Jornal Correio Braziliense

Eleicoes2010

Antigos rivais esquecem o passado e se aproximam de adversários no poder

Na maioria das vezes, passam a ocupar posições de destaque e ganham cargos importantes para compor a base do governo

Joaquim Roriz já foi fundador do PT de Goiás, na década de 1980. Renan Calheiros, em 1989, braço direito de Fernando Collor de Mello, arquitetava uma forma de derrotar Luiz Inácio Lula da Silva na primeira eleição direta pós-ditadura militar. José Sarney, então presidente da República, chegou a comparecer ao horário eleitoral gratuito para se defender dos ataques que recebeu de Collor, a quem chamava nos bastidores de ;desequilibrado;, e do próprio Lula. E, quem tiver curiosidade de buscar mais longe no tempo, descobrirá que, quando Collor foi prefeito de Maceió, Renan, então um deputado estadual do MDB de esquerda, aguerrido e ligado aos comunistas, chamava-o de ;príncipe herdeiro da corrupção;.

Quem vê esses personagens nesta campanha eleitoral de 2010 terá a certeza de que o velho ditado ;o tempo supera tudo; é regra de ouro na política. Os eleitores, às vezes, ficam confusos ao ver o mesmo Lula que chamou Fernando Collor de Mello de ;caçador de maracujás; agradecer o ex-adversário que chegou a expor sua vida íntima(1) no horário eleitoral gratuito de 1989. Hoje, ;é Lula apoiando Collor, e Collor apoiando Dilma;, repetem os carros de som pelas ruas do interior e da capital de Alagoas, onde o ex-presidente desfila feliz desde que José Serra o exibiu ao lado de Lula no horário eleitoral gratuito. Os próprios colloridos dizem em conversas reservadas que estavam com dificuldades em convencer o eleitor alagoano de que Lula e Collor estão juntos. Serra deu um empurrãozinho.

Assim como Lula superou bem a rasteira do adversário que o chamava de ;cambalacheiro; por fazer alianças com desafetos, o senador José Sarney (PMDB-AP) não guardou mágoas, por ter sido desdenhado. Quando Sarney era presidente, Lula chegou a dizer que não fazia nenhuma questão de receber voto dele, apesar da ligação eleitoral das siglas. ;O presidente Sarney está tão em cima do muro que provavelmente erre o voto. Pode ficar certo, presidente Sarney, que não terá nenhum militante do PT querendo ver seu voto;, afirmou o petista durante debate em 1989.

A nossa breve história democrática mostra que a política é, antes de tudo, a arte da sobrevivência. E o senador Romero Jucá (PMDB-RR) que o diga. Homem forte do governo Lula no Congresso, Jucá tem talento mesmo é para ser o homem forte de qualquer governo. Cumpre seu papel de forma eficiente e silenciosa, sem se importar com colorações partidárias. Jucá, que hoje compra todas as brigas necessárias para defender o governo do PT, protagonizou cenas de bate-boca dia sim, dia também com o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), inclusive em auxíio ao ex-senador e ex-governador José Roberto Arruda, nos tempos de Fernando Henrique Cardoso.

Em um dos embates, em plena campanha de 2002, que culminou na primeira vitória de Lula, Jucá ironizou o favoritismo do petista que à época disputou com José Serra (PSDB) a Presidência. ;Ora, por mais que o PT considere Lula importante, está valorizando-o demais ao achar que o mundo se juntou para evitar que ele seja o presidente do Brasil. Podemos dizer que o Lula talvez seja o favorito, como eram a Argentina e a França na Copa do Mundo, dois times que voltaram para casa na primeira rodada;, discursou Jucá, quando era líder do governo Fernando Henrique Cardoso no Senado.

Mas o lado tucano de Jucá era moderado em comparação ao Geddel Vieira Lima (PMDB) de antigamente. O peemedebista e ex-ministro de Lula, que hoje disputa cada segundo do presidente para cacifar sua campanha ao governo da Bahia, já pregou um PMDB de oposição. O discurso vermelho do parlamentar destoava do jeito de seu partido de fazer política. ;Eu gostaria que o PMDB atuasse agora como fez o PT na oposição, não participando do governo. O PT está tentando transformar vários partidos de aluguel, alocando deputados nessas legendas para ter mais facilidade nas votações;, atacou, em 2002.

Ímã
O cientista político Marcos Coimbra, que acompanha os movimentos de todos esses persongens, avisa que acabaram os anti-Lula. Nesta campanha, não existe um só candidato que critique o atual presidente. ;Para começar, a política brasileira tem uma tendência inexorável para o centro, para o poder. A capacidade de atração do governo é imensa. Não foi difícil para Fernando Henrique Cardoso governar porque quase não havia vozes contra ele;, analisa Coimbra, lembrando que, no governo FHC, apenas o PT lhe fazia uma oposição aguerrida. ;Nos dias de hoje, vemos que há uma incapacidade de reação diante dos altos índices de popularidade do Lula;, constata Coimbra, citando esse aspecto como a chave para o fenômeno de extinção do anti-Lula.

Quanto tempo a política brasileira ficará nessa geleia-geral em que o eleitor tem dificuldade de saber quem é quem até mesmo sob o ponto de vista ideológico? Essa pergunta hoje não tem resposta. ;Circunstancialmente, estão todos no mesmo espaço por acomodação política. Lula abriu um caminho e, ao que tudo indica, manterá um longo ciclo de poder. E ficar longe do poder não é da natureza da política brasileira;, completa.

1 - Golpe baixo
Lurian Cordeiro Lula da Silva, 34 anos, foi pivô de uma das principais polêmicas em campanhas presidenciais da história do Brasil. Fruto do relacionamento entre o presidente Lula e Miriam Cordeiro, ela ganhou notoriedade nas eleições de 1989, quando o então candidato Fernando Collor de Mello divulgou entrevista com Miriam afirmando que o petista havia oferecido dinheiro para que ela fizesse aborto quando estava grávida de Lurian. A história foi desmentida posteriormente, mas Collor acabou eleito presidente da República no segundo turno.

Faltam 20 dias para o 1; turno