A crise do novo coronavírus vai provocar um ano de perdas históricas e generalizadas no comércio brasileiro. A pandemia provocou o fechamento da maior parte do varejo e também deixou muitos consumidores sem emprego ou com medo de se endividar. Por isso, o setor viu as vendas desabarem na quarentena e não espera recuperar isso tão cedo. A Confederação Nacional do Comércio (CNC) já projeta até uma queda de 10,1% no ano, o que faria com que as vendas do varejo retrocedessem ao volume observado em 2010.
O tamanho do estrago causado pela covid-19 em um dos setores que mais emprega e mais movimenta a economia brasileira veio à tona ontem. Logo cedo, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que, só em abril, o varejo caiu 16,8% em relação ao mês anterior. O comércio varejista ampliado, que inclui as vendas de automóveis e materiais de construção, teve recuo de 17,5%.
O tombo foi o maior dos últimos 20 anos: superou negativamente as expectativas do setor e levou a CNC a atualizar suas projeções. A entidade calcula que as perdas sofridas pelo comércio na quarentena já ultrapassam R$ 200,7 bilhões. “O faturamento mensal do varejo ampliado varia entre R$ 190 e R$ 195 bilhões. Então, já perdemos o equivalente a um mês de vendas”, revelou o economista-chefe da CNC, Fabio Bentes.
Os números, porém, transcendem a situação específica do setor e revelam o tamanho do estrago que a pandemia provocou na economia brasileira. Em um webinar promovido pelo Instituto de Garantias Penais (IGP), ontem, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o novo coronavírus atingiu a economia brasileira como uma “bomba biológica”, e um “verdadeiro cisne negro”, sem precedentes na literatura econômica. “A calamidade pública produziu um caso particularmente agudo de emergência fiscal”, avaliou.
O ministro ainda disse que a crise terá muitos desdobramentos, alguns inclusive desconhecidos. Mas acredita que a pandemia também deixa um legado: a necessidade da criação de um novo pacto federativo no Brasil, em que os recursos sejam mais descentralizados entre estados e municípios.
Guedes, porém, disse estar confiante de que o Brasil vai se recuperar das crises econômica e de saúde ainda em 2020. “Acho que vamos atravessar as duas ondas. E acho que lá para setembro, outubro, novembro, nós já estamos em um novo país, com um ano novo muito bom pela frente. Eu acredito nisso e vamos lutar por isso”, afirmou.
Na avaliação da CNC, abril foi o fundo do poço para o comércio — assim como foi observado no caso da indústria e deve ser visto, hoje, quando o IBGE divulga os dados do setor de serviços. Porém, a entidade ressalta que as perdas não devem parar por aí. Fábio Bentes disse que as vendas devem continuar em ritmo lento até o fim do ano e não acredita em retomada ainda em 2020.
“A retomada das vendas não vai depender só da reabertura das lojas, mas de como vai estar o bolso do consumidor. E os dados do mercado de trabalho já estão muito ruins. Só em maio, mais de 1 milhão de pessoas perderam o emprego. Isso é terrível para o setor, porque debilita o principal fator de impulso do comércio, que é o consumo das famílias”, explicou.
Em abril, nem as vendas de bens essenciais como alimentos e remédios escaparam do impacto recessivo da pandemia. Segundo o IBGE, a venda de alimentos e bebidas, que havia disparado 14,2% em março com os brasileiros querendo encher a despensa de casa no início da quarentena, caiu 11,8%. A venda de artigos farmacêuticos seguiu o mesmo caminho e recuou 17%, após a alta de 1,4% de março. Já as outras oito atividades varejistas só aprofundaram as quedas observadas em março. Foi a terceira vez em 20 anos que todas as categorias do setor fecharam o mês no vermelho.
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