Economia

Comissão do Senado avalia polêmica taxação da energia solar no Brasil

Revisão de resolução da Agência Nacional de Energia Elétrica, em consulta pública, prevê impostos e encargos de 60% na geração distribuída de eletricidade produzida por painéis fotovoltaicos

Simone Kafruni
postado em 03/12/2019 17:49

[FOTO1]A cadeia produtiva da energia solar alerta que a proposta de alteração na Resolução Normativa (REN) 482 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que prevê a taxação da geração distribuída em até 60%, pode inviabilizar o avanço do setor, aumentando o tempo de retorno do investimento, dos atuais seis anos para 26 anos, mais do que a duração média dos painéis fotovoltaicos. O órgão regulador rebate que, se nada for feito na regulação, os consumidores de energia elétrica de todo o país serão onerados em R$ 1 bilhão em 2021, em R$ 2 bilhões em 2023, R$ 3 bilhões, em 2025, e R$ 4 bilhões, em 2027.

O debate foi realizado nesta terça-feira na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, que promoveu uma audiência pública sobre a cobrança de impostos na geração de energia solar fotovoltaica a pedido do senador Major Olímpio (PSL-SP). Um especialista da Universidade da Califórnia (UCLA) e um mestre em energia solar fotovoltaica, além de representantes setoriais, apresentaram dados que contrapõem as justificativas do Ministério de Minas e Energia (MME) e da Aneel para taxar a energia solar.

A discussão ganhou corpo desde que o órgão regulador propôs, em outubro, uma mudança na REN 482, que regula a tributação no setor de Geração Distribuída (GD), aí incluída a produção de energia por meio de painéis fotovoltaicos nos telhados de residências, comércios, prédios públicos e usinas solares. A modificação está sob análise até dia 30 de dezembro. Desde o início da operacionalização no país, em 2012, já foram investidos R$ 7 bilhões com GD e criados mais de 100 mil empregos diretos. O cálculo de impacto na economia de consumo é da ordem de R$ 1,5 bilhão ao ano, além da previsão da criação de 600 mil novos empregos até 2035, segundo estimativas das entidades representativas.

Polêmica

Conforme Leandro Caixeta Moreira, subsecretário de Energia do MME, a conta de luz de quem não tem placa solar vai aumentar, porque gera subsídio cruzado. ;Quem está instalando painéis hoje são grandes empresas ou consumidor de alta renda. E quem paga são todos os demais;, argumentou. Segundo ele, o país não precisa mais subsidiar essa fonte de energia.

O representante da Aneel Carlos Alberto Calixto Mattar disse que a proposta é que os consumidores que produzem energia solar paguem pelo uso da rede de distribuição ;na exata medida do seu uso;. ;Se nada for feito, em 2021 os que geram energia solar vão deixar custo para os demais consumidores de R$ 1 bilhão chegando a R$ 4 bilhões em 2027;, alegou. Conforme Mattar, o payback (retorno do investimento) está em 4,5 anos e subirá para 6,5 anos com a taxação proposta.

O presidente da Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD), Carlos Evangelista, contestou algumas informações dos representantes do MME e Aneel. ;Geração distribuída não é só para quem tem dinheiro, a população pobre também produz;, ressaltou, mostrando uma foto de painéis fotovoltaicos instalados no meio de uma aldeia indígena na Amazônia.

O diretor de Políticas Sociais do MME, Antônio Celso de Abreu Júnior, disse que a ideia de o consumidor gerar sua própria energia saiu da pasta em 2012 já prevendo uma revisão da regulamentação em 2019. ;A proposta era fazer essa avaliação quando o setor chegasse a 1,7 gigawatts (GW). Hoje, está com 1,8 GW, sustentado por políticas de incentivo;, disse.

O presidente da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), Rodrigo Sauaia, alertou que a cadeia representa 600 associados e empresários, desde segmentos de fabricação de matéria-primas a instaladores de painéis, passando pelas áreas jurídica e financeira. ;Esse debate precisa levar em conta quando mudar a regra e quanto cobrar ao estabelecer a mudança. Há um momento certo para isso;, justificou.

Segundo Sauaia, são mais de 84 milhões de consumidores no Brasil e apenas 63 mil geram ou são atendidos por sistema remoto de energia solar, quando não têm telhado. ;A participação fica abaixo de 1%. Além disso, é preciso considerar o ganho líquido, que foi de R$ 13,3 bilhões só no setor elétrico, em redução de uso de termelétrica, em reserva de água, em vantagens econômicas e sociais;, enumerou. Ele contestou dados da Aneel e disse que com a taxação de 60% o payback passa dos atuais 6 anos para 26 anos.

Especialistas

Mestre em energia solar fotovoltaica, Tássio Barboza, da Associação Baiana de Energia Solar, questionou os números apresentados pela Aneel. ;O discurso da agência mudou em outubro. Em agosto de 2019, dizia que baixaria a tarifa com GD e, em outubro, disse que terá custo. Não podemos ter confiança na Aneel?;, indagou. Barboza criticou o lobby das distribuidoras de energia, que querem cobrar o uso do fio. ;Esse risco é da distribuidora, que está com medo do efeito Uber;, afirmou.

O professor Rodrigo Ribeiro Antunes Pinto, da UCLA, comparou os dados da Califórnia como os do Brasil. ;A Califórnia produz 10 vezes mais do que todo o Brasil e tem 60 vezes mais painéis por habitante do que o Brasil. Deveria estar desesperada para acabar com isso. Mas subsidia 30% o setor, garante o direito de troca de energia (gerada pela consumida) na proporção de 1 para 1 e assegura isso por 20 anos;, ressaltou. ;O que Aneel propõe é taxar em até 62%, o que só ocorre em locais com contribuição muito maior da energia solar na matriz energética. No Brasil, 0,6% da GD é solar;, concluiu.

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