos, deixando-os com mais cara de empresa privada. O BB é uma instituição de capital aberto e, segundo Novaes, passará a ser mais ;compatível com o interesse de acionistas minoritários;. O dirigente ressalta que é preciso vender alguns ativos, desde que não sejam as ;joias da coroa; e sinaliza que há uma posição do governo eleito de diminuir subsídios para financiar o setor agrícola com juros mais baixos, mas que ainda não há definições.
Dívida
O presidente da Caixa deu mais detalhes de como será a gestão no banco. A intenção é adotar políticas que reduzam a dívida da instituição com o governo federal, que é de R$ 40 bilhões. Guimarães ressalta que pretende quitar o pagamento em quatro anos. A estatal deverá vender participações em áreas, como seguros e loterias, reforçar o financiamento imobiliário via mercado de capitais e investir em microcrédito a juros mais baixos.
;É fundamental discutir a parte imobiliária. Hoje temos problemas de funding. Via mercado de capitais, vamos vender de R$ 50 bilhões a R$ 100 bilhões para a Caixa continuar ofertando esse crédito;, diz o executivo. ;Não me conformo em ver pessoas tomando dinheiro a 15%, 20% ao mês. O Brasil pode ser uma referência em microcrédito;, acrescenta. Nas próximas 30 semanas, Guimarães vai visitar todos os estados para conhecer o que a população acha da Caixa.
Caminho
Na opinião do economista-chefe da Modal Mais, Álvaro Bandeira, a sinalização é de que os bancos públicos vão financiar quem precisa é correta. ;Quando se tem recursos escassos, é preciso delimitar e pulverizar mais o dinheiro para dar acesso maior às empresas menores e consumidores. É um processo que já vinha acontecendo e deve ter continuidade com os novos gestores;, avalia.
Para João Alberto De Negri, especialista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Brasil tem um problema sério de crédito, que representa 50% do Produto Interno Bruto (PIB) ; índice baixo se comparado com as nações desenvolvidas. ;O grande desafio dos presidentes é fazer com que aumente essa relação, porque, hoje, há restrição grande. As taxas de juros são elevadas e é preciso aumentar a competição bancária;, ressalta.
De Negri afirma que a Caixa e o BB terão de ampliar a capacidade tecnológica e fomentar a modernização do setor, financiando fintechs e inovações para deixar o setor mais competitivo. ;Não dá para fazer mais do mesmo. O grande desafio é deixar o crédito mais acessível para aumentar a produtividade e financiar empreendimentos inovadores;, argumenta.
Segundo dados do Banco Central (BC), mais de 80% do mercado de crédito está concentrado em cinco instituições ; Caixa, BB, Bradesco, Santander e Itaú. O aumento da competitividade tende a reduzir a taxa, de acordo com analistas. O professor e economista Istvan Kasznar, da Fundação Getulio Vargas (FGV), diz que a agenda liberal faz muito sentido e é necessária para reduzir as taxas de juros ;estratosféricas;. ;Apesar de ter caído nos últimos anos, o fato é que há muita concentração. É preciso abrir o mercado bancário e reverter esse quadro;, aponta.
Maior desafio
Para o economista-chefe da Rio Bravo Investimentos, Evandro Buccini, caberá ao presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Joaquim Levy, a tarefa mais difícil: refazer toda a política de financiamento de empreendimentos. ;Ele terá de priorizar as empresas médias, o que é bom, porque as grandes, que já conseguem acesso ao crédito no mercado privado, são as principais beneficiadas. Isso mostrou que não houve impacto muito significativo no investimento do Brasil;, afirma. Buccini defende que a redução de ofertas de empréstimos às companhias maiores não deve ter um efeito danoso à economia.