postado em 11/02/2013 18:04
Torres Vedras (Portugal) ; Os portugueses estão aproveitando o carnaval para criticar o governo e a condução da política econômica do país. Em Torres Vedras ; cidade que tem o principal carnaval lusitano, distante cerca de 50 quilômetros de Lisboa - pessoas fantasiadas, carros alegóricos e esculturas expressavam mensagens contra os principais dirigentes e a recessão que atinge Portugal (hoje com mais de 16% de taxa de desemprego).
Além dos políticos, são comuns personagens das novelas e programas de TV (havia passistas vestidas como a boneca Emília, do Sítio do Picapau Amarelo). Além disso, a música brasileira (samba, axé e até sertanejo) era hegemônica nos alto-falantes do centro da cidade e nas bandas dos corsos que desfilavam, algumas até com gaita de fole.
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Entre as mais tocadas, estão sucessos brasileiros antigos e novos, como Mamãe Eu Quero, Ilariê e Ai Se Eu Te Pego, além de músicas baianas cantadas por Daniela Mercury, Margareth Menezes e Ivete Sangalo.
;A lógica é tocar qualquer música desde que seja quente, dançável e latina. Dentre as músicas com essas características, a que aparece mais é a brasileira;, disse António Esteveira, administrador da Promotores, a empresa municipal responsável pela organização do carnaval.
Poucos políticos foram poupados: um grande boneco de plástico mostra o presidente Aníbal Cavaco Silva como pedinte de rua; um passista desfila com carrinho de lixo ;não reciclável; com imagens dos ministros das Finanças (Vitor Gaspar) e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas).
Outro carro alegórico transita com bonecos do ex-primeiro-ministro José Sócrates (hoje na oposição) e do atual ministro dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas, portando diplomas nas mãos após saírem de uma ;maravilhosa máquina de reciclagem; - alusão à supostas fraudes nos cursos que fizeram na universidade.
Até uma chanceler Angela Merkel em trajes sumários circulou com pose sádica montada em um dragão ; a Alemanha é vista pelos portugueses como a principal avalista na União Europeia da política de ajustamento econômico que cortou gastos com a seguridade social e a saúde (redução de pensões e do seguro-desemprego), e elevou o pagamento dos usuários do sistema nacional de saúde pública pelos serviços prestados.
;O tom crítico é constante. Nós nunca deixamos de fazer essa crítica. Todos os pormenores que acontecem na vida social e política do país são passíveis de serem criticados no carnaval;, explica António Esteveira.
Segundo ele, o carnaval da cidade nasceu com o objetivo de fazer sátira política. ;O carnaval se implanta no início da República [1910] por causa de uma elite torrense que tinha gosto em ridicularizar a Casa Real;, salienta Esteveira.
Além da forte crítica aos políticos, chama a atenção no carnaval de Torres Vedras a quantidade de matrafonas (homens vestidos de mulheres) circulando pelas ruas. Conforme Esteveira, a atitude tem raiz histórica: como a presença das mulheres não era tolerada na transgressão típica do carnaval, para se formar casais na festa, era necessário juntar dois homens. ;Esses iam aos baús das tias das avós, das primas, para ver as roupas já usadas, rotas e tal e vestiam-se com aquilo;, explicou.
Neste ano, um grupo de matrafonas desfilava em frente ao carro Bataclã do Oeste - referência ao bordel do romance Gabriela Cravo e Canela, de Jorge Amado, que recentemente foi retransmitida por uma emissora de TV portuguesa.
São esperadas 350 mil pessoas no carnaval de Torres Vedras até terça-feira. Por causa da crise, a cidade faz o carnaval com o orçamento mais baixo nos últimos quatro anos (cerca de R$ 950 mil).
Além de Torres Vedras, há carnaval nas cidades de Loulé (que reivindica ser o mais antigo), em Loures, Sines, Mealhada, Figueira e na Ilha da Madeira (alguns com desfile de escola de samba). Em Lisboa, na sexta-feira da semana passada (8), alguns ativistas fantasiados para o carnaval foram à porta do escritório do Fundo Monetário Internacional reclamar dos cortes orçamentários das políticas sociais.
De acordo com o Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira, o carnaval do Brasil tem entre as suas principais origens o entrudo português, brincado na Ilha da Madeira, que precedia a Quaresma.