Augusto Fernandes
postado em 19/12/2019 06:00
[FOTO1]A reforma tributária que vem sendo discutida pelo Congresso ; há um projeto na Câmara, outro, no Senado ;será fundamental para dar alívio às empresas e corrigir exageros que inviabilizam alguns setores e estimulam o mercado ilegal. Na avaliação do segmento de bebidas alcoólicas no Brasil, o Legislativo não pode insistir em taxação excessiva em poucos produtos, sob o risco de manter o contrabando e a falsificação.
Segundo estudo divulgado pelo Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac), enquanto a média nacional de tributos sobre o setor de bebidas é de 34%, os empresários do segmento, de forma geral, pagam quase o dobro: 60%. O reflexo dessa taxa exagerada de impostos é o comércio clandestino de cachaça, que encontra espaço livre para crescer no país. Somente em 2017, último ano com dados disponíveis, a produção e a venda ilícitas de bebidas alcoólicas movimentaram pelo menos R$ 29,1 bilhões ; valor equivalente a 14,6% do mercado total, que foi de R$ 199,4 bilhões.
Os números são um alerta para o quanto o país deixa de arrecadar em impostos com práticas ilegais como contrabando, falsificação, produção ilegal, dentre outras. De acordo com o estudo do Ibrac, no caso das bebidas alcoólicas, as atividades irregulares têm o potencial de tirar R$ 10,2 bilhões dos cofres públicos anualmente. ;Esse é um momento sensível, para, efetivamente, revermos os tributos cobrados do setor de bebidas alcoólicas. Isso, talvez, não fará com que se reduza o mercado ilegal. No entanto, com certeza, o aumento da tributação e dos impostos só tende a contribuir para o incremento da clandestinidade e da sonegação;, alertou o diretor executivo do Ibrac, Carlos Lima. ;É hora de revermos paradigmas e verificar o que mais pode ser feito para corrigir esse problema;, acrescentou.
Perigo
Nas duas propostas de reforma tributária que tramitam no Congresso, há a sugestão de criação de um imposto seletivo, que seria voltado a produtos como cigarro e bebidas alcoólicas. Para o diretor do Ibrac, isso é um risco. ;Nosso grande medo é deixar na mão do governo uma chave para, precisando aumentar a arrecadação, aumentar o imposto seletivo. Ou seja, será criado um imposto que poderia até ter cunho arrecadatório, mas que, na verdade, cada vez que o governo precisar de caixa, será aumentado;, alertou.
Segundo Lima, a alta tributação imposta, principalmente, ao setor de destilados ; como cachaça, uísque e vodka ;, é o que mais explica a disparidade dos números. ;Houve uma alteração da forma de cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em 2015, que alterou a maneira de se tributar bebida alcoólica no Brasil, e, principalmente, os destilados, que tiveram alíquota de ad valorem majorada em 30%. A da cachaça, por sua vez, foi majorada em 25%, e em alguns casos, essa majoração representou um aumento concreto de mais de 270%, 330%;, comentou Lima.
No entender do executivo, considerando os números relativos apenas à cachaça, a produção ilegal da bebida já é maior do que as exportações. Em 2017, enquanto 8,74 milhões de litros de cachaça foram vendidos ao exterior, 112 milhões de litros produzidos de maneira ilegal foram comercializados no país. Ou seja, enquanto as exportações movimentaram R$ 50,4 milhões, quase 12 vezes mais, R$ 750 milhões, transitaram de forma ilícita.
Diante desse quadro, Lima acredita que, há algum tempo, o setor de destilados ultrapassou o ponto ótimo da curva de Laffer ; teoria econômica que compara a percentagem dos impostos cobrados com a quantidade que o governo pode obter como receita. ;É preciso reavaliar a carga tributária do setor de destilados. A alíquota já passou do ponto ótimo de tributação. Temos de trazer isonomia tributária. Não podemos viver em um regime tributário em que determinados produtos e categorias pagam menos tributos do que outras;, defendeu.
Questão de saúde
As práticas contra a lei, de acordo com o Ibrac, financiam a atuação de organizações criminosas e contribuem para que sejam comprados, por ano, mais de 60 mil rifles automáticos ou mais de 20 mil quilos de cocaína. Isso é possível, disse Lima, também pela ausência de uma agência especializada na supervisão e na fiscalização da produção de bebidas ; o Sistema de Controle da Produção de Bebidas (Sicobe), órgão da Receita Federal responsável por isso, foi extinto em 2016.
;Existe uma Medida Provisória tramitando no Congresso Nacional que pretende trazer o Sicobe de volta, e a gente aposta na volta do sistema para que possa coibir práticas ilícitas. É importante ser mais severo na aplicação de penas aos atos de clandestinidade. Não podemos mais fechar os olhos para essas atividades;, frisou o diretor executivo da Ibrac. Para ele, ;o mercado ilegal deve ser combatido, pois todos perdem;. ;O governo, principalmente, porque deixa de arrecadar um montante significativo de impostos e por ter que, cada vez mais, aumentar os gastos com saúde pública, pois o consumidor que bebe desse produto ilegal não tem ideia do que está consumindo. Ele pode estar ingerindo desde um produto com alto teor de etanol ou cobre, ou até mesmo algo que nem deveria ser álcool;, alertou.