postado em 23/08/2010 08:15
Moacir Bueno é paulista, já foi candidato a deputado estadual em Santa Catarina, mas nestas eleições vai tentar mandato de senador da República pelo Distrito Federal, onde mora há 25 anos. Talvez por ter criado vínculos em outras regiões do país é que o candidato ao cargo majoritário pelo PV encampe um discurso voltado para temas nacionais.O concorrente tem como propostas de campanha as reformas política e tributária como parte da solução para resolver problemas que, segundo acredita, estão ligados a uma sociedade materialista. ;As pessoas precisam de um novo modo de vida, não apenas em cima do consumo. Hoje, a realização está em comprar bens e objetos. Isso é felicidade?;, questiona o candidato.
Para Moacir, bem-estar é um conceito vinculado às bandeiras do Partido Verde. ;Queremos que as pessoas aumentem o nível de consciência e passem a pensar nas futuras gerações. O planeta está em fase terminal. Só que a sociedade ainda não tem consciência disso;, acredita.
Um caminho apontado pelo político, que já testou candidatura para deputado distrital e não obteve sucesso, é um incentivo do governo aos chamados produtos limpos, que, segundo explica na entrevista concedida ao Correio, são aqueles orgânicos, sem agrotóxicos ou que não se valem de insumos químicos nem de mão de obra escrava, por exemplo. ;Esses devem ter tributação menor, o que pode ajudar a mudar os hábitos das pessoas;, defende o candidato-biólogo, que se especializou em gestão de biodiversidade e hoje trabalha no Instituto Chico Mendes. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
Por uma vida menos focada no material
Qual a intenção do senhor com o Distrito Federal, quando resolveu se candidatar ao Senado?
O papel do senador é pensar, em primeiro lugar, no país e também no estado que ele representa. Venho trabalhando há alguns anos numa série de propostas cujo eixo principal é construir um estado e um país com sustentabilidade social, em que o conjunto da sociedade tenha suas necessidades fundamentais atendidas e que tenhamos sustentabilidade econômica. Devemos lembrar que a economia desempenha um papel importante, desde que seja entendida como um meio e não um fim para uma sociedade mais justa.
Críticos alegam que a bandeira do ecologicamente correto defendida pelo Partido Verde emperra o desenvolvimento. Como conciliar evolução econômica respeitando a sustentabilidade ambiental?
A Marina Silva explica isso bem, dizendo que a oposição entre desenvolvimento e meio ambiente é falsa. São questões complementares. O PV tem um viés socioambiental, não se trata apenas de uma questão ambiental. Até porque ser verde implica estar preocupado com uma questão social, econômica e ambiental. O que a gente quer é um modelo de sociedade durável, que leve em conta as futuras gerações.
Numa sociedade como a do DF, com pendências nas áreas da saúde, transporte, segurança, emprego e educação, a causa do PV não é monotemática?
A nossa causa é socioambiental. Então, se os princípios fundamentais da sociedade são atendidos com uma economia dinâmica que dê garantias de um ambiente mais conservado, isso será bom para todo o mundo. O que não é bom é um modelo do desenvolvimento pelo desenvolvimento, da economia pela economia, do lucro pelo lucro.
O PV não tem entre seus políticos nenhum representante com mandato no DF. As pessoas não compreendem a causa verde ou não estão preocupadas com a sustentabilidade ambiental?
O PV é uma das maiores forças políticas que existem hoje. Reúne a maior confederação de partidos do mundo, com 143 legendas. Estamos preocupados em trazer a consciência socioambiental para as pessoas, queremos fazer um novo modelo de política, sem comprar eleitores nem mandato. Queremos que as pessoas entendam o significado de um formato de sociedade cuja causa socioambiental esteja no centro. É um processo de longo prazo e temos de ser persistentes. Hoje, o PV tem 16 deputados federais, já não é um partido nanico. Estamos crescendo e muito, temos até senador da República. Nestas eleições, somos um dos poucos partidos com candidato à Presidência da República.
O fato de ter Marina Silva como puxadora de votos pode ajudar o partido a fazer, pelo menos, um deputado distrital em outubro?
Não temos dúvida disso. Quem anda em Brasília encontra muita gente falando que vai votar nela, não só pelo potencial eleitoral que a Marina tem, mas pelo que ela está propondo. Os outros candidatos pararam no século 20. A Marina é a candidata do século 21. No caso do DF, o governador na dianteira está impugnado. Agnelo (Queiroz), até poucos dias atrás, não tinha a candidatura deferida. Os senadores das coligações estão com problemas. A Abadia, por exemplo, ainda enfrenta contestação do Ministério Público. Isso abre perspectivas para o nosso projeto de renovação no Congresso. O Ficha Limpa criou impedimentos para vários políticos, situação que a gente não sabe bem como vai terminar. Por isso, temos possibilidades reais.
Dentro de um contexto do que pode ser considerado ecologicamente correto, o que falta para o DF andar em conformidade com os preceitos defendidos pelo PV?
Defendemos que as pessoas estejam comprometidas com a construção de uma sociedade que não viva apenas com objetivos imediatistas. Queremos que as pessoas aumentem o nível de consciência e pensem nas futuras gerações. Nos últimos 50 anos, destruímos o país, o planeta está em fase terminal. Só que a sociedade ainda não tem consciência disso. Só governo, técnicos, políticos sabem. As pessoas precisam de um novo modo de vida, não apenas em cima do consumo. Hoje, a realização da sociedade está em comprar bens e objetos. Isso é felicidade? O conceito que temos é diferente. As pessoas devem ter acesso à saúde, à boa educação. É necessária uma mudança radical no comportamento.
O que um senador da República pode fazer para interferir nos costumes e hábitos de consumo das pessoas?
Uma série de reformas, primeiro a política. Defendo uma reforma radical no sentido de que a vida de um parlamentar não pode ser profissional. Cada cidadão deve se eleger só uma vez e depois voltar para a atividade civil. Nos anos em que a pessoa tiver mandato, poderá propor e fazer tudo o que estiver ao seu alcance para melhorar a sociedade. Depois, retornará à sua atividade. No Brasil, há apenas os políticos profissionais. Um dentista, por exemplo, deixa sua área de atuação para se tornar deputado e abandona o consultório. Se ficar no mandato por quatro anos, poderá voltar e fazer o que fazia. Se permanecer oito, 10 ou até 12 anos, vira político profissional, cheio de vícios e compromissos firmados com forças, setores e empresas para se eleger. Isso é o que leva ao caos político e a um Congresso desacreditado.
Que outros projetos podem repercutir na rotina das pessoas para que se tornem menos materialistas e mais socioambientais?
Temos de fazer uma reforma tributária dando prioridade aos produtos limpos e sustentáveis produzidos segundo uma cadeia econômico-ecológica, que não utiliza mão de obra escrava nem agrotóxicos. Esses produtos merecem ter tributação menor ; porque se um produto limpo, orgânico e bom para a saúde tiver o mesmo preço de um alimento transgênico, cheio de agrotóxico e insumos químicos, então não teremos mudança na sociedade. A energia é outro ponto central. O atual governo sujou a nossa matriz energética através da queima do óleo. O subproduto do petróleo pode até ser utilizado para fins nobres, com a produção de insumos utilizados pela sociedade. A geração de energia, no entanto, tem que mudar de matriz.
O DF tem um deficit habitacional de, pelo menos, 59 mil moradias. O surgimento de invasões é um dos resultados da falta de uma política eficiente para lidar com essa demanda. Qual a proposta do PV para resolver esse problema?
Temos um programa de moradia popular de baixo custo e que pode se tornar mais confortável do que o proposto pelo governo federal. É possível construir uma casa popular com produtos até 95% feitos de materiais recicláveis, com o custo muito mais baixo do que o programa Minha casa, minha vida. É o que chamamos de casa ecológica, produzida com tecnologia limpa que preserva áreas verdes e reduz o impacto ambiental. Além disso, essa casa do Minha casa, minha vida é um ovo. O nosso projeto não é assim. Pretendemos construir casas com água aquecida. Imaginamos até colocar banda larga para todos terem acesso à internet.
O senhor calculou o custo no orçamento de um projeto como esse?
É uns 40% mais barato que o Minha casa, minha vida.
O que significa em valores?
Uma economia de R$ 32 mil em casas atualmente construídas num patamar de R$ 80 mil.