O governo central registrou deficit primário (gastou mais do que arrecadou) de R$ 92,9 bilhões em abril passado, informou o Tesouro Nacional. É o pior desempenho para abril da série histórica, iniciada em 1997. No mesmo mês de 2019, as contas públicas tiveram resultado positivo de R$ 6,5 bilhões. A redução significativa na arrecadação e o aumento nas despesas do Poder Executivo, em consequência de medidas de combate à pandemia da covid-19, foram os principais responsáveis pelo resultado.
O secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, avaliou que, em termos anuais, o deficit, atualmente em 2,58% do Produto Interno Bruto (PIB, soma das riquezas do país), vai se agravar, com recordes negativos também em maio e junho, podendo ultrapassar os 10% do PIB em 2020 — nível considerado preocupante por analistas econômicos. “Vai piorar muito, e pode ser bem maior que 10% do PIB”, afirmou. Com o desempenho de abril, o rombo nas contas públicas no primeiro quadrimestre chegou a R$ 95,8 bilhões. No ano passado, no mesmo período, o deficit era de R$ 2,8 bilhões.
Mansueto alertou que novos adiamentos de pagamentos de impostos ou refinanciamento de tributos terão forte impacto na arrecadação, deteriorando ainda mais a situação fiscal e defendeu a continuidade das reformas fiscais.
“Daqui para a frente, o comportamento das contas públicas vai depender de como o país avançará nas reformas estruturais”, disse o secretário. “É necessário diálogo, não só para o combate à covid-19, como também para as reformas pós-pandemia. Sairemos dessa crise com uma dívida alta. Se o Brasil conseguir construir um sistema tributário mais amigável, enfim, se fizer o dever de casa, sairemos melhor. Se falharmos, a conta será grande. O Brasil tem que continuar com a agenda das reformas estruturais”, enfatizou.
No mês passado, o governo registrou queda real (já descontada a inflação) de 35,6% na receita líquida e crescimento real de 44,7% na despesa total, em comparação com abril de 2019. Segundo o Tesouro, tiveram influência na diminuição da receita, principalmente, o adiamento de R$ 35,1 bilhões na arrecadação de tributos e a queda de R$ 1,6 bilhão no recolhimento do Imposto de Operações Financeiras (IOF).
Já as despesas sofreram o impacto das medidas de combate à crise sanitária que somaram R$ 59,4 bilhões no mês, com destaque para auxílio emergencial (R$ 35,8 bilhões), financiamento para pagamento de folha salarial (R$ 17 bilhões) e despesas adicionais do Ministério da Saúde e demais ministérios (R$ 4,8 bilhões). Também pesaram os benefícios previdenciários, que cresceram 15,1% em termos reais (R$ 7,4 bilhões), com a antecipação do pagamento de 13º de aposentadorias e pensões.
Apesar do recorde, o resultado negativo de abril foi recebido com relativa tranquilidade pelo mercado, pois a ocorrência de um déeficit elevado era esperada. O economista Cesar Bergo, sócio consultor da Corretora OpenInvest, ponderou, no entanto, que a expectativa de rombo fiscal de 10% do PIB em 2020 é muito ruim. “Nenhum país sobrevive assim”, argumentou.
Alex Agostini, economista-chefe da Agência Austin Rating, ressaltou que o resultado de maio será bem pior, já que grande parte dos recursos para o auxílio emergencial acabou sendo transferida para este mês. “O Estado não tem muito espaço para abrir mão de recursos, adiar impostos ou fazer benevolência com o dinheiro público”, afirmou.
No entanto, para Agostini, a questão, não é um deficit de 10% do PIB. “O problema é a briga entre Executivo e Legislativo. O novo texto da Medida Provisória 936 (que flexibiliza contratos de trabalho), por exemplo, mostra que o governo vai ter uma receita menor em R$ 43 bilhões. É esse tipo de problema que gera risco fiscal em relação ao futuro”, afirmou. Agostini projeta deficit de R$ 133 bilhões em maio para o governo central.
O economista Eduardo Velho, estrategista da INVX Global Brasil, concorda com o argumento de Mansueto de que, no futuro, serão determinantes as reformas estruturais, principalmente a tributária, e a redução da participação do Estado na economia. “Os analistas políticos estão dando mais importância ao engajamento político, ou seja, à união do governo com o Congresso, para a retomada de reformas. Essa, sim, é a variável mais importante para reduzir o risco fiscal”, disse. (VB)
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