Hamilton Ferrari, Rosana Hessel
postado em 14/07/2019 07:00
O titular da Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, admite que, sem reformas, o país estará condenado a crescer 1,5% ao ano ;para sempre;. Ele reforça que, após a aprovação das mudanças na Previdência e com as demais medidas que estão no radar, a economia vai crescer em ritmo mais acelerado, de 3% a 4% ao ano, no longo prazo e de forma sustentável. ;Nós temos um plano;, avisa.
Para o secretário, o baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) tem ;dois grandes problemas;: o desequilíbrio fiscal e a má alocação de recursos, que afetou a produtividade. Ele está confiante de que a reforma da Previdência será aprovada na Câmara ainda neste mês. Na sequência, virá a agenda pós-reforma, que será ;pró-mercado e pró-consumidor;, com um Novo Regime Tributário ; tocado em parceria com o Congresso ;, abertura comercial, concessões e privatizações.
;A partir do ano que vem, aprovando as reformas neste segundo semestre, teremos um cenário de crescimento sustentável;, garante. Sachsida critica os economistas que defendem que o governo volte a gastar para estimular a economia e afirma que eles deveriam fazer um mea culpa.
Diante da possibilidade de novo contingenciamento em meio à frustração de arrecadação com a redução das previsões de crescimento de 1,6% para 0,8%, Sachsida reconhece que vários órgãos da Esplanada não terão recursos para terminarem o ano. ;Se no setor privado há sofrimento, você acha justo que o setor público passe incólume? Eu não acho;, afirma.
A seguir, os principais trechos da entrevista com o economista concedida ao Correio:
O mercado reduziu a projeção de crescimento deste ano 19 vezes e sinaliza que a economia vai crescer menos que os 0,8%, mesmo se a reforma da Previdência for aprovada. Qual é o diagnóstico?
Nossos estudos mostram que ocorreu um problema muito sério de misallocation (má alocação) na economia brasileira. Vou dar um exemplo caricatural. Quando você gasta R$ 2 bilhões para fazer um estádio de futebol. Esse dinheiro não gera mais nada. Mas não é só isso. É preciso gastar R$ 40 milhões todo ano para manter o estádio. O problema é que não foi só o investimento que foi ruim. É pior ainda. Se você quiser corrigir o problema, tem custo. Isso é muito sério.
Houve muito desperdício?
É pior do que desperdício. No desperdício, você queima o dinheiro. Na má alocação, você não só queimou o dinheiro, como direcionou outros investimentos para outro local. E agora? A recuperação da economia brasileira está lenta. Algumas pessoas dizem que essa é a mais lenta recuperação da economia da História. Talvez o problema seja outro: o nosso nível de equilíbrio tenha caído. Foi colocado tanto dinheiro em locais tão errados que isso afetou de tal maneira a produtividade da economia que o novo equilíbrio, de repente, é esse.
O país não vai conseguir crescer mais do que está crescendo agora?
Se não mudarmos essa realidade, o futuro é crescer 1,5% ao ano para sempre. Isso é um problema muito sério de produtividade. Políticas monetárias e fiscais erradas do período de 2006 a 2016 diminuíram o crescimento potencial da economia brasileira. Precisamos corrigir isso, na nossa leitura.
Analistas divergem se o problema do baixo crescimento é demanda ou oferta. Qual é a sua avaliação?
É oferta. Sem dúvida. Essa divisão é muito simples. Têm os economistas, que levaram a economia ao caos, que dizem que o remédio é fazer mais do que eles fizeram para corrigir o problema. Não deixa de ser irônico que pessoas que trouxeram o Brasil à situação atual continuem opinando e dizendo que temos que fazer mais do mesmo. Parece que não aprenderam nada com a recessão. Não tem essa discussão aqui.
Isso é um consenso na pasta?
É um consenso dentro da equipe econômica e dentro de um grupo de economistas razoáveis. O Brasil está nessa situação por um descontrole fiscal brutal. Hoje, o país tem dois grandes problemas: o fiscal e a má alocação. Alguns economistas deveriam fazer um mea culpa por terem jogado o Brasil nesta crise. Estou esperando eles se desculparem por terem gerado 13 milhões de desempregos. É importante isso. Este governo tem uma agenda urgente.
Qual é essa agenda?
É a agenda fiscal. Precisamos aprovar a Nova Previdência. Não há solução para o nosso país sem corrigir o problema fiscal. E não há como corrigir o problema fiscal sem a Nova Previdência. Depois disso, temos o problema importante, que é corrigir a produtividade da economia brasileira. E, só para finalizar, existe essa crítica de que a gente focou demais a Previdência e esqueceu o resto.
Não dava para adotar a agenda da produtividade em paralelo? No início, houve essa dúvida?
Durante a transição, não houve dúvida. Houve um debate intenso se deveríamos avançar com a agenda fiscal e a de produtividade juntas ou se deveríamos, primeiro, focar na agenda fiscal e, uma vez aprovada a Nova Previdência, destravar a agenda de produtividade. Esses debates foram feitos. E quero dizer uma frase importante para os leitores do Correio, que é nosso mantra: ;Tenha um plano, confie no plano e mantenha o plano; (citou que ela é do técnico de futebol do filme Forrest Gump). Nós temos um plano.
Mas a reforma da Previdência não é a solução de todos os problemas da economia...
Isso está no nosso radar. Temos toda uma agenda. Como eu disse, o Brasil tem dois grandes problemas: o fiscal e o de produtividade. E como vamos corrigir isso? A parte fiscal, endereçada pela Nova Previdência. E, a parte de misallocation, de produtividade, com as medidas pró-mercado, que estimulem a oferta agregada.
E o que pode vir por aí?
Bom, será anunciado, em breve, o Novo Regime Tributário. Isso está em estágio adiantado.
O governo quer apresentar uma reforma tributária própria. Por que não aproveitar uma que já está no Congresso?
Temos que aproveitar o momento. Governo e Congresso são parceiros. Estamos à beira da aprovação da mais importante reforma do Brasil desde o Plano Real. É a parceria entre Executivo e Legislativo. A questão da reforma tributária é a mesma coisa. Se o Congresso achar por bem tocar a sua reforma, será maravilhoso. E conte com a nossa ajuda. Agora, nós, como Executivo, temos também que ter uma proposta. É natural.
Se o governo enviar uma proposta, ele não pode tumultuar tudo e atrasar o debate?
Não. No final, as propostas são todas parecidas. Todo mundo sabe quais são os problemas tributários. Pode haver discordâncias pontuais. Uma conversa, um debate franco de ideias resolvem. A agenda econômica está muito bem alinhada.
A reforma da Previdência pode sofrer desidratação no Congresso. Isso pode mudar o impacto que o governo prevê, de 0,4% no PIB?
O impacto no PIB será de 0,4% anual. Neste ano, não vai ser isso, porque está demorando. É preciso saber quando essa reforma vai valer. Temos uma grande expectativa de que ela seja aprovada rapidamente na Câmara e rapidamente no Senado. O Congresso está tentando isso de todas as maneiras. Mas a taxa de 0,4% anual está mantida, porque, quando fizemos a conta, a economia estava em R$ 1,1 trilhão (em 10 anos). A proposta que está no plenário da Câmara está muito próxima disso, em torno de R$ 900 bilhões.
Quando o senhor fala que o país só vai crescer 1,5% ao ano, é o cenário com ou sem reforma?
Esse é o cenário sem reformas. Se forem aprovadas todas as medidas econômicas que estamos pensando: reforma da Previdência, reforma tributária, abertura econômica, privatizações, concessões e toda uma gama de propostas que melhorem a produtividade da economia brasileira, podemos crescer entre 3% e 4% ao ano, em uma trajetória sustentável de longo prazo. Mas isso é com uma agenda ampla, pró-mercado.
O senhor falou de crescimento econômico, mas e o emprego e a renda, que estão em níveis muito baixos. Como solucionar esses problemas pós-reforma?
É uma agenda que nos preocupa. Aqui, temos que ser francos. Todo mundo tem parente que está passando por essa situação difícil, de aperto. E o que podemos dizer? Estamos planejando uma agenda importante para diminuir o custo de contratação em todos os setores e de maneira definitiva. Isso será detalhado quando a proposta da reforma tributária for apresentada. Será um grande estímulo ao emprego. Junto com a reforma da Previdência, com a abertura comercial, essa agenda beneficia o Brasil como um todo.
Poderia dar mais detalhes de outras medidas?
Não vamos arriscar nunca a Nova Previdência por causa disso. Primeiro, é a reforma da Previdência. Só depois vamos dar detalhes específicos. Agora, saiba que esse é um governo pró-mercado, pró-consumidor. Tudo aquilo que fizer bem ao consumidor, fizer bem à produtividade, favorecer a livre iniciativa e possibilitar que cada trabalhador tenha seu emprego e tenha seu inalienável direito de perseguir a sua própria felicidade, será estimulado neste governo.
E como estimular o investimento, que é o motor mais saudável para o crescimento sustentável?
A Nova Previdência vai trazer todo o choque positivo de confiança para a economia. Mas, além disso, temos uma série de medidas microeconômicas que estão sendo elaboradas para melhorar o mercado de capitais, o mercado de debêntures e facilitar o acesso à Bolsa de Valores para pequenas e médias empresas. A Bolsa vai bater cada vez mais recordes, porque ela é fundamental para nossa agenda de financiamento em infraestrutura. Essa ideia veio para ficar. Nesse sentido, a responsabilidade fiscal é fundamental. Como o governo tem pouco dinheiro, é o setor privado quem tem que assumir essa parte de infraestrutura.
Têm obras importantes, como metrô, que, se o governo não investe, o setor privado não o faz.
O governo precisa focar em obras com maior impacto social possível e deixar o setor privado atuar onde pode atuar. É o famoso crownding in que o ministro Paulo Guedes sempre fala, gerando um ciclo virtuoso.
O governo voltará a investir? Quando virá o deficit zero?
Só voltaremos a gastar quando tivermos dinheiro. Acho engraçado as pessoas que trouxeram o Brasil à maior crise da sua história, gastando o que não tinham, darem entrevistas aos jornais, dizendo: gasta que resolve. Eles acabaram com o dinheiro. Boa parte dos ministérios da Esplanada não têm recursos para acabar o ano. Essa é a realidade hoje. Se o governo gastar mais dinheiro agora, é o caminho certo para entrarmos no buraco pior ainda do que esse. Isso não vai acontecer.
Algum serviço público pode parar de funcionar até o fim do ano, já que não há recursos?
O setor privado está sofrendo: famílias estão sem emprego, pais tiraram os filhos das escolas privadas e levaram para a pública, perderam planos de saúde e têm outros pais que estão morando em casa de avós, porque não têm como pagar aluguel. Se no setor privado há sofrimento, você acha justo que o setor público passe incólume? Eu não acho.
O Brasil está condenado a ser um país de renda média baixa?
De maneira alguma. O nome do nosso governo é ;Caminho para a prosperidade;. As nossas propostas econômicas são para recolocar o Brasil nesse caminho. A MP da liberdade econômica, que está no Congresso, por exemplo, tem impacto significativo em crescimento. Não adianta crescer 5% num ano e depois, 1%. A ideia é crescer a taxas altas, e de maneira sustentável, para que o Brasil volte a ser um país de renda alta.
O país tem vários gargalos na infraestrutura que impedem a expansão da economia acima de 3%. Como resolver esse problema?
Estamos planejando o passo a passo, por exemplo, o choque de energia barata, que é a agenda do gás. Vamos ter melhorias na energia, mais setor privado na infraestrutura e, passo a passo, reformas vão melhorar a produtividade na economia. O Brasil vai voltar a crescer altas taxas de crescimento. Infelizmente, não será neste ano. A partir do ano que vem, aprovando as reformas neste segundo semestre, teremos um cenário de crescimento sustentável.
A privatização ainda não andou. O que podemos esperar?
É natural que demore. É um processo que tem que cumprir ritos legais. Ainda está na parte subterrânea. Tenho certeza de que neste segundo semestre, várias dessas empresas que, muitos têm na cabeça vão aparecer em processo de privatização bem mais adiantados. O secretário Salim Mattar (de Desestatizações) está fazendo um grande trabalho.