Economia

Vírus pode frear PIB em 2020

Epidemia de coronavírus tem potencial para provocar redução de meio ponto percentual no crescimento brasileiro neste ano, segundo analistas. Cálculo leva em conta que avanço da China, maior parceiro comercial do país, seria limitado a 4%

Correio Braziliense
postado em 01/02/2020 04:13
Mina da Vale: produção de minério de ferro pode ser uma das mais afetadas, ao lado de setores como siderurgia, petróleo, turismo e frigoríficos

A desaceleração da economia da China pode tirar até meio ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro este ano. Isso ocorrerá se a crise na potência asiática, provocada pela epidemia do coronavírus, for capaz de derrubar o crescimento do país, em 2020, dos estimados 6,5% para 4%, como preveem os analistas mais pessimistas. Cálculos de especialistas apontam que cada 1 ponto percentual de queda no PIB chinês tira 0,2 ponto do Brasil.

O ministro conselheiro da Embaixada da China, Qu YuHui, disse que ainda é muito cedo para dizer qual será o impacto do vírus sobre a economia chinesa. Contudo, reconheceu ser inegável que o surto vai afetar de alguma forma. “As medidas de isolamento dos cidadãos e de bloqueio a algumas cidades vão atrapalhar o fluxo comercial e vão esfriar a economia chinesa. O turismo, certamente, será bastante afetado”, admitiu.

A China é o principal parceiro comercial do Brasil e qualquer abalo na sua economia respinga no país, sobretudo nos exportadores de commodities. Mineração, celulose, siderurgia e petróleo são os setores mais afetados a curto prazo, explicou Gustavo Bertotti, professor da FSG — Centro Universitário da Serra Gaúcha e head de renda variável da Messem Investimentos. “A China responde por 70% do mercado brasileiro de minério”, observou.

Empresas como Vale, Gerdau, Suzano, Klabin e Petrobras já sentiram o impacto nas ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (B3). “A Vale fechou janeiro com queda de 5,68% no mês. Os papéis preferenciais da Petrobras se desvalorizaram 5,73%”, listou Bertotti. O barril de petróleo no mercado internacional despencou 15%. “Outro setor que pode ser impactado é o de alimentos e frigoríficos. BR Foods recuou 13,21% em janeiro”, disse. Com restrições de viagens, o turismo também sentirá o baque, sobretudo as companhias aéreas brasileiras, e a CVC, que estava buscando recuperação, alertou.

A desaceleração da economia chinesa estava precificada desde o ano passado, conforme o professor Francisco Olivieri, superintendente geral do Instituto Mauá de Tecnologia. “Mas o surto do coronavírus pode agravar isso. A China vai consumir menos minério. A Vale vai perder dinheiro”, avaliou. O especialista, contudo, ressaltou que o país pode ganhar com as commodities do agronegócio. “Os chineses não vão deixar de comer. E com a desvalorização do real, nossas exportações vão ficar mais baratas”, considerou.

Como 28% da pauta de exportação do Brasil são de produtos básicos, as vendas externas estão sentindo o baque da desaceleração da economia mundial, disse Alex Agostini, economista-chefe da Austin Ratings. “As exportações mostram declínio de 30% nas quatro primeiras semanas do ano. Com a doença, podem cair mais 30% em fevereiro”, estimou. Segundo o especialista, o setor externo representa 14% do PIB brasileiro, e a China pode perder um ponto percentual de crescimento do PIB, o que tira 0,2 do PIB brasileiro. “Nossa projeção ainda é de 2,4% de alta, porque, por ora, não temos elementos suficientes para revisá-la. Mas instituições, como o JP Morgan, revisaram para baixo as previsões para o PIB mundial no primeiro trimestre”, ressaltou.

O Brasil também é importador de produtos manufaturados da China. No entanto, segundo Fábio Bentes, economista da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNT), a possibilidade de a epidemia afetar o varejo ainda é baixa. “Só se tiver alastramento sem controle. Os segmentos que sentiram a curto prazo foram o aéreo e o turismo, mais diretamente relacionados ao foco do problema”, disse. Olivieri, do Instituto Mauá, observou, entretanto, que o desembaraço de produtos chineses nos portos e aeroportos pode encarecer as importações. “Os procedimentos de descontaminação devem ser intensificados”, pontuou.

Vandyck Silveira, CEO da Trevisan Escola de Negócios, é mais otimista. Segundo ele, a China está fazendo a lição de casa, colocando 60 milhões de pessoas de quarentena. “Há um pouco de histeria coletiva, como ocorreu com a Sars e o H1N1. As autoridades chinesas estão sinalizando que têm responsabilidade, e o controle pode ser a curto prazo, sem grande impacto na economia”, opinou.


"As exportações mostram declínio de 30% nas quatro primeiras semanas do ano. Com a doença, podem cair mais 30% em fevereiro”
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Ratings

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