Dezembro é mês de repensar o ano que passou e fazer promessas de mudanças para o que está por vir. Trocar de emprego, poupar dinheiro, viajar mais, alimentar-se melhor e se exercitar mais. Na lista de coisas que se pretende fazer de diferente, quando a rotina aperta, são essas duas últimas coisas, diretamente relacionadas à saúde, que acabam deixando de ser prioridade. Aí começam as escapadas da academia. O irônico é que a prática regular de exercícios físicos é um dos raros consensos científicos da atualidade ; não há estudo que desautorize os seus benefícios à saúde.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a inatividade física é o quarto principal fator de risco para a mortalidade ; estima-se que cause 3,2 milhões de óbitos por ano em todo o mundo. Um levantamento recentemente publicado na revista médica Lancet aponta que o sedentarismo está por trás de 13,2% das mortes no Brasil.
Dados do Sistema Único de Saúde (SUS) corroboram essa evidência. Por exemplo, sabe-se que as quedas são a principal causa de morte entre idosos no país. Na raiz do problema, está o descuido com o corpo: idosos precisam se exercitar muito mais que os jovens, pois, a partir dos 40 anos, há uma perda muscular e óssea que compromete o equilíbrio.
O outro extremo etário da população não está livre de problemas. Veja o caso das crianças brasilienses: o Distrito Federal lidera o ranking nacional de casos de obesidade infantil, apontam dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional, órgão ligado ao Ministério da Saúde. Tudo isso, segundo os especialistas, é resultado de sedentarismo combinado a má alimentação.
Por qualquer que seja o motivo, não faltam pesquisas que demonstram as inúmeras vantagens de se estar em forma. A Revista do Correio desta semana conta histórias de pessoas que ; quer por razões estéticas, físicas ou psicológicas ; incorporaram o exercício em suas vidas. Alguns, inclusive, fizeram disso sua profissão. Está esperando o que para começar?
Ciclismo como remédio
Há oito anos, Lília Ramos Ferreira, 50 anos, servidora pública federal, foi diagnosticada com fibromialgia. Causada sobretudo por estresse, a doença é tratada com antidepressivos e relaxantes musculares, e seus sintomas incluem dores musculares difusas, fadiga, distúrbios de sono, parestesias (sensação de queimação, coceira ou dormência na pele), edema (inchaço), distúrbios cognitivos e dor em pontos específicos sob pressão. No caso de Lília, bastava virar o rosto para o pescoço "travar", além de sentir dores por todo o corpo e um cansaço que o sono não reparava. Enquanto o marido, da mesma idade, estava sempre animado e até participava de um clube de motociclistas, ela sucumbia ao desânimo.
Em fevereiro deste ano, em sua festa de aniversário, apresentou uma dança com o marido e, no fim, sentiu-se exausta. "Foi aí que a ficha caiu. Eu não podia ficar apenas tomando remédios, tinha que, ao menos, tentar fazer algum tipo de exercício se quisesse chegar aos 51 anos com saúde", conta. Resolveu seguir o conselho de médicos e amigos. Começou a andar sozinha, mas não via graça. Depois, tentou correr no Parque da Cidade, mas se deparou com a falta de educação de algumas pessoas. "Um dia, eu caí, me machuquei e um homem passou por mim, fazendo cooper, me ignorou completamente. A partir de então, fiquei com medo", conta. Tentou ainda o pilates, mas simplesmente não conseguia chegar ao fim das aulas.
A reviravolta veio em duas rodas. Ela começou pedalando com o marido, aos domingos e a cada domingo queria ir mais longe. Foi quando teve a ideia de procurar grupos de ciclistas em Brasília e encontrou o Brasília Batom Bikers. Agora, ela, que há oito meses não conseguia subir nem dois degraus de escada sem cansar, todos os sábados no mínimo 45km e no mesmo ritmo das outras ciclistas. Tornou-se, inclusive, uma das coordenadoras do grupo. Ela é responsável pelos grupos de iniciantes formados a cada mês: "Eu nem acredito quando olho pra trás e vejo de 20 a 40 ciclistas me acompanhando".
Renascido no esporte
Atravessar o Atlântico até a Europa em um cruzeiro pode ser a viagem dos sonhos, mas para Leibnitz Alexandre Mendes Carneiro, 57, engenheiro civil, o passeio com a esposa e os amigos, em abril de 2009, tornou-se um pesadelo. A primeira parada, pela manhã, foi em Malága, na Espanha, cidade em que Picasso nasceu. À noite, eles voltariam ao navio a fim de seguirem viagem até Barcelona. Um simples e aparentemente inofensivo cadarço foi suficiente para derrubá-lo em um restaurante durante o almoço. Na queda, o pescoço foi para trás e o resultado foram dois pontos na boca e uma lesão na medula.
Leibnitz passou um mês em um hospital na Espanha, onde recebia tantas ligações de amigos que se deparou com uma conta de celular exorbitante quando chegou a Brasília para passar mais seis meses no Hospital Sarah Kubitschek. Depois de bastante fisioterapia e de uma cirurgia para aumentar o canal por onde a medula passa, os médicos chegaram à conclusão que ele ficaria mesmo tetraplégico. "Eu não mexia absolutamente nada, quase só via o mundo pela tevê e pela janela", recorda. Mas ele não se acomodou.
Uma acupunturista percebeu com suas agulhas que Leibnitz ainda tinha certa sensibilidade e transformou a possibilidade remota de ele voltar a andar em uma chance. Não se contentou apenas com as idas ao Sarah ; fazia fisioterapia e ginástica em casa também. Até que, em novembro daquele ano, ele voltou a andar. "Quando fui ao Sarah, a equipe nem acreditavam. Meu cuidador ficou com raiva disso e disse: ;Mostra pra eles, Alexandre;. E eu mostrei", orgulha-se. Agora, já é capaz de subir a escada que leva a seu quarto, no andar de cima.
Os médicos, então, disseram que, pelos próximos três anos, Leibnitz apresentaria melhoras significativas e que, depois disso, sua situação se estabilizaria. Subestimaram mais uma vez a garra do engenheiro. Este ano, ele começou também a se agachar e se levantar. Apoiando-se aqui ou ali, a tarefa deixou de ser impossível.
[SAIBAMAIS]
Para ele, o exercício físico ajudou tanto na recuperação dos movimentos quanto no aspecto emocional. "Os médicos não tinham certeza de nada. Não sabiam o quão séria era minha lesão. E eu ficava chateado porque, como engenheiro, sei quanto meus prédios aguentam. O médico retrucava que o prédio eu mesmo tinha feito, já o corpo, tinha sido Deus. Então, só fazendo muito exercício eu conheceria meu limite". Além disso, ele já tinha participado de uma seleção de vôlei, mesmo tendo estatura baixa para o esporte. "Se eu não fosse atleta antes, talvez me entregasse", admite. De fato, ele viu muita gente desistir e deu muito conselho. "Tinha um jovem cujos pais davam tudo pra ele: computador, videogame. Um dia, vieram me pedir conselho e eu disse que o menino estava simplesmente se conformando com aquilo, em vez de tentar mais", conta.
Leia a reportagem completa na edição n; 450 da Revista do Correio