Júnia Gama
postado em 02/03/2012 08:00
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O salário extra para deputados distritais, derrubado pela Câmara Legislativa na última terça-feira após reportagens do Correio que denunciaram a benesse concedida com dinheiro do contribuinte, é prática comum em ao menos outras sete assembleias legislativas pelo país. A regalia existe em Minas Gerais, Pará, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Amazonas, Bahia e Goiás. Em alguns casos, assim como ocorria com os distritais, os deputados não declaram os 14; e 15; salários no Imposto de Renda. A justificativa oficial é de que a verba tem caráter indenizatório e, por isso, não é tributável.
Os deputados distritais e estaduais alegam que não declaram os rendimentos extras porque o regimento que regulariza o pagamento é baseado em normas internas da Câmara dos Deputados. No entanto, a assessoria de imprensa da Câmara nega que essa prática seja usada na esfera federal. Segundo nota enviada pela assessoria ao Correio, os 513 parlamentares declaram normalmente a quantia recebida no Imposto de Renda.
No Senado, a situação é semelhante. Os 81 senadores são agraciados, a cada início e fim de ano, com os salários extras. Até o fechamento desta edição, a assessoria de imprensa do Senado não havia respondido se os subsídios repassados são tributados.

Nos estados, um dos casos que mais chama a atenção pela quantidade de benefícios é o da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Além do pagamento do 14; e 15; salários, os parlamentares mineiros recebem verba mensal indenizatória no valor de R$ 20 mil, mais auxílio-moradia e uma parcela correspondente ao valor do subsídio proporcional ao comparecimento do político nas sessões legislativas. Lá, a remuneração extra é tributada.
No Rio de Janeiro, os deputados recebem até dois salários além do 13;. A justificativa é que toda a remuneração deles é baseada, constitucionalmente, na prática da Câmara dos Deputados, descontados 25% do total.
Em Pernambuco, o chamado auxílio-paletó, no valor de R$ 20 mil, continua sendo pago e os deputados nunca declararam a remuneração no Imposto de Renda. A assessoria da Assembleia Legislativa de Pernambuco comunicou que o recurso é considerado indenizatório e, por isso, não caberia tributação. O Supremo Tribunal Federal (STF) deu ganho de causa aos deputados pernambucanos e o benefício continuou a ser pago.
Esse, no entanto, não é o entendimento de órgãos de fiscalização. Em 1997, a Receita Federal entendeu que a prática em questão configura crime de ;evasão fiscal; e notificou várias assembleias legislativas. O ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel contesta o fato de deputados não tributarem o pagamento extra. ;É preciso investigar para saber se existe uma dissimulação. Se eles receberam e incorporaram, é tributável. O fato é que pode existir uma evasão fiscal;, afirmou. A Receita Federal foi procurada na tarde de ontem, mas não se manifestou sobre o tema.
Liminar
Na Assembleia Legislativa de Goiás, por força de uma liminar, o pagamento extra foi suspenso no mês de fevereiro, mas ainda haverá julgamento e os deputados podem voltar a receber a ;caixinha;. Lá, existe um consenso sobre a ;constitucionalidade; do pagamento extra. Os deputados aguardam a decisão da Justiça, já que consideram não haver ;nada irregular;. A justificativa é a mesma usada pelas Casas que recebem o privilégio: se a Câmara dos Deputados faz, então os estados também podem.
Na Bahia, existe o pagamento apenas do 14;, enquanto no Amazonas os deputados chamam os salários extras de ;auxílio-paletó;. Na Casa amazonenense, existe um projeto de lei que visa acabar com o benefício mas, por enquanto, permanece em uma gaveta.
Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, critica o benefício e alerta para o fato de o modelo estar sendo reproduzido em diversos rincões do Brasil. ;Esse modelo de Brasília se reproduz na maior parte dos estados e dos municípios. É preciso manter uma mobilização para acabar com esse privilégio absurdo. Não tem sentido que esses recursos, fruto de impostos sejam pagos pelo contribuinte;, afirma.
Na esfera federal, somente três deputados dispensavam o recebimento dos salários extras: Antônio Reguffe (PDT-DF), Severino Ninho (PSB-CE) e Carlos Sampaio (PSDB-SP). Diante da repercussão do caso na Câmara Legislativa, a deputada Erika Kokay (PT/DF) decidiu ontem abrir mão do benefício. Ela também apresentou um requerimento pedindo a aprovação do projeto que extingue o pagamento da ajuda de custo aos deputados federais no início e no fim de cada sessão legislativa. ;Os parlamentares, seja em âmbito federal, estadual ou municipal, são servidores públicos, apenas com a peculiaridade de serem escolhidos pelo voto direto dos cidadãos. Nesse sentido, não devem receber tratamento diferenciado em relação ao conjunto dos demais servidores públicos;, defendeu.