2019

Excelência na saúde depende, em grande parte, do trabalho dos gestores

Na área da saúde, é fundamental que profissionais em cargo de gestão saibam priorizar e delegar ações

Augusto Fernandes
postado em 08/08/2019 12:13

A presença de um gestor que saiba priorizar e delegar ações é essencialAperfeiçoar a gestão da saúde é um ponto fundamental para mudar a percepção dos brasileiros quanto à eficiência dos serviços prestados tanto por instituições públicas quanto privadas ao redor do país. De acordo com informações do Conselho Federal de Medicina (CFM), estima-se que apenas 10% da população avalie como bom o atendimento oferecido nos hospitais e em outras unidades de saúde do Brasil. Na lista de reclamações dos usuários, a má administração dos gestores aparece como um dos principais entraves para que o setor receba avaliação positiva.

;Na área da saúde, existe uma diferença essencial em relação a outros segmentos, que é o fato de tratarmos com vidas. Quando se enxuga algo fundamental para a manutenção da segurança e da qualidade (do serviço prestado ao) paciente, o risco é grande. Tomar uma decisão errada pode comprometer vidas, que não são substituíveis. Por isso, é importante a presença de um gestor que saiba priorizar e delegar ações para montar um plano que esteja adequado às necessidades da sua instituição;, destaca a professora Adriana André, coordenadora do MBA em gestão de Clínicas, hospitais e indústrias da saúde da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Mesmo com o aumento do percentual do Produto Interno Bruto (PIB) destinado a dispêndios com saúde ; de 3,8%, em 2015, para 8%, no ano passado, segundo levantamento feito pelo Banco Mundial ;, parece estar longe a solução de problemas como falta de insumos e médicos e orçamento limitado, no caso do setor público; e cobertura insuficiente do convênio e mensalidades altas dos planos de saúde, no caso do privado.

Diante dessa realidade, uma alternativa para pessoas à frente das instituições que prestam serviços hospitalares à população é otimizar recursos, sejam financeiros, sejam humanos. ;Otimizar significa analisar aquilo que você tem e investir. A partir disso, você pode entender quais são as suas principais demandas e distribuir os recursos de forma que os atendimentos aconteçam da melhor forma;, analisa Adriana. ;Um bom gestor sempre deve pensar estrategicamente e planejar reuniões eficientes, com metas a serem atingidas. Assim, ele terá um bom embasamento para apresentar propostas de solução aos problemas;, acrescenta Adriana.


Fora do papel

O conselho da professora é seguido à risca em algumas unidades de saúde do Distrito Federal. CEO do Hospital Santa Marta, Luci Emídio conta que a gestão por lá é feita justamente com base em um planejamento estratégico que, desde 2011, sofreu quatro revisões. ;O planejamento é focado em dois pilares, tidos como itens básicos da nossa gestão: a qualidade e a segurança do paciente. Além de mim, existem diretores e sócios do conselho de administração que seguem severamente os protocolos institucionais, tudo para entregar a melhor assistência à sociedade;, detalha.

Luci Emídio destaca a importância do planejamento estratégicoO hospital consegue atender a uma demanda de aproximadamente 24 mil pessoas por mês. Para não perder o controle da situação, Luci acompanha diariamente os indicadores de produtividade da unidade de saúde. Além disso, o alto escalão do centro hospitalar se reúne a cada mês, a fim de analisar o que foi cumprido e o que ficou no meio do caminho.

;É preciso tornar o hospital legal em todos os ambientes, tanto que temos um manual de conduta e ética muito rigoroso. Fazemos um fórum mensal de análise crítica, em que entra a liderança e a diretoria do hospital. Nós mensuramos os resultados obtidos durante os últimos 30 dias e trabalhamos em cima disso;, conta a CEO.

A autoavaliação permite ao hospital manter os cerca de 2 mil funcionários cientes da principal meta da organização: minimizar os efeitos do acompanhamento médico aos pacientes. ;Com uma equipe equilibrada e trabalhando em um bom clima organizacional, conseguimos prestar uma assistência mais eficaz. Quanto mais o colaborador se identifica com os valores da empresa, mais fácil é entregar os resultados que se esperam dele;, frisa Luci.

Cenário adverso

Pesquisas mostram a importância de uma boa gestão na saúde

  • Em 2018, uma pesquisa do Datafolha, encomendada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), revelou que 55% dos brasileiros avaliaram a saúde no país como ruim ou péssima, enquanto 34% a classificaram como regular;
  • Das quase 2,1 mil pessoas que participaram da pesquisa, a insatisfação foi compartilhada por94% dos pacientes que têm plano de saúde e por 87% dos que dependem do Sistema Único de Saúde (SUS);
  • Segundo 51% dos entrevistados, o tempo de espera para atendimento, a escassez de recursos e a má gestão são os aspectos que mais comprometem a qualidade do serviço;
  • O estudo ainda revelou que 83% das pessoas ouvidas acreditam que os recursos públicos não são bem administrados; 73% dizem que o atendimento não é igual para todos; e 62% creemque o SUS não tem gestores eficientes e bem preparados;
  • Outro levantamento, feito também no ano passado, pela Comissão de Saúde Global de Alta Qualidade, do jornal científico The Lancet, estima que 153 mil brasileiros percam a vida anualmente por causa de atendimento médico de má qualidade; Além disso, 51 mil morrem por falta de acesso a atendimento de saúde.

Fontes: CFM e Comissão de Saúde Global de Alta Qualidade

Boa formação é indispensável

Renilson Rehem valoriza a formação uma boa equipe para dividir tarefasPara assumir a gerência de uma unidade de saúde, é fundamental que o profissional indicado para o cargo tenha experiência nos processos de administração de uma instituição hospitalar. Deslocar um cirurgião de extrema competência para o posto, por exemplo, pode ser uma decisão equivocada, visto que ele não teve a formação adequada para ser gestor.

;O ideal seria que as pessoas assumissem as posições de organização por mérito e não por uma simples indicação política, como acontece no setor público. Certamente, essa pessoa vai tentar dar o seu melhor, mas uma coisa é tentar e, outra, é realmente ter preparo e conhecimento de como fazer mais com menos;, analisa a professora do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília (UnB) Carla Marques.

Segundo ela, um gestor capacitado pode cuidar dos processos de trabalho dentro da unidade de saúde com mais habilidade. Dessa forma, é possível dar resultados mais efetivos aos pacientes.

Uma das principais consequências da boa gestão pode ser a elevação dos indicadores de qualidade do serviço da organização de saúde, que pode encontrar as estratégias para solucionar problemas que vão desde o tempo de espera para os procedimentos médicos até a diminuição das condições sensíveis à atenção primária.

Tomada de decisão

Há quase oito anos como superintendente executivo do Hospital da Criança de Brasília, Renilson Rehem sabe do peso que carrega nas costas por administrar uma unidade de saúde referência em quase todas as especialidades pediátricas e que realizou mais de 3,4 milhões de atendimentos desde 2011. A especialização em planejamento de recursos humanos e o mestrado em administração de saúde lhe permitem tomar as decisões mais corretas.

;Fazer gestão na saúde, e de um hospital, não é coisa simples, por isso, a necessidade de formação. Administrar um hospital público, em especial, requer não só conhecimento de administração hospitalar, mas também de administração pública;, diz.

Renilson lembra que o conhecimento e a experiência ajudam a pensar soluções. Mesmo assim, todo gestor precisa de uma boa equipe para dividir responsabilidades. ;Ninguém faz nada sozinho. Quem pensa que a ordem hierárquica é a melhor estratégia para lidar com pessoas está totalmente equivocado. Além das habilidades técnicas, precisamos que os funcionários tenham boa vontade para lidar com a saúde. Ter uma causa para abraçar dentro do trabalho é um privilégio;, ressalta.

A partir disso, o gestor consegue manter transparência com todos os setores do hospital para definir as prioridades da instituição, visto que os recursos, muitas vezes, são insuficientes para lidar com uma quantidade de demandas ilimitada. Como consequência, a administração do hospital cria um bom clima organizacional entre os funcionários, aspecto fundamental para a prestação de um serviço tão essencial como a saúde, conta Renilson.

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