Economia

Com novos parâmetros de produção, Avon se livra de testes em animais

Regras do mercado chinês impediam que a empresa, adquirida pela Natura & Co, em maio, usasse outros métodos de avaliação de suas fórmulas. Foi preciso fazer reformulações e mudar canais de vendas

Paula Pacheco
postado em 19/12/2019 06:00
[FOTO1]São Paulo ; A Avon Products incluiu a China em seu programa de não utilização de animais em testes e a partir deste mês passou a ser a primeira empresa global de beleza a banir este tipo de procedimento em todas as suas marcas e mercados.

A companhia americana, que teve seu controle adquirido pela brasileira Natura & Co em maio, já não testava suas fórmulas em animais há 30 anos. Para garantir a segurança dos produtos, a multinacional utiliza, por exemplo, a aplicação de dados existentes, modelagem computacional e testes in vitro.

A China era exceção por conta de regras locais. No mercado chinês, o uso de animais em testes é apontado pelo governo como obrigatório para algumas categorias de produtos ; por exemplo, protetores solares e desodorantes. Para colocar a decisão em operação, a empresa teve de articular diferentes setores, como pesquisa e desenvolvimento, suprimentos, marketing e comunicação.

Como a China não alterou suas regras, a Avon decidiu fazer algumas adaptações para continuar no país. A fabricante de produtos de beleza adotou reformulações nas linhas de produtos e vai abrir novos canais de e-commerce que dispensaram o cumprimento dos requisitos legais para testes em animais.

Antes da decisão, a Avon já vinha trabalhando em parceria com organizações científicas chinesas na tentativa de desenvolver alternativas que garantissem a análise de segurança do produto sem o uso de animais. Em seu site, a companhia explicou a razão de não ter abandonado um mercado que tem regras contrárias ao que a empresa pratica em outros países. A empresa diz que está comprometida em atender às necessidades dos clientes no país asiático ; um mercado importante para a fabricante ; e em expandir seus negócios e o de mulheres que trabalham como revendedoras.

Por meio de comunicado, Jonathan Myers, diretor de Operações da Avon, explicou a decisão. ;Como uma empresa global de beleza, é extremamente importante para nós poder continuar a construir nossos negócios na China. Nosso objetivo é fornecer produtos para atender às necessidades de nossos clientes sem comprometer nosso compromisso com o bem-estar animal, nossos altos padrões de segurança de produtos ou nossa aderência aos requisitos regulamentares.; Ainda segundo o executivo, a empresa vem investindo ;em como desenvolver novas inovações para a China e, em alguns casos, alterando os canais de distribuição, somos capazes de oferecer essa mudança marcante. Globalmente, nenhum dos produtos da Avon será testado em animais.;

Uma das declarações de Myers deixa implícito que, apesar da decisão, a empresa pretende continuar a argumentar junto aos órgãos reguladores chineses a respeito da necessidade de serem adotadas alternativas nessa área.;Não acreditamos que testes em animais sejam necessários para comprovar a segurança do produto e não testamos produtos em animais em nenhuma parte do mundo. Continuaremos a pressionar por uma maior aceitação de alternativas;, afirmou o executivo.

Para a Peta, ONG internacional que atua na defesa dos animais, o anúncio da Avon é classificado como ;trabalhando pela mudança regulamentar;, por isso a fabricante de produtos de beleza não aparece nem na lista daquelas que não fazem mais os testes em animais, nem na relação das que ainda usam esse recurso.

;A Peta celebra o compromisso de longo prazo da Avon em encerrar todos os testes cosméticos em animais em todo o mundo, e sabemos que milhões de consumidores também o farão. O suporte da Avon a (outros) métodos de testes fez uma diferença significativa no desenvolvimento, na utilização e na aceitação de alternativas;, declarou Kathy Guillermo, vice-presidente sênior.

Receita

Com operações em cerca de 50 países, hoje, a Avon tem uma receita anual ao redor de US$ 6 bilhões e é uma das maiores empresas de venda direta do mundo. Em maio, seu controle foi vendido à Natura & Co por aproximadamente US$ 3,7 bilhões, criando um grupo avaliado em US$ 11 bilhões. No Brasil, o negócio já teve o aval do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), ligado ao Ministério da Justiça. A maior subsidiária da Avon é a brasileira.

José Vicente Marino, presidente da operação brasileira da Avon desde setembro do ano passado e com passagem por Natura, Johnson e Alpargatas, lembra que a companhia vem trabalhando há décadas junto a parceiros como o Instituto para Ciências In Vitro, Frame e a Humane Society International na busca de alternativas aos testes em animais. ;Estamos confiantes de que esse avanço apoiará nossos esforços para atender às expectativas de nossos clientes e revendedoras em todo o mundo.;

Além de abandonar o teste em animais, a empresa busca formas de incorporar mais ingredientes vegetais, naturais e sintéticos em suas fórmulas. A linha Distillery, lançada recentemente em alguns mercados, como o americano e europeu, conta com produtos veganos, feitos com concentrados obtidos por meio de um processo de destilaria.

Brasil tem novas regras

No Brasil, está em vigor desde setembro passado a Resolução Normativa 18 do Conselho Nacional de Experimentação Animal (Concea), que determina a diminuição ou a substituição do uso de animais por métodos alternativos em 17 tipos de testes e experimentos. A norma tem de ser seguida tanto por empresas quanto por instituições de pesquisa, tanto públicas quanto privadas.

O Consea é responsável por estabelecer regras para o uso humanitário de animais tanto no ensino quanto na pesquisa científica. A norma, aprovada em 2014, previa cinco anos para adequação. Segundo o conselho, as atuais metodologias têm a aceitação regulatória internacional. Para o órgão, a mudança permite garantir a ;reprodutibilidade e a confiabilidade do resultado dos testes, além do bem-estar dos animais;.O descumprimento da resolução prevê de multas (incluindo os pesquisadores) ao fechamento do setor responsável pelo experimento até que seja feita a adequação. A nova regra muda o uso de animais em testes de segurança exigidos para produtos como brinquedos, medicamentos, cosméticos e material escolar.

Um exemplo dado pelo Concea é o do teste de irritabilidade (teste de Draize), em que se injeta a substância testada no olho de um coelho. Outras tecnologias foram desenvolvidas e hoje é possível fazer o mesmo trabalho com os olhos de bovinos e aves que vêm de abatedouros.

Natura & Co na bolsa

Na quarta-feira (18), a Natura & Co Holding S.A., controladora da Natura, The Body Shop e Aesop, anunciou o início da negociação de suas ações (NTCO3) na B3, no segmento Novo Mercado. A decisão faz parte da reestruturação corporativa da empresa, que inclui a aquisição da Avon Products, Inc. O negócio vai criar o quarto maior grupo global do setor de beleza.

A partir de agora, os acionistas que detinham os papéis da Natura Cosméticos (NATU3 ; B3) passam a ser donos de ações da Natura & Co Holding, na proporção de um para um. A Natura & Co passará a ser a acionista controladora da Avon após a conclusão da transação, prevista para o primeiro trimestre de 2020.

No acordo, a Natura & Co vai controlar a Avon em uma operação de troca de ações. Os acionistas vão ficar com, aproximadamente, 76% da companhia combinada. Já os donos dos papéis da Avon ficarão com os cerca de 24% restantes. Assim que o negócio for concluído, a Natura & Co terá ainda seus American Depositary Receipts (ADRs) listados na Bolsa de Valores de Nova York (NTCO).

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação