Economia

Empresas podem demitir 30%

Crise provocada pela pandemia de coronavírus deve deixar 25 milhões de pessoas sem trabalho em todo o mundo. No Brasil, companhias anunciam férias coletivas e começam a pensar em dispensar funcionários. Para especialistas, governo precisa agir com urgência

Correio Braziliense
postado em 20/03/2020 04:04
Fábrica da Volkswagen, que anunciou férias coletivas a partir do dia 31:  segundo a Anfavea, montadoras se preparam para suspender a produção

A pandemia de coronavírus acabará com o emprego de milhões de pessoas em todo o mundo e o movimento, no Brasil, já começou. Com a queda na demanda, pelo fechamento de fronteiras, shoppings, lojas e cancelamento de eventos, as empresas estão programando demissões que podem chegar a 30% da folha. Para especialistas, é preciso que o governo regulamente o quanto antes as medidas de flexibilização trabalhista para evitar o pior. Da indústria ao trade turístico, passando pelos transportes e pelo comércio, poucos setores passarão ilesos.

Globalmente, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a pandemia poderá deixar sem trabalho 25 milhões de pessoas, prevendo que os trabalhadores perderão renda de até US$ 3,4 trilhões em 2020. No Brasil, as empresas estão anunciando férias coletivas e estudando paralisações, mas não descartam demitir funcionários. Em bares e restaurantes, o recuo nas vendas está entre 50% e 60%; nos salões de beleza, em 80%. Os pedidos por motoristas de aplicativos diminuíram cerca de 60% nos últimos dias.

A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), anunciou, ontem, que todas as empresas associadas estão analisando e se preparando para tomar ações de paralisação das suas fábricas no Brasil. A Volkswagen suspenderá a produção a partir de segunda-feira por três semanas. Até 30 de março, os empregados da área administrativa continuam em trabalho remoto e os da linha de produção, em folgas administradas por banco de horas. A partir de 31 de março, os empregados estarão em férias coletivas por duas semanas.

Segundo André Melo, da área de direito do trabalho do escritório Dias Carneiro, as medidas anunciadas pelo governo precisam ser regulamentadas logo. “Reduzir jornada e salário é uma saída para não demitir, mas, por enquanto, o que vale, na lei, são as convenções coletivas”, explicou. Para o especialista, ainda não ficou claro quais medidas serão adotadas, e por quais setores. “Falou-se em três meses com redução de 50% de salário, mas é preciso agir rapidamente. As empresas já estão programando demissões que vão de 5% a 30% da folha”, alertou.

Para Daniel Duque, pesquisador associado da área de economia aplicada do FGV-Ibre, é preciso avaliar o crescimento do desemprego considerando que muitas pessoas são informais e não vão procurar trabalho, mas aumentar a conta dos desalentados. “O desemprego não vai ser a melhor métrica para analisar o impacto. Ninguém vai procurar emprego em uma situação de contágio”, explicou. Segundo o Ibre, 300 mil pessoas podem deixar o grupo de população ocupada no Brasil este ano. “Isso, no cenário possível de agravamento da recessão”, explicou.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) enviou, ontem, uma lista de 37 propostas ao governo para atenuar os efeitos do coronavírus na economia brasileira. “Entre as medidas apresentadas, estão redução de exigências para a adoção do teletrabalho, a ampliação do tempo para compensação de banco de horas e permissão expressa para alteração de horários de trabalho”, disse. Há, ainda, medidas para dar proteção ao trabalhador, como reativação do seguro-emprego e a ampliação do lay off, que permite a suspensão dos contratos de trabalho com a manutenção do vínculo empregatício.

A especialista em recursos humanos Mônica Hauck, fundadora da plataforma de recrutamento Sólides, explicou que é preciso avaliar se é estratégico demitir as pessoas. “Não se sabe quanto tempo essa pandemia vai durar. A China já retomou. Se o gestor começar agora uma onda de demissões, isso pode custar mais caro na recontratação”, assinalou. Viviane Morcelli, diretora de negócios da HR Timbre, ressaltou que a adoção de estratégias ainda depende de homologação de costuras legais. “Não pode estabelecer acordo que gere passivo trabalhista. Existe uma boa vontade dos dois lados, do empregador e do colaborador, de encontrar uma forma que os impactos sejam sentidos da menor forma possível”, disse.

No entender de Rodrigo Nunes, advogado sócio da área trabalhista do Cascione Pulino Boulos Advogados, além das demissões de empregados formais, a economia vai se ressentir muito da desocupação dos informais, que hoje somam 38 milhões pessoas. “Quem não recolhe, não tem proteção nenhuma. Essa iniciativa do governo, de um auxílio de R$ 200 para ajudar no orçamento, é positiva, mas pode não ser suficiente”, destacou.

Ele alertou, ainda, que as empresas precisam considerar que muitos empregados podem cair doentes, ficando mais de 15 dias afastados. “Isso vai afetar o já combalido orçamento da Previdência Social, mas também vai deixar as empresas sem pessoal”, ressaltou. O especialista observou que a pandemia chegou no pior momento em termos de empregabilidade no país. “E também de mudança internacional de paradigma, com a uberização do trabalho. Um cenário de tempestade ideal”, lamentou.





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