Correio Braziliense
postado em 25/02/2020 04:16
Para evitar o caos financeiro
Tem repercutido bastante a recente decisão do estado de Minas Gerais, que, mesmo numa situação financeira extremamente frágil e sem apresentar o impacto futuro nas contas previdenciárias — o que contraria portaria do Ministério da Economia —, enviou à sua assembleia uma proposta de reajustar os salários da área de Segurança em 42%, até o final do atual mandato.
Considere-se, ainda, que, na prática, Minas já terá dado um aumento à Segurança, ao editar decreto postergando por dois anos a vigência das regras de inatividade e pensão da Lei Federal 13.954/19, que adiaria a aposentadoria de militares em Minas, servidores esses que, na maioria dos casos, vão hoje para a reserva com menos de 50 anos.
Numa espécie de represália, a assembleia mineira está propondo ao Executivo estender idêntico reajuste às demais carreiras importantes do estado, o que poderá levar ao caos financeiro total, com impacto direto de R$ 20 bilhões em três anos, sem falar no efeito sobre os demais estados — veja-se o caso da atual crise do Ceará. Pondo isso em prática, Minas tenderá a se tornar o estado com o maior desequilíbrio financeiro relativo da nação, com tudo de ruim que isso implicará para a sua população, enquanto o discurso de seus principais dirigentes, a julgar por vários vídeos disponíveis no YouTube, se mostra fora de sintonia com esse quadro.
Para ajustar o foco da ação estadual, sugiro começar pela leitura de minha coluna no O Estado de S.Paulo de 13/02/20, onde, com base em dados de 2015, expliquei que, mais do que em outros estados, quase 93% do gasto de Minas é, basicamente, incomprimível, dominado, como está, pelos que chamo de “donos do orçamento”. Disputando a posição de maior peso estão: Previdência (28% da receita); Educação (16,4%) e Segurança (15,7%), afora outros. Daí os elevados deficits que vêm sendo observados nas contas deste estado. Cabe lembrar que o velho recurso de atrasar pagamentos na boca do caixa não pode, pela Lei de Responsabilidade Fiscal, ser usado com a intensidade com que vem sendo utilizado neste e em vários estados, especialmente no caso da Previdência, dado o enorme desgaste que uma quebradeira comandada por velhinhos na porta dos bancos pagadores acarretaria.
Não fora a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender o pagamento da dívida mineira com a União — outro item incomprimível —, Minas, em vez de apenas atrasar o pagamento de certa parcela dos gastos, já teria mesmo de quase ter zerado gastos supostamente discricionários, que, aos poucos, de tão contidos, vão se tornando “obrigatórios”.
A propósito, o deficit previdenciário mineiro estimado para este ano, mesmo sem contar o impacto dos reajustes salariais, se situa em R$ 17 bilhões, projetando-se um buraco orçamentário total de R$ 13 bilhões, já que, diante da elevada dimensão da fatia dos que dominam o orçamento, as demais contas só conseguem gerar um superavit de R$ 4 bilhões. Dados os reajustes salariais em pauta, o deficit total aumentaria para R$ 20 bilhões, paralisando completamente o estado. Ou seja, não dá para fingir que o problema não é sério.
Diante disso, cabe promover, de um lado, uma espécie de revisão de “pacto federativo”, frase que tanto se usa hoje em dia nesse tipo de discussão, concentrada no âmbito subnacional, em que se proporiam cortes de parte dos gastos de maior peso, a serem negociados com os principais “donos” de fatias orçamentárias, em linhas que, por falta de espaço, deixo de detalhar, oferecendo-lhes em troca um bom equacionamento das várias previdências setoriais.
Já para equacionar o deficit previdenciário subnacional, deve-se levar em conta o impacto da reforma de regras da previdência pública aprovada recentemente em vários estados, e a exigência — agora com sustentação na Constituição Federal –, de os entes apresentarem a Brasília até 31/7/2020 — e ali aprovarem — um plano corretamente definido, conforme passou a dispor a Constituição, com essa finalidade. Essa é a grande novidade dos últimos tempos, que muitos dirigentes subnacionais não parecem ter percebido bem, mas que tem de ser feito independentemente de tudo o mais, e sujeito às duras penas também inseridas na Constituição em caso de descumprimento, inclusive enquanto se revê o que chamei de pacto.
Nesse mesmo contexto, deve-se destacar a novidade que se abriu de, esgotadas outras possibilidades, como aportes de ativos, entre outras, se cobrarem alíquotas extraordinárias para fechamento de conta de todos os participantes (antes era só do empregador), e contribuição de aposentados e pensionistas que ganhem acima de um salário mínimo (antes era só para valores acima do teto do INSS, algo hoje ao redor de R$ 6 mil), conforme indicarem os estudos atuariais, nas leis anuais de revisão dos planos previdenciários. Assim, os entes passaram a dispor de uma base mais sólida de sustentação jurídica para atacar o que considero ser o problema fiscal número 1 do país — os elevados (e menos lembrados) deficits previdenciários subnacionais, e a passarem a informação precisa e adequada aos mercados.
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