postado em 15/07/2019 04:22
A coordenadora do Programa Rede das Águas da organização não governamental SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro se preocupa com conflitos de papéis que a mudança no marco legal do saneamento, conforme propostas em discussão no Congresso, podem gerar. Ela teme que, ao levar para a Agência Nacional de Águas (ANA) a coordenação da regulação de saneamento, o novo marco possa enfraquecer o papel regulador da ANA com relação ao acesso e ao uso da água nas bacias hidrográficas, uma vez que a Agência é responsável por autorizar o uso e por classificar, com comitês de bacias hidrográficas, a qualidade da água de acordo com seus usos. ;Como vai ficar o papel da ANA na emissão de outorgas para o setor que ela vai passar a regular diretamente, já que o saneamento, por meio da emissão de efluentes de esgotos nos rios, é um poluidor das bacias hidrográficas?;, questiona.
No entanto, ela considera uma evolução o fato de a discussão poder ocorrer no Congresso, em audiências públicas com vários setores da sociedade, em torno de um projeto de lei, e não por medida provisória. ;Agora há espaço para aperfeiçoar a proposta e isso foi uma conquista do movimento ambiental, que pressionou muito para que as medidas provisórias não fossem votadas;, afirma. Na avaliação da especialista, esta e outras questões poderão ser esclarecidas e amadurecidas durante os debates, antes da votação do texto final.
A coordenação da regulação da ANA para o saneamento foi retirada do PL do Senado, mas a proposta vai voltar no novo texto que será enviado pelo governo nos próximos dias. A ideia é que a Agência estabeleça critérios técnicos gerais a serem seguidos pelas companhias de saneamento, como condição para investimentos que quiserem ter acesso a crédito da União.
Flexibilidade
Licenciamento Ambiental - Outra preocupação do SOS Mata Atlântica é com a rota única de licenciamento ambiental, proposta pelo PL 3261/19, para que os projetos de saneamento não aguardem na fila com os de outros setores. ;Dar prioridade para empreiteiras que lidam com esses projetos, como a Odebrecht, por exemplo, vai criar problemas jurídicos que podem levar as obras a se arrastarem mais ainda;, pondera. Já o presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária (Abes), Roberval Tavares de Souza, considera positivo. ;Por que temos que aguardar o licenciamento na mesma fila de uma indústria química, por exemplo? Não somos os poluidores. Ao contrário, tratamos esgotos, somos a solução-problema;, compara.
Para Malu Ribeiro, porém, a maior causa de preocupação com relação a licenciamentos ambientais ágeis não está nos textos da mudança do marco regulatório, mas no projeto conhecido como ; Lei Geral do Licenciamento Ambiental;, que tramita na Câmara, pois pode enfraquecer padrões técnicos, avalia, em todos os projetos, inclusive de saneamento. A proposta dá mais flexibilidade para que estados e municípios alterem suas condições de licenciamento ambiental e isenta de licença as atividades agropecuárias.
Na opinião de Fabiana Figueró, especialista em meio ambiente do escritório Souto Correa, é importante desburocratizar o processo, para alavancar investimentos em saneamento. ;Temos uma situação bastante precária. Os números do saneamento não mudam. É importante tentar todas as formas possíveis para que as obras sejam realizadas. Desburocratizar o licenciamento ambiental é algo muito salutar. Claro que precisa preservar e adotar medidas de compensação eventualmente necessárias. O impacto ambiental que o esgoto não tratado gera no meio ambiente e os resíduos sólidos, urbano e industrial, são problemas que precisam ser melhor conduzidos;, avalia.
Por meio de nota, o Ministério do Meio Ambiente disse que o licenciamento rápido é uma forma de agilizar investimentos. ;O MMA entende que medidas de maior agilidade no licenciamento, sem perda de qualidade técnica, aliadas a outras que sejam atrativas ao investimento privado, constituem a única forma viável de avançar com o saneamento no Brasil.;
Em seminário sobre recursos hídricos no auditório do Correio em junho, o ministro do Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto, comemorou o fato de o Senado ter reagido rápido, ao apresentar o PL 3261/2019, em resposta à caducidade da MP em 868/2019, no mês passado. Vamos apresentar outro. A ideia é colocar a ANA como agência definidora das normas de referência;, disse. ;No nosso entendimento, a proposta aprovada no Senado faz todo o sentido. Cria uma regra de transição para as companhias estaduais, permite o investimento privado, o que leva ; assim esperamos ; à universalização do sistema. Mas, sem a presença da ANA, uma das pernas, que é a uniformização, a segurança jurídica dos contratos de programas que virão a ser prorrogados, fica capenga;. Segundo ele, o novo PL vai completar o do Senado.
De acordo com Canuto, as questões regulatórias não foram incluídas apenas devido à questão do vício de origem, já que é prerrogativa da Presidência criar cargos, e não do Congresso. No caso da transferência da coordenação da regulação do saneamento para a Agência Nacional de Águas, será preciso criar novas funções específicas antes de implementar as mudanças. (C.D e S.K)
;Agora há espaço para aperfeiçoar a proposta e isso foi uma conquista do movimento ambiental, que pressionou muito para que as medidas provisórias não fossem votadas;
Malu Ribeiro, SOS Mata Atlântica