Correio Braziliense
postado em 11/01/2020 04:04
O grupo alimentos e bebidas foi o vilão da inflação em 2019. A alta no custo de vida, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foi puxada pelas carnes, cujos preços dispararam no mercado interno, em consequência do aumento das exportações para a China e da desvalorização do real. Com isso, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, até 40 mínimos) subiu 1,15% em dezembro, o maior salto para o mês desde 2002, e fechou o ano em 4,31%, ligeiramente acima do centro da meta, de 4,25%. Apesar disso, a inflação se manteve dentro do limite de variação de 1,5 ponto percentual, para cima ou para baixo, definido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN)
Somente o grupo de produtos de alimentação subiu 6,36% no ano passado. “O destaque ficou com as carnes, com variação acumulada no ano de 32,40%, e aumento concentrado no último bimestre (27,61%). Pesaram também os planos de saúde (8,24%) e a alimentação fora do domicílio”, disse o gerente do IPCA, Pedro Kislanov.
Dos nove grupos de despesa, apenas o de artigos de residência baixou de preço (-0,36%) em 2019. Os demais tiveram alta: habitação (3,9%), vestuário (0,74%), transportes (3,57%), saúde e cuidados pessoais (5,41%), despesas pessoais (4,67%), educação (4,75%) e comunicação (1,07%).
O pico da inflação não chega a assustar. Mas a situação do pessoal de baixa renda tende a se agravar, já que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC, que mede o custo de vida das famílias com renda até cinco salários mínimos) teve alta acumulada de 4,48% no ano passado, ficando acima do reajuste do piso salarial, de 4,1%.
Combustíveis
“O governo não deve fazer nova correção no mínimo, pela necessidade de ajuste nas contas públicas. Até porque um dos motivos do pico foi o aumento do dinheiro em circulação pela liberação do FGTS. Um reajuste agora pioraria ainda mais a inflação”, disse George Sales, professor de Finanças do Instituto Brasileiro do Mercado de Capitais (Ibmec-SP).
Sandra Peres, analista da Terra Investimentos, destacou que o mercado está de olho no preço dos combustíveis, que podem subir, caso o conflito entre Estados Unidos e Irã se agrave. “A princípio, não se espera uma guerra. Assim, a expectativa é de que a inflação, em 2020, fique abaixo da registrada esse ano. A preocupação é que não haja interferência do governo na Petrobras para controlar os preços”, afirmou.
Victoria Santos Jorge, economista da Ativa Investimentos, acredita que, em janeiro, os preços baixarão e a inflação recuará. “Os transportes não vão ter peso significativo. Pelo menos duas cidades, Vitória (ES) e Campo Grande (MS), já recuaram do reajuste das tarifas de ônibus”, explicou.
Em dezembro, além da carne, outros produtos com forte influência no IPCA aumentaram e preço “Os destaques foram os combustíveis (3,57%) e as passagens áreas, que subiram 15,62% no mês. Os jogos de azar (12,88%) também, em função do reajuste nos preços das loterias”, disse Kislanov. O INPC ficou igualmente salgado (1,22%), com o pior resultado em 17 anos.
No dia a dia, a população sentiu o impacto do custo de vida. Até o sonho de enriquecer ficou prejudicado. O comerciante José Honorato da Silva, 55, joga há 40 anos e já chegou a desembolsar R$ 150 por mês. “A inflação causa isso. Quem jogava 10 volantes, agora aposta bem menos. Não vale a pena gastar horrores”, frisou Silva, que já ganhou R$ 15 mil em uma quadra da Quina, há 10 anos.
Izabel Maria da Poncificação, 46, desempregada, desistiu da carne bovina. “Compro mais ovos. Se tentar a carne, não dou conta de pagar o aluguel. É melhor cuidar da moradia do que o matar o desejo por um alimento”, disse Izabel, moradora de Planaltina, que vende doces na Rodoviária do Plano Piloto.
Pessoas na terceira idade estão entre as mais afetadas pelos aumentos nos planos de saúde e nos medicamentos. O servidor dos Correios Sérgio Eduardo, 60, abriu mão de outros itens para garantir o bem-estar. “Cortei supérfluos, deixei o carro na garagem e ando de ônibus e de metrô. Mas com o aumento da passagem, não será mais suficiente”, lamenta. O convênio médico do servidor, compartilhado com a empresa, subiu de 20%. “A saúde vem em primeiro lugar. Me sacrifico para pagar o plano”, disse.
Situação semelhante é a de Maria Limira, 75. A viúva se mantém com a pensão do falecido marido e gasta mais da metade da renda com medicamentos. “Alguns remédios que os médicos receitam são tão caros que nem vou atrás. Se for me encher de remédio, fico sem dinheiro nenhum”, afirma. Ela é pré-diabética. Toma cinco comprimidos por dia. Se não fosse dependente no plano de saúde da filha, não teria condições de pagar. “Faço bastante exercício para melhorar e não ficar com tanta dor. Nessa idade, tudo dói. É tanta dor que nem o bolso escapa”, brinca.
* Estagiárias sob supervisão de Odail Figueiredo
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