Economia

A distância do teto, depois da reforma

Mudanças nas regras da previdência dificultam o acesso à aposentadoria pelo valor máximo, principalmente para novos trabalhadores e para quem não se encaixa nas regras de transição. Para chegar lá, é preciso contribuir até 40 anos

Correio Braziliense
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postado em 26/08/2019 04:04
Novidades: forma de calcular o benefício e inlcusão  da média de 100% das contribuições alteram o benefício para o trabalhador


A possibilidade de ganhar uma aposentadoria no valor máximo pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o chamado teto, ficará ainda mais difícil com a aprovação da reforma da Previdência. Novos trabalhadores e os que não entram na regra de transição dificilmente vão receber o valor máximo, que hoje é de R$ 5.839,45, mesmo os que ganham salários maiores. Isso acontece porque a reforma altera o cálculo da média salarial dos trabalhadores, que serve de base para o valor da aposentadoria.

Segundo a advogada especialista em direito previdenciário Jéssica Matias, atualmente já não é fácil alcançar o teto, e deve ficar ainda mais difícil. ;Mesmo quem contribuiu sempre pelo teto, pelas regras atuais, já encontra dificuldade em alcançar esse valor. Isso porque ,nos anos de 1998 e 2004, a atualização do teto foi maior do que a atualização do que foi pago para o segurado, então, houve defasagem no cálculo, a não ser nos casos em que a pessoa trabalhou mais do que o tempo mínimo ;, explica.

Dois fatores da reforma alteram o benefício para o trabalhador: a mudança do cálculo de média e a nova regra de cálculo. Atualmente, para definir o valor que será pago como aposentadoria, o INSS considera apenas as 80% maiores contribuições feitas e descarta as 20% menores, geralmente do início da carreira. Assim, a média fica mais alta do que se levasse todos os pagamentos em consideração.

Com a reforma, a média vai ser calculada considerando 100% das contribuições. As 20% menores não serão mais descartadas, o que vai puxar para baixo a média, que é a base de cálculo da aposentadoria. Parlamentares contrários à mudança criticam a medida, mas o governo insiste que os maiores prejudicados não serão os mais pobres. Segundo o secretário de Previdência do Ministério da Fazenda, Leonardo Rolim, descartar as contribuições mais baixas beneficia contribuintes de renda mais alta, que podem fazer planejamento previdenciário.

Além de empresários e profissionais liberais, ele cita servidores públicos, ;principalmente das carreiras de elite;. Segundo Rolim, antes de ingressar no serviço público, esse grupo tem, em média, sete anos de contribuição ao INSS, com salários bem mais baixos, que depois são ignorados no cálculo. ;Acabam levando uma aposentadoria de valor médio muito maior do que contribuiu ao longo da vida. Assim, a gente transfere renda exatamente para os mais ricos;, afirmou, em audiência pública no Senado, na última quinta-feira.

Sem bônus
O segundo ponto que reduz o benefício é que o fator previdenciário deixa de existir na nova base de cálculo. Esse índice que considera a idade, o tempo de contribuição e a expectativa de vida do segurado, em parte dos casos, reduz o valor dos benefícios, quando é menor do que um, mas também pode aumentar a aposentadoria de quem tem mais anos de vida e de trabalho, possibilitando o alcance do teto.

A partir da reforma, ele só será válido para quem se enquadrar na regra de transição. Para novos contribuintes, o cálculo consistirá em 60% da média de cálculo, mais 2% a cada ano que exceder o tempo mínimo de contribuição para a aposentadoria. Apesar de mais difícil, alcançar o valor máximo ainda não é impossível, caso o trabalhador contribua por mais tempo.

;Para a pessoa ganhar o teto, terá que trabalhar mais do que o tempo exigido. Levando em conta o mínimo de 15 anos para mulher e 20 anos para homem, para alcançar 100% da média, as mulheres terão que trabalhar, em média, 35 anos e os homens, 40. Então, por exemplo, uma mulher que pagou pelo teto a vida inteira e contribuiu por 40 anos, vai se aposentar com 110% da média das contribuições. Tendo, assim, chance de se aproximar ou de alcançar o valor do teto na sua aposentadoria;, diz a advogada Jéssica Matias.
Planejamento
A advogada ressalta a importância de um planejamento para que os trabalhadores consigam alcançar um melhor valor do benefício. ;Não significa que o segurado tem que correr para se aposentar para não pegar as novas regras. Cada caso é um caso. Com o planejamento previdenciário, fazemos uma análise completa do tempo, dos vínculos do segurado, das remunerações, para ter uma previsão de quando ele provavelmente conseguirá se aposentar;, explica.

Com as discussões da reforma, a coach Quezia Florêncio, de 51 anos, foi em busca de um profissional para tirar dúvidas e se planejar. ;Eu tinha muitos questionamentos, então fui em busca de uma orientação. Eu poderia me aposentar daqui a dois anos, pelas regras atuais, mas acabei descobrindo que, no meu caso, vai ser melhor esperar mais um pouco. Então, vi que, se eu contribuir por mais dois anos, tenho a chance de pegar quase o teto. Decidi esperar e me aposentar daqui quatro anos;, conta. Ela diz, ainda, que se arrepende de não ter feito o planejamento antes. ;Eu fui atrás do INSS, mas muitas vezes te orientam erroneamente. Estava perdida, então procurei por conta própri. Acho importante as pessoas saberem das possibilidades, antes de pedir logo a aposentadoria;, diz.

Para o economista Paulo Tafner, pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo (Fipe/USP), os trabalhadores devem passar a pensar na previdência como a nova poupança. ;O objetivo da reforma é fazer com que as pessoas trabalhem por mais tempo para ter o mesmo valor de benefício. Com o teto, não poderia ser diferente. Então, é realmente necessário que as pessoas passem a se planejar. A grande maioria vai poder se aposentar com 65 anos e tem que se planejar para ter uma contribuição, quando chegar nessa idade, e um valor adequado da aposentadoria;, afirma.

*estagiária sob orientação de Cláudia Dianni
(Colaborou Alessandra Azevedo)



"Para a pessoa ganhar o teto, terá que trabalhar mais do que o tempo exigido.
Levando em conta o mínimo de 15 anos para mulher e 20 anos para homem,
para alcançar 100% da média, as mulheres terão que trabalhar,
em média, 35 anos e os homens, 40;

Jéssica Matias ,
advogada


"É realmente necessário que as pessoas passem a se planejar.
A grande maioria vai poder se aposentar com 65 anos e tem que se
planejar para ter uma contribuição, quando chegar nessa idade,
e um valor adequado da aposentadoria;

Paulo Tafner,
economista especalizado no tema
Revisão nas contas
Novas regras para a aposentadoria restringem acesso a benefícios

Como é atualmente

; Média salarial ; 80% das maiores contribuições. As 20% menores são descartadas, o que eleva a média do trabalhador.

; Fator previdenciário ; Índice que considera a idade, tempo de contribuição e a expectativa de vida do segurado. Em parte dos casos, pode reduzir o valor dos benefícios, quando é menor do que 1, mas também aumentar a aposentadoria de quem tem mais anos de vida e de trabalho, possibilitando o alcance do teto.

Como ficará com a reforma

; Média salarial ; 100% das contribuições são levadas em consideração. Isso faz com que rendimentos menores puxem a média do trabalhador para baixo.

; Fator previdenciário ; Deixará de existir. O cálculo consistirá em 60% da média + 2% a cada ano, que exceder o tempo mínimo de 15 anos de contribuição para a aposentadoria.

Como alcançar o teto com as novas regras
; Será possível alcançar o valor máximo caso o trabalhador contribua por mais tempo

Exemplo: Tempo mínimo de contribuição de 15 anos para mulher e de 20 anos, para homem. Para alcançar 100% da média, as mulheres terão que trabalhar 35 anos e os homens, 40.

Fontes: Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n; 6/2019

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