Economia

Reformar e aumentar a produtividade

A grande questão é: por que o capital privado não investe mais em infraestrutura? Diante da abundância de recursos em escala mundial, o problema não parece ser falta de recursos, mas, sim, um ambiente regulatório pouco propício para a atração do capital privado

postado em 02/07/2019 04:20


Estima-se que 2019 será o terceiro ano consecutivo em que cresceremos em torno de 1%, algo que choca quando se considera que essa sequência de crescimento medíocre sucede a maior contração do PIB desde o início do Século 20. Ademais, a imagem do Brasil esteve sempre associada a dos países emergentes de melhor desempenho nessa área.

Óbvio que não existe bala de prata para o país voltar a crescer. Mas há dois fatores cruciais: um é o ajuste das contas públicas, com destaque para a Previdência, assunto que está ainda longe de ser equacionado, e sobre o qual continuarei divulgando minhas análises.

O segundo é a retomada da produtividade, área onde o país está também deixando muito a dever. Sem aumento mais expressivo da produtividade, não há como o país voltar a crescer de forma satisfatória. No Fórum Nacional, entidade que hoje presido com o apoio central do BNDES e da Finep, entre outros entes que se dedicam a discutir e indicar soluções para o desenvolvimento brasileiro, o tema da estagnação da produtividade do trabalho tem merecido ênfase especial. Desde a primeira metade dos anos 1990, a produtividade do trabalhador no Brasil vem crescendo, em média, a apenas 0,7% ao ano, taxa claramente insatisfatória. E no centro da retomada da produtividade, estão os investimentos em infraestrutura.

Um exemplo gritante de como os investimentos em infraestrutura são capazes de aumentar dramaticamente a produtividade está na nossa experiência com portos. Nos anos 1990, o número de movimentações de contêineres era em torno de 10 por hora. Atualmente, graças a vultosos investimentos, alguns terminais chegam a movimentar até 120 contêineres por hora. Com isso, o tempo de atracação de um navio caiu de dois ou três dias, para menos de 10 horas. Esse ganho de produtividade permite redução do custo do frete para importadores e exportadores, bem como amplia a capacidade de importação/exportação do país, com fortes ganhos para a nossa competitividade.

Infelizmente, contudo, isso é mais a exceção do que a norma. Sabe-se que é necessário investir em infraestrutura pelo menos 4% do PIB, durante 20 anos, para alcançar qualidade compatível com a renda que queremos para o país. Atualmente, o investimento não chega a 2% do PIB, valor insuficiente para repor a depreciação. Diferentes estimativas mostram a necessidade de aumentarmos o investimento em infraestrutura em torno de R$ 200 bilhões anuais. Enquanto isso não ocorrer, figuraremos entre os países com pior oferta. De acordo com a pesquisa de competitividade do Fórum Econômico Mundial, a qualidade de nossa infraestrutura em 2017/18 foi a 108; pior em um grupo de 137 países.

Dada a falência pública, a solução para o problema parece óbvia: investir mais, atraindo o setor privado para o setor. E também porque o investimento privado tende a ser mais eficiente. De acordo com a CNT, as 10 melhores rodovias do país são concessionadas. De acordo com a Antaq, os três portos mais produtivos são Terminais de Uso Privado (TUP). Ademais, em portos públicos, como o de Santos, onde, nos últimos anos, houve importante entrada do capital privado na operação de terminais portuários, a produtividade aumentou substancialmente, com a movimentação média passando de 28 para 61 contêineres por hora entre 2010 e 2018.

A grande questão é: por que o capital privado não investe mais em infraestrutura? Diante da abundância de recursos em escala mundial, o problema não parece ser falta de recursos, mas, sim, um ambiente regulatório pouco propício para a atração do capital privado. É verdade que houve avanços importantes nos últimos anos, principalmente na área de governança, mas ainda há muito a ser feito.

As decisões das agências reguladoras são frequentemente questionadas por outros órgãos do governo, como os de fiscalização e controle ou de defesa da concorrência, que, muitas vezes, analisam a árvore sem enxergar a floresta, no caso, a política pública que se deseja implementar. O resultado é uma paralisia decisória e incerteza jurídica. No caso das rodovias, a rodada de concessões de 2013 resultou em fracasso por causa de um balanço inadequado de riscos e pouca disposição da agência reguladora de renegociar os contratos. No setor portuário, os TUPs não vêm tendo a liberdade de fixar preços que estava prevista nos contratos de autorização. Já os terminais privados instalados em portos organizados ficam reféns das decisões das respectivas autoridades portuárias, havendo casos, por exemplo, de não haver reajuste nos preços de alguns serviços desde 2006, afetando severamente a equação financeira dos investimentos. Há ainda o problema da morosidade na entrega das licenças ambientais e, no caso dos portos organizados, uma legislação trabalhista que precisa ser revista.

Enfim, há uma enorme agenda para que possamos atrair mais capital privado para a infraestrutura, agenda essa que precisa ser adotada para que possamos crescer mais do que 1% ao ano.

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