Pronunciamento feito ontem pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, provocou fortes reações entre ambientalistas. Ao participar de um painel sobre o futuro da indústria, o ministro disse que o grande inimigo do meio ambiente é a pobreza. “As pessoas destroem o ambiente porque precisam comer”, justificou. Guedes afirmou, em outro momento do mesmo evento, que o mundo precisa de mais comida e que é preciso usar defensivos agrícolas para auemntar a produção. “Isso é uma decisão política, que é complexa”, afirmou.
Os números, no entanto, contradizem o ministro. Os países mais ricos são os que comprometem mais os recursos naturais. Em 2018, todas as nações da América Latina, juntos, emitiram 17% do total da China. O país asiático e os Estados Unidos, as duas maiores economias do mundo, emitiram 10,5 mil megatoneladas de dióxido de carbono (CO2), principal gás responsável pelo efeito estufa, segundo o Global Carbon Atlas. No mesmo ano, o Brasil emitiu 457 megatoneladas de CO2.
Para José Francisco Gonçalves Júnior, professor do Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília, o ministro tentou simplificar o que é complexo. “O meio ambiente tem várias vertentes. Claro que a pobreza tem impacto, quando não se tem saneamento público ou falta educação para conhecer os efeitos das ações”, reconheceu. “Agora, os grandes problemas ambientais brasileiros vêm do agronegócio, da exploração dos recursos naturais de forma desordenada e de uma fiscalização inadequada. Os países mais ricos são os maiores emissores de CO2 do planeta e têm boa parte das suas florestas degradadas. Não é uma verdade associar a pobreza à devastação ambiental”, acrescentou.
As declarações do ministro provocaram reação imediata. De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, “o modelo de desmatamento no Brasil não reduziu a pobreza, mas concentrou a riqueza na mão do grande agronegócio”. Luiza Lima, da campanha de Políticas Públicas do Greenpeace, destacou que o governo brasileiro, “mais uma vez”, gerou constrangimento internacional, piorando a imagem do Brasil. “Paulo Guedes não só defendeu um modelo de agricultura atrasado, poluente, tóxico e que concentra riqueza na mão de poucos, como culpou o pobre pela destruição do meio ambiente, quando, na verdade, o pobre é a principal vítima”, disse.
Segundo a especialista, a frase de Guedes deveria ser: “O inimigo do pobre é a destruição do meio ambiente”. “Afinal, são os mais pobres os que sofrem os impactos da destruição das florestas, dos rios e dos ecossistemas. São eles os mais impactados em casos de eventos extremos relacionados às mudanças climáticas, como furacões, tornados, enchentes e secas”, ressaltou.
Trump e Greta
Uma das estrelas do Fórum de Davos, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, criticou os “catastrofistas” que alertam para as sérias consequências das mudanças climáticas, em um discurso diante de líderes políticos, econômicos e outras personalidades, entre elas a ativista sueca Greta Thunberg. “Temos que rejeitar os eternos catastrofistas e suas previsões apocalípticas”, disse Trump, poucas horas depois de Greta denunciar que “nada tem sido feito” para combater o aquecimento global.
Trump acusou os “herdeiros dos insensatos videntes do passado” de se enganarem sobre a mudança climática, como já fizeram, segundo ele, quando previram décadas atrás a superpopulação do planeta, ou o fim do petróleo. “Nunca deixaremos os socialistas radicais destruírem nossa economia”, afirmou. Já a ativista sueca lamentou que as “emissões de dióxido de carbono não tenham diminuído” desde o fórum do ano passado. “Estamos todos lutando pelo clima, mas, se olharem de uma perspectiva geral, na prática, não se fez nada. Precisamos de muito mais do que isso”, afirmou Greta.
Governo vai comprar de estrangeiros
O Brasil vai abrir as compras governamentais para fornecedores estrangeiros, anunciou, ontem, o ministro da Economia, Paulo Guedes, durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos. O país vai aderir ao acordo internacional do qual fazem parte nações da Europa, Estados Unidos, China e Japão. “Agora, passamos a admitir empresas de fora para todas as compras. Será um tratamento isonômico”, explicou. Com isso, empresas nacionais podem perder espaço num mercado que movimentou, em 2019, R$ 56,8 bilhões em materiais e serviços.
Segundo Guedes, a adesão faz parte de uma das promessas de campanha do presidente Jair Bolsonaro, de atacar a corrupção. “Você quer ter as melhores práticas, receber os maiores fluxos de investimentos, se integrar às cadeias globais de negócio ou continuar com 200 milhões de trouxas servindo a seis empreiteiras, seis bancos? O Brasil não pode ser uma fábrica de bilionários às custas de seus consumidores”, disparou.
No ano passado, a União gastou R$ 22,8 bilhões em material de consumo e R$ 33,9 bilhões em serviços de terceiros, segundo levantamento da Associação Contas Abertas. Os setores mais significativos foram medicamentos (R$ 12,9 bilhões), serviços hospitalares e odontológicos (R$ 4,7 bilhões), energia elétrica (R$ 3 bilhões), material para produção industrial (R$ 1,6 bilhão) e alimentação (R$ 1,3 bilhão).
O secretário-geral da Contas Abertas, Gil Castello Branco, disse ser favorável a um choque de competitividade a partir do mercado governamental. “A Lava-Jato demonstrou claramente o cartel existente na contratação de obras e na aquisição de equipamentos pelo governo federal em vários setores como a construção civil e o setor elétrico;”
“No geral, os subsídios, as barreiras comerciais e as políticas exacerbadas de apoio às empresas nacionais acabaram prejudicando as companhias mais produtivas. Se a maior competitividade implicar gastos governamentais menores, o beneficiado será o contribuinte”, avaliou Castelo Branco. “A dificuldade será alinhar o processo licitatório às tributações dos países concorrentes, caso contrário não teremos isonomia das participantes”, alertou.
Segundo o diretor de Desenvolvimento Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Abijaodi, o Brasil tem feito progressos em negociar acordos que incluem compromissos em compras governamentais, como foi com a União Europeia, Mercosul, Chile e Peru. “Eles precisam ser equilibrados para, de um lado, garantir mais acesso às exportações do Brasil e, de outro, manter políticas públicas importantes para o país e para setores, como fazem as principais economias. É um acordo que levará alguns anos para ser negociado e que a indústria acompanhará com atenção, pois o seu sucesso depende da calibragem dos compromissos”, ressaltou.
Para a economista Margarida Gutierrez, professora do Coppead/UFRJ, o anúncio é positivo. “Isso já foi tentado no governo Temer. Cria transparência na política de compras, porque as regras são claras, com critérios internacionais, que não dão margem a corrupção”, afirmou. Além disso, a medida facilita a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).”
Na opinião do economista José Luis Oreiro, da Universidade de Brasília (UnB), a medida vai na contramão do que países como os Estados Unidos estão fazendo. “O Brasil vai ser o único no mundo sem uma política de compras voltada para o mercado doméstico. Os EUA aumentaram a obrigatoriedade de conteúdo nacional, uma política adotada por países desenvolvidos. A Itália só compra carros Fiat”, destacou. (SK)
Dólar volta os R$ 4,20
O dólar rompeu, novamente, a barreira dos R$ 4,20: fechou ontem em alta de 0,38%, cotado a R$ 4,205. Além da perspectiva de nova queda da taxa básica de juros (Selic) na reunião de fevereiro do Comitê de Política Monetária (Copom), o que afasta o capital estrangeiro das operações de renda fixa, investidores temem o impacto econômico do coronavírus, um vírus desconhecido que apareceu na China. A potência asiática já não cresce mais dois dígitos e se expande ao redor de 6% ao ano, limite para que possa continuar agregando pessoas ao mercado de consumo. A Bolsa de Valores de São Paulo operou em queda de 1,54%, fechando em 117.026 pontos.
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