Economia

INSS: governo recebeu alerta sobre colapso

Presidente da autarquia de maio a dezembro de 2018, Edison Garcia diz que chamou a atenção de equipe de transição de Bolsonaro, no fim daquele ano, para o risco de tecnologia oboleta e falta de pessoal provocarem paralisia no atendimento aos segurados

Correio Braziliense
postado em 18/01/2020 04:13
Segundo Garcia, governo atual não levou aviso a sério:

O apagão do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que está com um estoque de quase 2 milhões de processos com atrasos acima de 45 dias, foi anunciado ainda em 2018 ao governo de transição pelo então presidente do órgão, Edison Garcia, atualmente à frente da Companhia Energética de Brasília (CEB). Hoje, completa exatamente um ano a publicação de uma medida provisória (MP) editada por sugestão de Garcia para implementação de um programa de bonificação a fim de reter os funcionários prestes a se aposentarem, uma vez que os concursos para repor quadros foram suspensos. A MP n° 871, de 18 de janeiro de 2019, foi convertida na Lei nº 13.846, em 18 de junho do ano passado.

Garcia alertou a equipe de transição que a falta de pessoal e de estrutura, com tecnologia obsoleta e lenta, e o aumento na procura por benefícios por conta da reforma da Previdência precisavam ser equacionados, sob pena do desastre se concretizar, como, de fato, está ocorrendo. Sem conseguir dar vazão aos processos, o governo convocou 7 mil militares para atuar em mutirão nas agências do INSS, o que levou o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) a pedir a suspensão da contratação e os sindicatos a fazerem manifestações contrárias à medida (veja na matéria ao lado).

Segundo o INSS, são 1,9 milhão de requerimentos com mais de 45 dias aguardando análise, dos quais 500 mil foram examinados e aguardam complementação de informações ou documentação por parte dos requerentes. No entanto, entram por mês, em média, 900 mil novos requerimentos. “O governo prefere partir para a desculpa fácil de que a situação é herança da gestão anterior, quando deveria ser criativo. A questão não é o estoque, é como resolver o problema”, afirmou o ex-presidente, que permaneceu à frente do órgão de maio a dezembro de 2018.

Deficit

Garcia disse que, ao assumir o cargo, detectou os problemas e tentou implementar soluções. “Além do deficit de pessoal, há falta de infraestrutura. Das 1.704 agências do INSS, 1,3 mil tinham links de 512 kbytes, equipamentos lentos até para fazer downloads”, lembrou. Em junho de 2018, um levantamento apontou que, dos 45 milhões de requerimentos por ano, 30 milhões eram busca de informação. “Dois terços poderiam ser solucionados por aplicativo que desenvolvemos em parceria com a Dataprev. No ano passado, houve uma ampliação dos serviços dentro do app Meu INSS”, informou.

Como o diagnóstico apontava que a falta de pessoal e infraestrutura, somada ao crescente número de requerimentos, levaria a um apagão, Garcia propôs o pagamento aos funcionários de um bônus de R$ 60 por encaminhamento de processos acima de seis por dia. “Foi uma forma de reter o pessoal, mas a MP demorou para virar lei, e mais ainda para ser implementada. Muitos funcionários se aposentaram, por conta da iminente reforma da Previdência”, disse.

Bônus


Garcia retirou do balcão de atendimento a concessão de benefício, cuja média era de 2,5 atendimentos diários, e criou centrais para análise de processos. “Cada um dos 5 mil profissionais dedicados poderiam analisar 10 processos por dia. Seriam 220 processos por mês por empregado, ou seja, 1 milhão por mês, no total. Isso reduziria o estoque, e os bônus seriam bancados pela economia com multas, já que processo atrasado em mais de 45 dias paga multa, juros e correção monetária”, explicou. Em 2017, segundo ele, o valor pago chegou a R$ 350 milhões.

Além dessa proposta, que, depois de implementada, ainda que tardiamente, de fato aumentou a produtividade do INSS (veja quadro ao lado), Garcia tentou fazer concursos. “O INSS já teve 50 mil funcionários, número que caiu para 33 mil em 2018, e, hoje, tem 21 mil (23 mil segundo a assessoria do órgão). Mas não fui autorizado. Tentei realocar servidores dos Correios, que precisavam reduzir 10 mil empregados. Fiz proposta de assumir 5 mil para treinar e concentrar toda a força técnica do INSS em reconhecimento de direito. Também tentei na Infraero”, assinala.

De acordo com o ex-dirigente, o atual governo acredita que a inteligência artificial pode resolver tudo. “Mas robôs não conseguem fazer o reconhecimento de direito aos benefícios. É preciso conhecimento de matéria previdenciária, analisar se as certidões emitidas são válidas, porque há muita fraude e o servidor pode ser responsabilizado”, explicou. “Criamos o teletrabalho para manter os profissionais mais experientes em casa. Não foi a herança que levou à atual situação. Tudo que podia ser feito, nós fizemos. Mas nada foi aplicado.”

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