Correio Braziliense
postado em 16/01/2020 04:05
A decisão dos Estados Unidos de dar a prioridade à candidatura do Brasil a membro pleno da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o chamado “clube dos países ricos”, foi festejada pelo governo brasileiro. A sinalização vai deixar o Brasil “melhor posicionado para o processo de adesão”, de acordo com o Ministério de Relações Exteriores. Contudo, para especialistas ouvidos pelo Correio, a medida não garante que o processo seja concluído até o fim do mandato de Jair Bolsonaro.
O presidente comemorou o apoio, mas admitiu que a adesão não depende apenas dos EUA. “A notícia é muito bem-vinda. A gente vinha trabalhando há meses em cima disso, de forma reservada, obviamente. Houve o anúncio. São mais de 100 requisitos para você ser aceito”, afirmou.
Carta da Casa Branca com a recomendação enviada ao secretário-geral da organização, José Ángel Gurría, foi mencionada “muito brevemente” durante a reunião do Conselho da OCDE, ontem, mas “não foi discutida”, segundo uma fonte próxima de representantes da instituição, fundada em 1961, que abriga as economias mais ricas do planeta. Para ser aceito como país-membro, o Brasil precisa cumprir uma série de exigências e enquadrar-se às regras normativas da entidade, um processo que leva em média cinco anos, de acordo com analistas.
A OCDE atua como uma organização para cooperação e discussão de políticas públicas e econômicas. O Brasil vem trabalhando para entrar na entidade desde 2016. O processo de adesão oficial foi iniciado em 2017, durante o governo Michel Temer e ainda há um longo caminho para que o país receba o endosso dos 37 países-membros da organização.
“O fato de os EUA apoiarem o Brasil não significa que, automaticamente, o país será aceito. A aprovação precisa ser consensual entre os membros, e há questões de enquadramento que ainda devem ser cumpridas. O país está na primeira fase da candidatura. O apoio de uma potência é fundamental, mas isso não basta”, explicou a economista Lia Valls Pereira, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV).
Participação
Atualmente, o Brasil é parte de 82 dos 254 instrumentos normativos da OCDE e está solicitando adesão a outros 65 instrumentos, segundo o Itamaraty. “Trata-se do país não-membro com maior participação em instrumentos da OCDE: o Brasil participa dos trabalhos de aproximadamente 30 foros e instâncias da organização, entre comitês e grupos de trabalho relacionados a temas como comércio, investimentos, agricultura, governança, educação, proteção do consumidor e tributação”, destacou a pasta.
Especialistas apontam a corrupção e a melhorias no sistema tributário como dois grandes desafios para o Brasil conseguir se enquadrar nos padrões da OCDE. Na avaliação de Lia Valls, o país ainda pode enfrentar complicações na área de meio ambiente. “Os europeus dão muita importância à preservação ambiental, e o Brasil não tem avançado muito nessa agenda no novo governo”, lamentou.
A economista Monica De Bolle, pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics, sediado em Washington, lembrou que as eleições presidenciais nos Estados Unidos neste ano podem mudar o cenário. “Pode ser que o jogo mude e, com isso, Bolsonaro não vai ser o queridinho dos democratas”, alertou. Ela observou, ainda, que, ao contrário da Organização Mundial do Comércio (OMC), que foi esvaziada pelos Estados Unidos, a OCDE tem mais autonomia. “Os principais membros são europeus, e eles têm maior peso dentro da entidade”, destacou.
Wagner Parente, especialista em relações internacionais e CEO da BMJ Consultores Associados, frisou que, embora tardio, o apoio era esperado. “O Brasil tinha feito muitos gestos positivos ao governo americano, mas estava faltando essa sinalização da Casa Branca. Desde a visita de Bolsonaro a Washington, em março do ano passado, o Brasil fez mais concessões do que recebeu, como o aumento da cota de importação de etanol de 500 milhões para 700 milhões de litros, a isenção de vistos a americanos para entrada em território brasileiro, o alinhamento em diversos temas de conflito internacional, e não tinha recebido contrapartida”, disse.
Ele lembrou que, em outubro de 2019, o governo norte-americano enviou carta à OCDE com apoio às candidaturas de Argentina e Romênia, sem fazer menção ao Brasil. (Colaborou Rodolfo Costa)
- O que faz a OCDE
O que é a entidade para a qual o Brasil vem tentando entrar desde 2017
» Criada em 1961, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é conhecida como o “clube dos países ricos”, porque seus integrantes respondem por mais da metade da riqueza global.
» A maioria dos países tem PIB per capita elevado, com exceção de México e Turquia, que possuem renda média alta.
» Atualmente, a entidade, com sede em Paris, tem 36 membros. Desde 2010, seis novos países aderiram à OCDE. A Colômbia, que está em processo de adesão, deve se tornar o 37º membro da organização.
» A OCDE tem por objetivo promover políticas que visem o desenvolvimento econômico e o bem-estar social.
» Os membros da OCDE devem aceitar os princípios da democracia representativa e da economia de mercado.
» 80% do comércio e do investimento mundial é realizado pelos integrantes da OCDE.
» Participar da OCDE pode garantir acesso diferenciado a novos parceiros comerciais. E posicionar o país num patamar diferente em termos de relações exteriores globais.
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