Jornal Correio Braziliense

Economia

Saques do FGTS podem impactar PIB em até 0,85 ponto percentual em dois anos

Em relação ao mercado de trabalho, o IFI aposta que os saques do FGTS resultem em uma ''redução na rotatividade da mão de obra''

Os saques do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), do Programa de Integração Social (PIS) e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) podem impactar o Produto Interno Bruto (PIB) do país em até 0,26 ponto percentual até o fim do ano, segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), entidade ligada ao Senado. Conforme divulgou o órgão, nesta segunda-feira (12/8), no Relatório de Acompanhamento Fiscal, o impacto no PIB para o ano que vem será de 0,59 ponto percentual. Esses dados, no entanto, são pouco prováveis, porque consideram que o valor total dos saques previsto pelo Ministério da Economia, de R$ 42 bilhões, para a modalidade do saque imediato de até R$ 500 sejam todos aplicados no consumo.

O governo estima um impacto de 0,35 ponto percentual na economia no acumulado em 12 meses com os saques do FGTS e do PIS-Pasep. As contas da IFI levaram em consideração a evolução da massa salarial e os dados de consumo do brasileiro. "Não é possível saber quanto desses recursos vão virar consumo, na realidade. E nem sabemos se os brasileiros vão sacar o total que o governo está prevendo, porque, como melhorou a rentabilidade das contas do FGTS, pode ser que muitos decidam manter os R$ 500 no fundo;, explicou o economista Alexandre Andrade, analista da IFI e responsável pelo levantamento.

Conforme a medida provisória que altera as regras do FGTS, a MP 889, a remuneração do FGTS contará com o rateio de 100% do lucro do Fundo que, em 2019, somou R$ 12,2 bilhões. A divisão será conforme o saldo de cada conta e a remuneração prevista para o cotista pela equipe econômica é de 6,18% no acumulado em 12 meses. Essa taxa está acima do rendimento da poupança, que passou de 4,55% ao ano para 4,20% anuais com a redução da taxa básica da economia (Selic) de 6,5% para 6% ao ano.

O analista contou que fez várias simulações do montante estimado pelo governo para o saque usado para consumo, variando de 10% até 100% tanto em 2019 quanto em 2020. Na média, se 50% dos recursos forem destinados para o consumo, ou seja, R$ 21 bilhões, o impacto neste ano no PIB seria de 0,13 ponto percentual, e, no próximo ano, de 0,30 ponto percentual. Atualmente, a previsão de crescimento do país em 2019 é de 0,80% enquanto a IFI, que não revisou ainda suas projeções desde maio, estima alta de 1,8% no PIB deste ano.

De acordo com Andrade, boa parte desses recursos deve ser destinada para o pagamento de dívidas, mas esse impacto da redução do endividamento das famílias não entrou nos cálculos da IFI. ;Os saques vão começar a partir de setembro e, pelo cronograma, o maior volume dos saques deve ocorrer no ano que vem, o efeito do impacto estimado para consumo é de 12 meses até setembro de 2020;, destacou.

O FGTS é um direito do trabalhador com carteira assinada e só pode ser sacado perante condições específicas, como para a compra da casa própria ou aposentadoria. No relatório divulgado pela IFI, é considerado que nem todo o dinheiro sacado será usado imediatamente, sendo provável que ocorra algum atraso entre o saque e o consumo direto das famílias. Para o órgão, o consumo das famílias poderá aumentar, em 2019 e 2020, respectivamente, em até 0,38 e 0,87 ponto percentual se forem efetuados 100% dos saques previstos nas contas do FGTS, de R$ 40 bilhões, e do PIS-Pasep, de os R$ 2 bilhões.

No relatório, o IFI também considerou a possibilidade de que nem todo dinheiro do FGTS seja destinado para o consumo. Segundo a instituição, se apenas 85% dos saques previstos realmente ingressarem na economia, o impacto no PIB apenas neste ano seria de 0,22 ponto percentual, e de 0,50 ponto percentual, em 2020.
No entanto, especialistas acreditam que os efeitos da liberação do FGTS na economia dependerão principalmente da forma como esse dinheiro será utilizado pela população. Para o professor e coordenador do curso de Economia do IESB, Riezo Silva, é preciso que as famílias acabem com suas dívidas para poderem voltar a consumir, e dessa forma, gerar crescimento na economia do país. "Com uma renda a mais disponível, você consegue começar a consumir, e assim, gerar mais tributos para o governo, que pode usar esses recursos para abrir maiores oportunidades de emprego", constatou o professor. "Por isso, o ideal, para atingir o projetado pela IFI, é que as pessoas peguem o saque do FGTS para quitar suas dívidas, e não para consumir mais".

"Esse dinheiro pode trazer mais empregos. Mesmo se as pessoas usarem parte do fundo para pagar dívidas, ainda vai gerar mais consumo, e as empresas irão buscar mais gente para empregar. Mas esse impacto será a médio e longo prazo. No curto prazo é difícil de dizer porque é preciso ver como vai ser o movimento dos trabalhadores em relação ao FGTS", explicou Riezo Silva.

De acordo com o especialista, o crescimento do PIB, com a liberação do fundo, deve ser menor do que o esperado pelo governo e pela IFI. Ele também acredita que o impacto deve começar "só a partir de 2020". "Essas variáveis demoram para ter um impacto rápido na economia, então acho que o governo está sendo otimista nessas projeções", acrescentou Silva.

O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, também desconfia dos cálculos divulgados pela IFI. "Geralmente, esses cálculos são feitos de forma linear, com a condição de não ser necessariamente aquilo que a realidade nos demonstra", afirmou o economista. "Os saques do FGTS vão ter um impacto, mas não é o suficiente para alterar a dinâmica do PIB deste ano. Prevemos que o PIB terá alta em torno de 1%, e isso não deve ser alterado com a liberação do fundo, que só está prevista para setembro. Vamos ter pelo menos três meses para isso ter uma absorção na economia".

* Estagiária sob supervisão de Roberto Fonseca