postado em 03/06/2019 04:05
Estatísticas negativas sobre o mercado de trabalho e a confiança dos empresários, além da lentidão de estratégias para recuperação econômica em sair do papel, são algumas das evidências de que a economia vai seguir como a principal pedra no sapato do governo Jair Bolsonaro, avaliam especialistas. Se o desafio já era grande, com a retração do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre, o Planalto agora terá que redobrar esforços para, além de reativar a economia, impedir que o Brasil entre em recessão.
Na última semana, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou que o Produto Interno Bruto (PIB) recuou 0,2% de janeiro a março em relação ao trimestre anterior, de outubro a dezembro. A indústria e a agropecuária puxaram o resultado ao encolher 0,7% e 0,5%, respectivamente, em comparação ao fim do ano passado. Também pesou a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) ; responsável por registrar a ampliação da capacidade produtiva futura da economia por meio de investimentos correntes em ativos ;, que caiu 1,7% ante o último trimestre de 2018.
Em meio às turbulências, economistas ouvidos pelo Correio disseram que o país precisa urgentemente de medidas a curto prazo para aquecer a economia. ;É necessário um choque monetário para reavivar o coração da economia do país. Do jeito que estamos hoje, as reformas são apontadas como única salvação, mas elas resolveriam as pendências daqui a mais de cinco anos. Portanto, o governo tem que tomar medidas mais imediatas;, opina o professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), José Luís Oreiro.
Na avaliação do professor, uma das alternativas urgentes para a atividade econômica do país seria a redução da taxa básica de juros (Selic), que já está na mínima histórica, de 6,5% para 5%. ;Com isso, o governo diminuiria o custo de rolagem da dívida pública. Seria uma redução capaz de gerar economia de cerca de R$ 30 bilhões, quase o mesmo valor contingenciado do orçamento da União em março. Essa medida também seria importante para o governo evitar ainda mais as reduções no investimento público;, sugere.
Para Oreiro, o contingenciamento foi um erro do Executivo. Há três meses, o governo federal segurou gastos de R$ 29,7 bilhões do orçamento para conseguir cumprir a meta fiscal este ano. ;É preciso rever a meta de resultado primário para 2019 dos atuais R$ 139 bilhões, de deficit, para algo em torno de R$ 169 bilhões de deficit (negativo). Se ele se mantiver nos atuais números, teremos um choque fiscal ainda mais negativo no segundo semestre;, alerta. ;Para que o presidente não cometa crime de responsabilidade fiscal, isso só vai ser possível mediante aprovação do Congresso Nacional. Sendo aprovado, o pior ainda pode ser evitado. Tudo está nas mãos do Executivo e do Legislativo;, diz.
Curto prazo
Considerados os primeiros meses de 2019, dificilmente o ano terá um crescimento expressivo na economia. Especialistas consultados pelo Banco Central baixaram em 1,25 ponto percentual a projeção de expansão do PIB este ano: de 2,48%, a estimativa caiu para 1,23% em 13 semanas. ;A média mundial é de 4%. Estamos muito distantes daquilo que seria desejável para manter as condições de competitividade no cenário internacional. Só uma injeção de recursos pode salvar a economia ;, alerta Otto Nogami, professor de economia do Insper.
Com a política fiscal comprometida pelo endividamento, o que impede o governo de mexer nos gastos e na arrecadação para gerar um movimento anticíclico na economia e resgatar o processo de crescimento, além da baixa confiança do empresariado para investir na produção e melhorar a competitividade, resta ao Executivo apostar no consumo das famílias, diz Nogami.
;O consumo das famílias pesa em 64% do PIB. Dada essa representatividade, o governo pode agir de alguma maneira para estimular o consumo e evitar que o marcador da atividade econômica de 2019 seja desastroso;, observa. No entanto, ele lembra que ;qualquer estratégia do governo com o objetivo de incrementar o consumo seria paliativa e de curta duração.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, admitiu que o governo estuda liberar ;muito em breve; recursos do PIS-Pasep e do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para estimular o consumo. Com a medida, a estimativa é de que R$ 22 bilhões sejam injetados na economia. No entanto, ele mesmo avisou sobre o curto alcance das medidas. ;Se você abre essas torneiras sem as mudanças fundamentais, é o voo da galinha;. Faz uma liberaçãozinha aqui, baixa artificialmente os juros para reativar a economia. Nós não vamos fazer truques nem mágicas, vamos fazer as reformas sérias;, afirma o ministro.
Sem plano B
Em meio às turbulências, o governo segue apostando na agenda de reformas. Nos corredores do Planalto, a informação é de que não há um plano B. O governo trata as reformas como o grande trunfo para começar algo maior, já que espera que elas gerem impacto alto nas finanças públicas e no ânimo dos brasileiros.
Para ;abrir os portões do crescimento;, como defende Paulo Guedes, a reforma da Previdência continua sendo a mais decisiva ; aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a proposta de emenda à Constituição (PEC n; 6/2019) ainda precisa passar pela Comissão Especial e pelo plenário da Câmara antes de ir para o Senado. ;Os investimentos de fora vão começar a entrar à medida que o Brasil implemente essas medidas. Estamos absolutamente seguros de que, fazendo essas reformas estruturais, o país vai retomar o crescimento sustentável;, garante Guedes.
Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Carlos von Doellinger reforça que a aprovação da reforma será a base para tudo. ;É a medida fundamental. A partir dela, o governo poderá trabalhar com a agenda microeconômica. O setor privado terá melhores condições. Com o capital estrangeiro à disposição, poderemos reativar a economia com mais exportações;, pontua.
Para Doellinger, aumentar a taxa de investimentos é mais um ponto chave para a recuperação da economia. ;Estamos com um indicador muito baixo, de 15%. Isso não ativa economia nenhuma. Seria importante que estivesse entre 18% e 19%. Só isso vai garantir a absorção de mão de obra dos mais de 13 milhões de desempregados e reduzir o efeito da estagnação da economia.;
;Redução dos juros de 6,5% para 5% diminuiria o custo de rolagem da dívida pública, o que gerararia uma economia de cerca de R$ 30 bilhões, quase o mesmo valor que foi contingenciado do orçamento em março;
José Luís Oreiro, professor de Economia da UnB