Experimentar, fazer e aprender. O mundo mudou e a forma de aprendizagem, também. Romper as arquiteturas curriculares tradicionais e adequá-las às ferramentas contemporâneas e tecnológicas sem deixar de trabalhar as habilidades socioemocionais é a missão central da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A abordagem mão na massa se destaca entre as metodologias que visam a uma formação interdisciplinar, colaborativa, contextualizada no mundo e que permita o protagonismo do indivíduo.
A pedagogia deve fazer parte das perspectivas do aluno em idealizar, planejar, construir, testar e compartilhar. É o que explica o doutor em educação pela Universidade de São Paulo (USP) e consultor pedagógico do Senac Flávio Rodrigues Campos. ;São seis grandes elementos que sustentam o planejamento de práticas pedagógicas maker: fabricação digital, programação, engenharia, robótica, pesquisa e colaboração. Eles se encontram ancorados pelas áreas dos saber. Por último, as ferramentas e conceitos se relacionam com a abordagem, dando suporte teórico-prático à organização pedagógica;, explica.
Em escolas onde é valorizada a linguagem maker, o aprendiz deixa de ser coadjuvante e passa a ser mais ativo dentro e fora de sala de aula. ;Ao trabalhar abordagens relacionada à realidade daquela comunidade em que a criança e o adolescente estão inseridos, os projetos ajudam a desenvolver o sentimento de pertencimento, engajamento e amadurecimento;, completa Flávio.
No Centro Educacional Sigma de Águas Claras, alunos dos ensinos fundamental e médio têm a experiência de aprender fazendo em um ambiente de oficina chamado Sigmaker. As aulas, ofertadas no contraturno, possibilitaram o entendimento da aplicabilidade de diversos conceitos da física, matemática, biologia e geografia, por exemplo, o que acabou dando outro sentido à escola, afirma o professor de física e mediador das aulas, Daniel Peters. ;O crescimento deles é sensacional. Um aluno que não sabia pegar uma chave de fenda agora fazendo todo o projeto, desde a pesquisa, parte de eletrônica até programação. Ele se torna um pesquisador, capaz de se autocriticar, reconhecer problemas e propor soluções.;
Tudo isso, na visão de Daniel, contribui para o crescimento integral da criança e do jovem. ;Focar no processo é acompanhar a evolução, desde a aplicabilidade do conteúdo, ao saber lidar com pontos de vista diferentes, trabalhar em equipe, entender que ele é parte essencial do projeto. São habilidades essenciais para o mercado de trabalho e para a atuação em sociedade;, diz.
Bruno Souza, estudante do 7; ano do ensino fundamental, concorda. ;Quando mexo com as mãos, trabalho também a cabeça. Matérias da escola, eu consigo entender melhor, sem contar que me divirto mais, fico interessado e pesquiso.; Durante as experiências, ele já desenvolveu circuitos e programações. ;Uso o Arduíno, que é a placa que tem como programar. Um projeto bem legal que eu fiz foi o Pacman hidráulico. Usei seringas com água para fazer o jogo. Foi superinteressante e, como eu quero ser programador, já aprendo desde cedo;, conta Bruno.
Entre as habilidades desenvolvidas no Sigmaker estão o trabalho em equipe, capacidade de resolver conflitos, visão ambiental e social, além da emancipação. Para isso, é necessário colocar a mão na massa, inclusive aprendendo a usar ferramentas básicas, como chave de fenda, martelos, soldas.
Alice Vilela, estudante do 7; ano, de 11 anos, diz que já ouviu que o manuseio desses materiais não seria propício para meninas. Quanto a essa visão, ela deixa um recado: ;As pessoas deveriam se atualizar. Cada vez mais mulheres trabalham em áreas da tecnologia, fazendo novas coisas. Para isso, mexer nas ferramentas é muito importante e nós, mulheres, sabemos disso;, diz a estudante do ensino fundamental.
Mexer com os aparelhos de corte de madeira também não é nenhum mistério para Letícia Bonifácio, 12. ;Hoje eu mexo tranquilamente. Acho que estar em contato com todos esses equipamentos é importante para meu futuro. Até porque eu quero ser engenheira;, conta. Além das ferramentas, os alunos também têm acesso a recursos tecnológicos, como impressoras 3D, Arduino (plataforma de prototipagem eletrônica) e sistemas para programação.
;O contato permite que, na volta da rotina do conhecimento base, tudo fique mais visual, concreto. Os jovens ganham em assimilação das disciplinas, maturidade, visão tecnológica;, explica a professora de robótica maker Rosineide Cardoso, que encara o papel de professora como um desafio diário. ;Temos que nos atualizar constantemente para nosso papel de mediador desse processo de aprendizagem, permitindo que eles sejam sujeitos ativos, interessados e completos.;