Economia

Longe da mínima do dia, Bolsa fecha em baixa de 5,45%, aos 75.330,61 pontos

Correio Braziliense
postado em 24/04/2020 18:15
A saída do ministro Sergio Moro com o dedo apontado para ingerência política do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal criou tempestade perfeita nesta sexta-feira, 24, com dólar em novos níveis recordes e o Ibovespa ameaçando chegar a "circuit breaker" no pior momento do dia, aos 72.040,82 pontos (-9,58%), para depois moderar perdas e fechar em baixa de 5,45%, aos 75.330,61 pontos, vindo de duas semanas de recuperação. Pouco antes do fechamento, o presidente iniciava entrevista no Planalto na qual buscou explicar os motivos para a substituição de Mauricio Valeixo no comando da PF, e para a suspensão da "carta branca" que havia concedido a Moro para atraí-lo ao governo, em novembro de 2018. "Sabia que não seria fácil. Uma coisa é você admirar uma pessoa, outra é conviver e trabalhar com ela", disse Bolsonaro logo na abertura, tendo atrás de si alguns de seus ministros mais alinhados, como Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Damares Alves (Família), Onyx Lorenzoni (Cidadania) e o recém-empossado da Saúde, Nelson Teich. "A indicação para o comando da PF inicialmente foi de Moro, porque eu confiava nele", afirmou o presidente. "Estou lutando contra o sistema, contra o establishment", acrescentou Bolsonaro, retomando mote da campanha eleitoral. A fala não alterou o fechamento na B3. O giro financeiro totalizou R$ 37,6 bilhões e, com a perda de 4,63% nesta semana, o Ibovespa limita o avanço acumulado no mês a 3,16%, cedendo agora 34,86% no ano. A pedra no caminho interrompe a recuperação e o padrão menos volátil observado até aqui em abril, especialmente se comparado a fevereiro e março, quando a pandemia do coronavírus estremeceu o mercado no período posterior ao carnaval. Assim, o Ibovespa fechou hoje no menor nível desde 6 de abril, então aos 74.072,98 pontos. Nas últimas sete sessões, o índice vinha flertando com os 80 mil pontos, tendo rompido no intradia esta linha de resistência em seis dessas ocasiões, e chegado ontem aos 81.933,50 durante a sessão, no maior nível desde 16 de março no intraday. Nesta sexta-feira, as ações com maior exposição ao fator político figuraram entre as mais punidas da sessão, com Eletrobras PNB em queda de 13,17%, Petrobras ON, de 7,32%, e Banco do Brasil ON, de 13,37%, no encerramento da sessão. As ações de bancos privados também foram mal, com destaque para queda de 10,96% em Bradesco ON. Apenas quatro ações do Ibovespa, três das quais com exposição a exportações, fecharam o dia em terreno positivo, beneficiadas pela nova escalada do dólar: Suzano (+7,03%), Klabin (+1,71%), Bradespar (+0,99%) e Vale (+0,57%). Na ponta negativa do índice, ações de empresas prejudicadas pelo dólar forte, como Azul (-14,54%) e CVC (-13,86%). A moeda americana à vista fechou em nova máxima histórica, negociada a R$ 5,6614(+2,40%), no fechamento, tendo chegado a R$ 5,7484 na máxima da sessão. A pressão sobre o dólar contribuiu para os juros futuros voltarem a empinar para cima, com o mercado de renda fixa revisando a margem que o Copom terá para atuar na Selic em maio. Com o desembarque do ministro da Justiça, a atenção do mercado se volta para outro pilar de primeira hora do governo Bolsonaro, o ministro da Economia, Paulo Guedes, que tem se mantido em silêncio desde que um plano de investimentos públicos, capitaneado pela ala militar, foi anunciado esta semana no Palácio do Planalto, sem sua presença. Nesta sexta-feira, orientado por auxiliares, Guedes cancelou de última hora participações em duas videoconferências, uma das quais promovida pelo Itaú. Na visão de analistas, economistas e mesmo de especialistas jurídicos, as declarações de Moro sobre a atuação de Bolsonaro no afastamento de Valeixo, para ter controle pessoal da instituição, sugerem que o presidente pode ter cruzado o legalmente tolerável, reforçando a possibilidade de que seu governo expire antes do prazo, com impeachment. "Infelizmente, isso (impeachment) entrou no radar. É algo que a gente não queria ter de abordar de novo em um espaço tão curto de tempo, e no curto prazo é o pior cenário", diz o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira. "É a pá de cal do governo Bolsonaro, que já estava fraco, porque ele perde parte do apoio da população que o elegeu com base na honestidade e na agenda contra a corrupção" diz Solange Srour, economista-chefe da ARX Investimentos, acrescentando que a demissão de Moro deu impulso a uma crise política que já vinha em andamento. Nesta semana, Celso de Mello, ministro e decano do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), delibere sobre os pedidos de impeachment já apresentados. A iniciativa foi apenas a mais recente de uma série de derrotas políticas acumuladas por Bolsonaro nos últimos dias: além da ruidosa saída de Moro, figuram na lista a autorização dada pelo STF para que se investiguem as manifestações antidemocráticas do último fim de semana e a garantia do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), de que a CPMI das Fake News chegará ao fim, sem atropelos. Assim, o risco político, em doses não vistas até aqui no governo Bolsonaro, é adicionado à pandemia de coronavírus, ainda sem sinais de declínio no Brasil, o que torna mais incerto o panorama para a economia. "Será preciso uma resposta rápida e contundente por parte de Bolsonaro para restabelecer o elo com o mercado, que confia, até segunda ordem, na condução da equipe econômica. Se essa estrutura for rachada - ou seja, a equipe de Paulo Guedes ou o próprio ministro forem rechaçados como Moro -, o mercado irá pesar forte e o dólar não vai parar tão cedo", diz Rafael Ribeiro, analista da Clear Corretora.

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