Carnaval2013

Naná Vasconcelos fala ao Correio sobre homenagem no carnaval de Recife

Músico falou também sobre a a música pernambucana e a importância da percussão na vida dele

postado em 07/02/2013 08:25

Naná Vasconcelos comanda a multidão no carnaval de Recife: sons nascem da alma
Há 12 anos, o percussionista Naná Vasconcelos abre o carnaval de Recife com um show apoteótico: 10 nações de maracatu, com cerca de 500 batuqueiros, anunciam a chegada da folia na capital pernambucana. A apresentação chama a atenção pela técnica e pelo virtuosismo. Neste ano, a festa tem um gosto diferente. Com o fotógrafo Alcir Lacerda, Naná é o homenageado do carnaval de 2013. ;Chorei muito quando recebi a notícia;, conta o instrumentista.

Amanhã, às 19h, ele conduz as nações e os caboclos de lança da Rua da Moeda ao Marco Zero (ambos no Recife Antigo), onde une a música popular e erudita, e som brasileiro e português. No palco, Naná tem a companhia de convidados: o cantor Milton Nascimento e a cantora portuguesa Carminho. Democrático, o repertório vai do Hino dos Batutas de São José e Vassourinhas a Estrela é lua nova, do maestro Heitor Villa-Lobos.

Além da abertura, Naná e o grupo Batucafro tocam no domingo e na terça-feira de carnaval, no Pátio São Pedro e no Polo da Bomba do Hemetério, respectivamente. A exposição em Homenagem a Naná Vasconcelos ; com vídeos, fotos e depoimentos ; completa o tributo ao músico, que é um dos responsáveis pela sobrevivência do maracatu no Brasil. ;Quando começamos esse espetáculo, há 12 anos, não tinha mulher que tocava alfaia, hoje tem muitas. Vem gente de todo país, e de outros lugares do mundo participar da abertura tocando seu instrumento;, observa Naná.

O menino de Recife

Nascido em 1944, em Recife, Juvenal de Holanda Vasconcelos tornou-se Naná cedo. O apelido veio de garoto, assim como o talento para a música. Aos 12 anos, tocava bateria na banda do pai, que fazia shows em prostíbulos. As apresentações eram com a autorização do Juizado de Menores, mas só aconteceram até a morte do patricarca. Dali, o percussionista decidiu ganhar o Brasil e o mundo.

No fim da década de 1960, Naná se mudou para o Rio de Janeiro e trabalhou com Milton Nascimento, Gilberto Gil e Gal Costa. Anos depois, foi convidado pelo saxofonista argentino Gato Barbieri para juntar-se a seu grupo. Naná topou. Fez turnês nos Estados Unidos e na Europa, onde morou por um tempo. Depois de três décadas vivendo no exterior, o músico voltou para a casa. ;A espinha dorsal da cultura pernambucana e brasileira é a África, que é o que meu trabalho representa;, diz.

Mestres da rua


O caboclo de lança é personagem do maracatu rural ou baque solto e um dos principais símbolos do carnaval pernambucano. A roupa do caboclo é destaque na festa e tem uma série de significados. O chapéu de palha, por exemplo, é ornado com fitas coloridas, em que predomina a cor do guia (amarelo é Oxum; vermelho, Xangô). A gola, item principal da indumentária, é coberta por lantejoulas. No rosto, óculos escuros e um cravo branco preso nos lábios. Até hoje, não se sabe o porquê da flor. Do segredo do cravo, só é conhecido um detalhe: ele precisa ser confiado a uma mãe de santo.


CINCO PERGUNTAS//NANÁ VASCONCELOS


Como chegou ao senhor o convite para o ser o homenageado do carnaval de Recife?
O prefeito de Recife, Geraldo Júlio, me convidou porque queria saber como é essa abertura do carnaval que faço com os maracatus, há 12 anos. Fui explicar que sou eu quem organiza essas nações de maracatus, quando ele perguntou se eu aceitava ser o homenageado. Chorei muito. Fiquei muito feliz. Por ser homenageado vivo. Porque, normalmente, essas coisas acontecem depois da morte. Já recebi tributos fora do país várias vezes, mas em casa a emoção é diferente. Dizem que santo de casa não faz milagre. Mas nesse caso fez sim.

Como será essa noite tão especial?
A abertura do carnaval que faço com 10 nações de maracatu é única. As nações concorrem entre si e isso é bom porque assim elas procuram fazer o melhor. Mesmo depois de 12 anos, ainda é preciso organizar quem fica do lado de quem. O maracatu correu risco de desaparecer. Ele só era tocado pelas pessoas das comunidades. Hoje, tem o pessoal da classe média, universitários, mulheres e crianças tocando. É muito mais democrático.

Como Pernambuco consegue manter e superar essa diversidade cultural?
A cultura pernambucana é rica porque não sabe se vender, não tem visão de mercado. Então, ainda é popular. Aqui (Recife), você pode parar na esquina, se sentar e ver o carnaval passar. O mercado acabou com o carnaval do Rio de Janeiro. Não existe mais o carnaval de rua. No Rio, as pessoas estão tentando recriar esses blocos;Em Salvador (BA), só se tiver abadá. Circula mais dinheiro nos camarotes da Bahia do que em todo carnaval do Recife.

A impressão é de que o senhor toca com a alma;
Eu toco de corpo e alma. Há alguns anos, estive na UTI de um hospital. Quando saí de lá, fui com a seguinte energia: toda vez que toco, é como se fosse a última vez. Tocar o melhor de mim, no sentido de aperfeiçoar a qualidade do que faço. É difícil guiar um show de percussão que não tenha a ideia de que quem toca mais alto ou de quem toca mais rápido. Quero fazer música com percussão. Acredito que a percussão tem o poder da imagem. Pelo som, eu posso levar você para qualquer cenário do meu país.

O que o senhor pode adiantar sobre o novo álbum?

Meu novo CD se chama Quatro elementos e deve ser lançado depois do carnaval. Não levei convidados especiais para esse trabalho, porque esse disco é um conceito muito pessoal. Sou um Brasil que o Brasil não conhece. Não faço parte do que está acontecendo. A espinha dorsal da cultura pernambucana e brasileira é a África, que é o quê meu trabalho representa.

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