2019

Governança é a palavra de ordem para garantia de um serviço público eficiente

O planejamento de ações, custos e estratégias em órgãos públicos é essencial para a boa gestão e o compromisso ético

Mariana Machado
postado em 08/08/2019 11:40

Rosalvo Ermes, do Banco Central: secretaria específica para cuidar da áreaGarantir o bom funcionamento de uma empresa ou organização depende de gestão eficaz, assim como de transparência e de estratégia. Em um órgão público, clareza e planejamento são ainda mais cobrados, uma vez que as ações têm impacto direto na vida da população. É por meio das boas práticas de governança pública que essas instituições mostram integridade.

No Brasil, a fiscalização é feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU) desde 2007. O auditor federal de controle externo da Corte Claudio Cruz explica que, na primeira checagem, 57% dos 255 órgãos federais consultados informaram ter planejamento. A partir disso, a Corte enviou recomendação ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para publicar uma resolução determinando que planejar fosse normativo. ;Hoje, 100% do Judiciário tem planejamento estratégico institucional;, compara.

À época, o termo governança pública ainda não estava em voga, mas os princípios eram os mesmos. O auditor destaca o termo como algo multifacetado e complexo, que pode ser dividido em quatro perspectivas: sociedade e Estado; entes federativos, esferas de poder e políticas públicas; órgãos e entidades; e atividades intraorganizacionais (veja quadro). ;Governança central, ou de centro de governo, tem a ver com a capacidade da liderança central do país de produzir um bom direcionamento.;

Cruz ressalta como boas práticas três mecanismos: liderança, estratégia e controle (leia Boas práticas). ;Os trabalhos em cima do governo são de auditoria. Uma outra vertente é a das políticas públicas, que têm a ver com a capacidade dos governos de converter os desejos de uma população em realidade;, define. Apesar da fiscalização, ele lembra que a contribuição dos governos federal, municipal, estadual e de famílias, escolas e mídia também são essenciais para a boa governança.

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Por meio de questionários e verificações in loco, o TCU realiza a fiscalização das instituições federais. Conforme determina a Lei Orgânica n; 8.443/1992, o tribunal pode averiguar os planos contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial das unidades dos poderes da União. O trabalho é feito por ciclos. A última fiscalização ocorreu em 2018 e a próxima será em 2020.

O auditor federal explica que, com a lei, os dirigentes respondem de modo oficial, portanto, não podem mentir. ;Pedimos uma autodeclaração pela qual ele (o gestor) se vincula. Se não for verdadeiro, responde perante o tribunal. É uma prática de autocontrole internacionalmente aceita.; Após os questionários, é feita, por amostragem, a visita em campo e, se necessárias, auditorias podem ser demandadas para verificar erros e riscos.

Em 2014, após uma parceria com os tribunais de contas municipais, ocorreu um grande levantamento sobre estados e cidades brasileiras. ;Os resultados foram alarmantes. Estados estão em níveis piores que os entes federais e os municípios, piores ainda. Temos demandas enormes de governança e queremos que os gestores olhem para as vulnerabilidades e percebam onde podem melhorar.;

O planejamento de ações, custos e estratégias em órgãos públicos é essencial para a boa gestão e o compromisso ético

Para saber mais

Interesse social garantido

Instituída a partir do Decreto n; 9.203/2017, a governança pública compreende o conjunto de mecanismos de liderança, estratégia e controle postos em prática para avaliar, direcionar e monitorar a gestão, com vistas à condução de políticas públicas e à prestação de serviços de interesse da sociedade. Isto é, visa garantir o pleno atendimento ao cidadão, melhorando a vida das pessoas. Tem como princípios: capacidade de resposta, integridade, confiabilidade, melhoria regulatória, prestação de contas e responsabilidade e transparência. A condução das políticas de governança é orientada pelo Comitê Interministerial de Governança (CIG), composto pelos ministros da Economia, da Controladoria Geral da União (CGU) e da Casa Civil.

Como melhorar

Tribunal de Contas da União é responsável pela fiscalização das instituições federais, com verificações in locoTodos os resultados das fiscalizações de governança do TCU estão disponíveis no site do tribunal. O último relatório detectou as principais falhas em políticas públicas: falta de transparência, qualidade e descontinuidade de serviços prestados, ausência de análises de eficiência, efetividade e custo-benefício e inoperância de instâncias responsáveis por políticas públicas.

As análises obtidas a partir de cada questionário também estão publicadas no portal e mostram como cada um dos avaliados se saiu em variados aspectos, como gestão de pessoas, de contratos, capacidade de liderança, promoção de transparência, responsabilidade e prestação de contas, além do monitoramento de riscos. Entre os mais bem avaliados, está o Banco Central (BC).

Rosalvo Ermes Streit, secretário executivo-adjunto e chefe da Secretaria de Governança do BC, explica que a instituição sempre buscou fazer o planejamento, e que, em 2003, as metodologias passaram a ser estudadas. Há quatro meses, secretaria específica sobre o assunto foi criada, e Streit garante que todos participam de maneira direta ou indireta.

Segundo ele, o banco busca manter processos decisórios claros com o objetivo de que os atores envolvidos, com perspectivas diferentes, possam contribuir para que as decisões sejam tomadas de maneira acertada. ;Em 2011, publicamos a política de gestão de riscos tanto financeiros quanto de outros tipos;, exemplifica. ;Para que as unidades do banco possam sugerir projetos e mostrar como executá-los, existe um comitê que avalia e leva para a diretoria as percepções a respeito, garantindo alinhamento e uso de recursos de forma adequada;, observa o secretário executivo.

Na visão dele, o desafio está em difundir as boas práticas. ;Sempre que ocorrem riscos, a governança evolui. Os códigos mudam para solucionar problemas detectados em situações reais;, relata. ;A crise financeira da Ásia nos anos 1990, por exemplo, não teve como causa uma má governança, mas o fato de ela não estar muito boa. Os impactos teriam sido menores se os mecanismos estivessem mais assentados.;

Aprendizagem

Nos últimos anos, a temática passou a assumir maior dimensão dentro das agendas de governo, como explica o professor Mauro Santos Silva, coordenador do MBA em Planejamento, Financiamento e Governança Pública da Fundação Getulio Vargas (FGV). ;Antes, tinha um papel discreto. Nesse processo de importância maior, observamos uma curva de aprendizagem. Há áreas mais avançadas e outras em um nível mais básico, elementar.;

Ele alerta para a necessidade de mais cobrança em relação à transparência das ações. ;Um governo deve deixar muito claro para a sociedade não só o que faz, mas quem é o responsável por ação;, destaca. ;Na área de saúde, por exemplo, a gente sabe quem é o ministro, mas isso não basta. O ministério tem um rol de políticas e é preciso saber quem é o responsável por elas, individualmente.; Com ações assim, é possível identificar responsáveis, cobrar e demandar informações.

O professor acrescenta a importância da prestação de contas. ;Significa mostrar o que foi feito, deixando claro onde os recursos foram usados e os resultados efetivamente alcançados.;

O planejamento de ações, custos e estratégias em órgãos públicos é essencial para a boa gestão e o compromisso ético

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