Economia

Prestação pode ser mais baixa, mas risco é maior

Anúncio da Caixa de crédito imobiliário indexado à inflação permitirá que mais brasileiros consigam financiar casa própria. Especialistas recomendam, entretanto, pesquisa e calma, pois IPCA pode subir, encarecendo o financiamento

Correio Braziliense
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postado em 25/08/2019 04:05
Se os valores das prestações ficarem em um preço razoável, dá para eu financiar logo de uma vez esse imóvel


Quando soube da nova linha de financiamento imobiliário indexada à inflação, a técnica administrativa dos Correios Cristiane Mendes, 41 anos, viu isso como um empurrão para antecipar o financiamento da casa própria. ;Eu quero ter o meu imóvel próprio. Acho que a maioria dos brasileiros pensa assim. Morei de aluguel durante cinco anos, e foi complicado. Tinha que mudar de um lugar para o outro, porque o dono aumentava o aluguel e eu não via o retorno daquele dinheiro;, explica. Ela quer comprar uma casa no Guará ou em Samambaia.

Na última terça-feira, a Caixa Econômica Federal lançou uma linha de crédito imobiliário atualizada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que registrou alta de 3,22% no acumulado em 12 meses encerrados em julho. As taxas anuais para esse tipo de financiamento variam entre 2,95% e 4,95% mais o IPCA, ou seja, são pós-fixadas, e, portanto, podem variar de acordo com a variação do custo de vida. Essa modalidade entra em vigor a partir de amanhã e vale tanto para imóveis residenciais enquadrados no Sistema Financeiro da Habitação (SFH) quanto no Sistema Financeiro Imobiliários (SFI).

Além da Caixa, o Banco do Brasil anunciou redução nas taxas de juros para financiamentos em até 7,99% ao ano, que pode ser com o teto da taxa pós-fixada, de 8,17% ao ano (caso o IPCA utilizado fosse equivalente ao registrado em julho, por exemplo).

O economista Ricardo Rocha, professor de Finanças do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), aconselha que é preciso muito equilíbrio antes de contratar um financiamento imobiliário. ;Se você vai comprar o primeiro imóvel, procure um que não seja muito grande, com valor não muito elevado para evitar comprometer muito o orçamento. É preciso definir o imóvel necessário para não tomar decisões precipitadas, que aumentem o endividamento da família;, orienta. Segundo ele, uma boa compra é aquela que cabe no bolso.

Adicional

Alexandre Cabral, especialista em finanças pessoais e professor do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais de São Paulo (Ibmec-SP), considera a nova linha de crédito boa, mas orienta que é preciso tomar cuidado com a inflação, pois pode subir, como já aconteceu no passado. Além disso, o risco de contratar um empréstimo durante 30 anos é grande. ;Custos adicionais mudam de acordo com a idade da pessoa. Quanto mais idosa a pessoa, mais caro o financiamento fica, já que isso estará embutido na taxa de juros. A chance de ocorrer mortes é maior;, explica. Considerando o cenário de hoje, o professor acredita que só vale a pena pegar empréstimo se for de 10 anos. Acima disso ; 4% ao ano ;, ele recomenda o uso do crédito imobiliário indexado à TR.

Para a coordenadora de projetos de construção do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), Ana Maria Castelo, ;o consumidor precisa considerar muitas variáveis antes de tomar decisão, mas o fato de ele ter opção para escolher qual a modalidade que mais lhe convém é uma coisa importante;.

A medida animou o mercado imobiliário, que vem amargando com a recessão de 2015 e 2016. Especialistas recomendam que o consumidor pesquise bastante e faça simulações antes de contratar um financiamento pós-fixado por um prazo muito longo. Há um risco embutido nessa modalidade de empréstimo, que é o fato de a inflação variar. Caso a carestia aumente, a prestação poderá subir em vez de cair, como normalmente acontece nos financiamentos pelo SAC (Sistema de Amortização Constante), quando uma parte da parcela é fixa e a parte dos juros é maior no início e vai caindo ao longo do tempo.

A técnica dos Correios pretende pesquisar bastante antes de assinar o contrato, mas não quer perder mais tempo. Pretende aproveitar que a inflação está bem baixa. Ela vai fazer a simulação, levando em conta o dinheiro que tem guardado, mais o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). ;Se os valores das prestações ficarem em um preço razoável, dá para eu financiar logo de uma vez esse imóvel;, conta Cristiane Mendes.

Retomada

O diretor comercial da Knüpfer Negócios Imobiliários, Heder Knüpfer, está animado com a retomada das vendas. A sinalização de que o mercado está disposto a reduzir os juros ao consumidor, uma vez que a Selic (taxa básica da economia) está no menor patamar da história (6% ao ano) dá esperança ao mercado de que a situação vai melhorar. ;A queda dos juros é uma tendência que pode fomentar o mercado da construção civil;, afirma.

Porém, ele admite que há riscos em um financiamento pós-fixado. Se o IPCA subir muito, a prestação do imóvel sobe, a renda familiar fica comprometida. ;Isso já aconteceu no passado, o risco existe, mas o cenário aponta um ciclo contínuo de estabilidade;, explica. Ele destaca que, a grande maioria dos contratos é de 30 anos, mas tem sua liquidação em um tempo menor, em torno de oito anos. Nesse caso, o risco diminui.

Clientes que possuem renda e classificação de risco dentro dos parâmetros aceitáveis do banco podem utilizar esse recurso para aquisição de imóveis, sem necessariamente se descapitalizar ou vender algum ativo. ;Para os que creem num cenário positivo para o futuro, a segurança de que as prestações ficarão dentro de um patamar muito mais atrativo e com tendência de queda;, Knüpfer.

Na avaliação do presidente da Associação de Empresas do Mercado Imobiliário do Distrito Federal (Ademi-DF), Eduardo Aroeira, as novas taxas indexadas ao IPCA significam uma redução de prestação do financiamento habitacional, que pode atrair a população de baixa renda, novamente, para a compra da casa própria. Ele aposta que isso pode ocorrer, principalmente, com famílias que se enquadrem nas faixas 1,5 (renda de até R$ 2,6 mil) e 2 (até R$ 4 mil), do programa Minha Casa Minha Vida. ;Acreditamos que essa nova modalidade de empréstimo será positiva para o mercado, porque pessoas que, antes, não conseguiriam comprar um apartamento, devido às altas taxas de juros, poderão se candidatar;, destaca.

* Estagiários sob supervisão de Rozane Oliveira

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