Alessandra Azevedo
postado em 19/02/2019 06:00
Há 105 dias, Jorge Bramante, 61 anos, acessa o site do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) na esperança de ter alguma novidade sobre a aposentadoria. O administrador de empresas pediu o benefício em 6 de novembro do ano passado, assim que completou os requisitos da regra 85/95. Até agora, não recebeu um centavo, apesar de ter contribuído por 36 anos para o sistema.
A lentidão do INSS para conceder benefícios é uma queixa recorrente no meio previdenciário. O problema é que, nos últimos meses, a situação ficou ainda pior. O órgão tem demorado, em média, quase dois meses para conceder aposentadorias, pensões e auxílios, pelos dados oficiais da Secretaria de Previdência do governo.
Quem pediu algum benefício em dezembro do ano passado esperou, em média, 50 dias para consegui-lo. Agora, precisaria de 58. Especialistas alegam que a conta é bem diferente e que a média deve ultrapassar os 100 dias. ;Para chegar a uma média de 58 dias, com tantos benefícios que levam seis meses para sair, teria que colocar processos que tenham sido concedidos em um ou dois dias;, argumentou o advogado Diego Cherulli, especialista em direito previdenciário. A média que ele tem observado é de quatro a seis meses, com piora quando pedido é feito no sistema digital.
As regiões com mais pessoas prejudicadas são o Norte e o Nordeste, de acordo com os dados oficiais. Em alguns estados, o tempo mais que dobrou. É o caso do Acre, onde a média era de 23 dias e passou para 68 dias no período mencionado, uma espera praticamente três vezes maior do que um ano atrás. Em Rondônia, foi de 42 para 80 dias. O recorde continua sendo de Sergipe, com média de 114 dias, um mês a mais do que os 83 dias registrados no fim de 2017.
O aumento tem sido notado pela advogada Katia Silva, especialista em direito previdenciário, que atende em Aracaju, no escritório ACS Advocacia Integrada. Na capital sergipana, o processo é longo para conseguir qualquer benefício, mas a maior demora tem sido na concessão dos que dependem de perícia médica, como auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, afirmou. Segundo ela, ;o INSS demora meses, mesmo quando a incapacidade laboral já está comprovada por relatórios médicos;.
Na longa fila de espera, em Aracaju, está a marisqueira Gleide Gonçalves, 46 anos, que tenta, desde setembro, receber o auxílio-doença. Há mais de 150 dias, uma hérnia de disco na coluna a impede de trabalhar. Sem o dinheiro do benefício, ela depende da ajuda da mãe para pagar até as contas mais básicas, como de luz e água.
;Eu não consigo dormir direito. Por isso, ela me dá algum dinheiro quando pode;, explicou. Enquanto aguarda a resposta do INSS, Gleide tem precisado racionar até o remédio para a dor, que custa R$ 150. ;Estou tomando bem devagar, para não acabar. Não posso tomar a quantidade certinha, como diz na receita, porque, se acabar, não tenho como comprar mais.;
;A má prestação do serviço público tem inviabilizado o direito à saúde dos cidadãos em Sergipe;, considerou Katia. A advogada lembrou que a demora, em casos como o de Gleide, é ainda maior porque, quando os segurados chegam ao escritório, já esperaram entre três e quatro meses apenas para fazer a perícia administrativa.
Adaptação
Especialistas acreditam que o aumento da demora tem a ver com a dificuldade do INSS em se adaptar à digitalização do processo de requerimento. O novo sistema adotado, Meu INSS, dificultou a ;triagem; que era feita nas agências. ;Quando chegava alguém que, claramente, não cumpria os requisitos para requerer o benefício, o atendente já ;barrava;. Agora, é possível enviar pela internet, de forma que o órgão precisa analisar até aqueles que não seriam admitidos nas agências;, explicou a advogada Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP).
O INSS confirmou que a demanda tem aumentado pela melhora nos canais de acesso ao sistema, com o INSS Digital, e também citou os acordos de cooperação feitos com entidades de classe e prefeituras. ;Com isso, o segurado consegue encaminhar sua demanda com mais facilidade;, explicou o órgão.
Outra justificativa é a ;redução drástica no quadro de pessoal nos últimos anos;. A autarquia alertou que a força de trabalho pode diminuir ainda mais nos próximos meses, porque parte dos que estão na ativa já podem se aposentar.
O INSS garantiu que tem feito um ;esforço concentrado; para agilizar a análise dos requerimentos. Entre as medidas que têm sido tomadas, estão a criação de polos de trabalho e de um novo modelo de gestão, pela realocação de servidores, que trabalham de forma remota nos processos. Segundo o INSS, ;isso vem otimizando a força de trabalho, sem necessidade de novos gastos com deslocamento de servidores;. A autarquia também pontuou que, ;em muitos casos, as pendências não são do INSS, mas do próprio segurado, como falta de documentos, falta de comprovação de tempo para aposentadoria, entre outros;.