Economia

Avanços e impasses no Brics

Promessas de investimentos, sobretudo da China, mostra que reunião do bloco deixou saldo econômico favorável ao Brasil, segundo especialistas. No campo político, porém, o país se apresentou como uma voz dissonante entre os membros do grupo

Correio Braziliense
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postado em 16/11/2019 04:28
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Terminada a 11; reunião da cúpula do Brics ; grupo composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul ;, a análise de especialistas é de que o país sai fortalecido no âmbito econômico e enfraquecido politicamente. O saldo positivo são avanços em acordos aduaneiros e nas relações comerciais, com uma abertura maior do mercado brasileiro, e, sobretudo, com mais recursos para projetos de infraestrutura. Maior parceiro do país entre os integrantes do bloco, a China colocou à disposição do governo brasileiro mais de US$ 100 bilhões para investimentos a serem analisados em conjunto. Projetos nessa área contarão ainda com mais financiamentos do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, na sigla em inglês), mantido pelos sócios do Brics. Por outro lado, o encontro reforçou a percepção de que o alinhamento do Brasil com os Estados Unidos é um empecilho ao fortalecimento político do bloco. Além disso, a omissão sobre as crises na América Latina no comunicado final mostra que o país teve de ceder, perdendo força no agrupamento.

De concreto, a aprovação de um empréstimo do NDB, de US$ 300 milhões (cerca de R$ 1,2 bilhão), para expansão de infraestrutura de transportes da mineradora Vale nas regiões Norte e Nordeste mostra que a declaração do presidente do banco, Kundapur Vaman Kamath, de que Brasil, Rússia e África do Sul serão mais contemplados com financiamentos, não foi mera retórica. ;Nossa meta é fazer financiamentos equilibrados no futuro. China e Índia tinham projetos mais preparados por seus governos. Foi um aprendizado que atrasou a curva. Agora estamos considerando projetos do setor privado e mais aportes na Rússia, Brasil e África do Sul do que nos outros países;, afirmou, durante o Fórum Empresarial paralelo à reunião de cúpula.

A fala soou como música para os ouvidos do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, que havia reconhecido ;certo incômodo; com a subutilização do NDB pelo Brasil. ;Tenho certeza que vamos contar, cada vez mais, com a presença do banco nos financiamentos e nas garantias;, disse ele, no mesmo evento. Também no fórum, os maiores empresários dos países do bloco recomendaram 23 ações para ampliar os negócios: um acordo entre as aduanas para dar mais rapidez ao desembaraço das mercadorias em todos os portos do Brics; novos tipos de financiamento para o banco do Brics na área de energia e para pequenas e médias empresas; e acordo na área de aviação.

Para o CEO da consultoria BMJ, Wagner Parente, do ponto de vista econômico, o principal ponto positivo foi a relação com a China, que marca uma virada em relação à abordagem que o Brasil tinha com o país asiático. ;Esse processo ocorre desde a viagem do presidente Bolsonaro para lá e, agora, culmina nessa boa disposição que o governo demonstrou com a China. Não à toa, os chineses participaram do leilão de petróleo da cessão onerosa. Foi um recado. Outro, foi a declaração sobre livre-comércio, do ministro Paulo Guedes (Economia);, avalia. Contudo, Parente ressalta que tal acordo é muito improvável. ;As sensibilidades são grandes. Mas alerta os Estados Unidos de que não são os únicos parceiros com quem Brasil pode aumentar o comércio;, diz.

Para o setor produtivo doméstico, isso também foi uma boa notícia, no entender de Parente. ;Com uma abertura maior do país, existe, sim, a possibilidade de ganhar mercado. O governo foi claro que prefere aumentar a corrente de comércio do que cultivar superavit na balança;, assinala. O setor agroindustrial quer muito ampliar o acesso ao mercado da China. ;Não me parece, no entanto, uma ação prática. É mais prospectiva, de intenção.;

No caso das relações com a Rússia, a vinda do presidente Vladimir Putin foi uma demonstração importante, segundo o CEO da BMJ. ;Putin dá importância estratégica e militar para a América Latina;, afirma. A Rússia quer exercer influência maior no continente e é aliada da Venezuela. ;Não por acaso ocorreu a invasão da embaixada venezuelana durante a reunião. Esse assunto foi tratado, mas existe diferença de visões neste sentido;, observa.

Na opinião do especialista, um ponto alto do encontro foi a proposta de multilateralismo, sugerida pelo primeiro-ministro indiano, Narendra Modi. ;Ele falou de OMC (Organização Mundial do Comércio), na contramão do que o Brasil tem apregoado, de que negociações bilaterais são mais pertinentes no momento;, avalia. Para a África do Sul, há um interesse comercial mais prático, já que a nação é exportadora de matéria-prima. ;O país quer aumentar o comércio com o Mercosul. Já existe um acordo, que pode ser amplificado.;

Parente destaca que a abertura de um escritório regional para as Américas do NDB no Brasil é uma grande conquista. ;O que havia de mais concreto para financiamento de infraestrutura era o Banco Mundial, que exige condicionantes ambientais, projetos sustentáveis. Nada disso é exigido pelo NDB e o empréstimo para a Vale mostra que o impulso para mais financiamentos no país já foi dado;, pontua. Entretanto, Parente lembra que a América Latina é ;o elefante na sala;. ;Ninguém quis falar publicamente, principalmente sobre Venezuela, em relação à qual o Brasil está no lado oposto do Brics.;

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