Economia

Emprego em alimentação e alojamento é o mais afetado por covid-19, diz Ipea

Por outro lado, administração pública e agricultura sofreram menos com a crise.

O setor produtivo manteve os empregos formais durante o período da pandemia. Apesar disso, os índices de desemprego porque não houve abertura de novas vagas. Na maior parte dos setores, a contração nas admissões teve maior relevância que o aumento dos desligamentos de acordo com o estudo “A evolução do emprego setorial em 2020: Quão heterogêneo foi o tombo entre os setores?”, do Instituto de pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O levantamento aponta que alimentação e alojamento, em termos relativos, foram os mais afetados – porque ajustaram o emprego nas duas margens -, seguidos pela construção. Por outro lado, administração pública e agricultura sofreram menos com a crise.

Esse resultado de estabilidade do emprego com carteira assinada foi possível, segundo a pesquisa, porque as medidas do governo, para barrar os efeitos negativos da pandemia,  especialmente a Medida Provisória (MP 936/2020, permite redução de jornada e salário e suspensão de contratos de trabalho), tiveram êxito, afirmou o pesquisador do Ipea Carlos Henrique Corseuil. Por isso, o estudo muda o olhar. Em tempos de choques negativos, no mercado de trabalho, as análises frequentemente priorizam os desligamentos. “Propomos uma inversão de valores. Há evidências para o Brasil de que a movimentação cíclica do emprego formal é ditada pelas contratações”.

Ele apontou que, enquanto as novas contratações, em abril e maio do ano passado, beneficiaram 1,374 milhão e 1,347 milhão de profissionais, respectivamente, no mesmo período em 2020, pelas dificuldades da crise sanitária e do isolamento social, as oportunidades de contratação despencaram para 618 mil pessoas, em abril, e 703 mil, em maio. Já os desligamentos ficaram praticamente inalterados. Em abril do ano passado, 1,245 milhão de trabalhadores foram dispensados. Em maio, 1,315 milhão perderam o emprego. Em 2020, abril registrou um número maior, de 1,521 milhão de demitidos. Mas a quantidade de dispensas baixou, em maio, para 1,035 milhão.

“Por isso, não se pode falar de onda de demissões de empregados com carteira assinada na pandemia. A flexibilização dos contratos funcionou”, disse Corseuil. O estudo ressalta que os segmentos de comércio, reparação de veículos e indústria da transformação, por exemplo, contrataram, menos 200 mil e 100 mil trabalhadores, em abril e maio, frente a 2019, e diz que “a boa notícia é que, de forma geral, as admissões registradas em maio deste ano foram superiores às de abril, com exceção dos setores de educação, saúde, arte e cultura”. Apesar do cenário positivo, ele acha que é cedo para fazer previsão da retomada da economia. “Temos que esperar o fim do isolamento e a chegada do novo normal. Aparentemente, qualquer possibilidade de crescimento, deverá acontecer a partir de 2021”, assinalou o pesquisador.

Mais otimista, o economista Rodolfo Peres Torelly, ex-diretor do Departamento de Emprego e Salário do extinto Ministério do Trabalho, acredita em uma reação a partir de setembro. “Pelo menos um alívio virá nesse final de terceiro trimestre. Vários países estão voltando a funcionar e no Brasil, com muitas realidades diferentes, vemos queda na contaminação. Portanto, creio que, em setembro, assistiremos uma alta nas contratações”, destacou Torelly. Ele também elogiou o programa emergencial de manutenção do emprego e da renda. “Em 30 anos no ministério, nunca vi um projeto funcionar em tão pouco tempo para um número tão grande de beneficiários”, disse Torelly.

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Na indústria, as admissões foram responsáveis por um aumento de 2,93% no emprego de março de 2019 e de 3,20% em março de 2020. A partir daí, o padrão muda drasticamente, passando de um crescimento de 3,18% em 2019 para apenas 1,33% em 2020, em abril, e de 2,87% para 1,45% em maio, aponta o Ipea. No setor de construção, a taxa de admissão, que não foi afetada em março, sofre uma queda em torno de 4 pontos percentuais entre abril de 2019 e 2020. Queda semelhante foi registrada em serviços de alojamento e alimentação, cujas admissões em março de 2020 cresceram 4,19%, já abaixo de 2019, e apenas 0,74% e 0,88% em abril e maio de 2020.

Quase todos os setores registram taxas de admissão em abril e maio de 2020 bastante inferiores, em geral menos da metade às de 2019. Isso apenas não ocorre, no período, para os setores de agricultura, serviços para empresas (informação, comunicação e atividades financeiras, imobiliárias, profissionais e administrativas) e administração pública. “Vale dizer que esses dois últimos setores podem mais facilmente seguir suas atividades respeitando as demandas de maior distanciamento social”, ressalta o estudo.

Os pesquisadores do Ipea avaliaram os efeitos das medidas de contenção da pandemia sobre o nível do emprego setorial, a partir do cruzamento de informações dos registros administrativos de admissões e desligamentos do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), além de pedidos do seguro-desemprego e informações sobre abertura de empresas no Estado de São Paulo. A análise também incorporou o segmento informal da economia a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua) do IBGE.

O estudo contempla setores como comércio, construção, serviços domésticos, administração pública, indústrias extrativas, educação, saúde, cultura, transporte, atividades imobiliárias, científicas e técnicas, agricultura e pecuária, além de alojamento e alimentação. Pelos dados da Pnad Contínua, no trimestre terminado em abril, a população ocupada no país diminuiu 3,1 milhões em comparação ao mesmo trimestre do ano passado.