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Joaquim Roriz está fora das eleições deste ano, mas as mulheres do clã não

Fora da disputa deste ano e impedido pela legislação de se candidatar até 2023, o ex-governador quer transferir seus votos para a mulher e as filhas na tentativa de permanecer como referência política no DF, ainda que indiretamente

Ana Maria Campos
postado em 26/09/2010 09:07
Chegou ao fim um ciclo importante da política no Distrito Federal. Depois de quatro mandatos de governador e uma passagem relâmpago pelo Senado, Joaquim Domingos Roriz (PSC) está sem condições de disputar eleições na capital do país até 2023. Apesar do empate na sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a aplicação da Lei da Ficha Limpa já no próximo domingo, os ministros, em maioria, decidiram que a regra de moralização das candidaturas vale para o pleito de 2014. Dessa forma, o político mais populista da história local, com um eleitorado cativo que representa praticamente um terço dos votos da população do DF, não poderá pleitear um novo cargo eletivo daqui a quatro anos. Uma volta ao cenário só poderá ocorrer em 2026, quando ele terá 90 anos.

Com uma vocação de busca pelo poder, Roriz transformou sua família num clã político pelo qual tenta continuar exercendo influência no jogo de disputas do Distrito Federal e o chamado ;rorizismo;. Com o impedimento de concorrer ao quinto mandato, a mulher, Weslian Roriz (PSC), é a substituta na chapa. Duas das três filhas já mergulharam em campanha. A deputada distrital Jaqueline Roriz (PMN) chegou tímida à Câmara Legislativa em 2007, mas já se ambientou e hoje ganhou traquejo para discursos nos palanques. A caçula, Liliane (PRTB), ensaia os primeiros passos. É candidata a distrital. Pelas pesquisas do grupo rorizista, as duas têm boas chances de se eleger no domingo. A filha mais velha, Wesliane, é a única que não enveredou pelo caminho do pai, embora seja considerada por aliados de Roriz como a mais gabaritada para a função de herdeira política dele.

A escolha de Weslian para suceder Roriz na chapa foi justamente uma forma de ampliar as chances de expansão política. Apesar da herança, o nome forte da família só poderá interferir nos rumos e nas decisões do DF por meio das mulheres da família. Entre os 10 ministros do STF, cinco consideraram que a Lei da Ficha Limpa é constitucional. O relator do recurso extraordinário impetrado pela defesa de Roriz, Carlos Ayres Britto, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Ricardo Lewandowski, além dos ministros Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia e Ellen Gracie, votaram pela aplicação imediata da nova regra de inelegibilidades.

Fim de um ciclo
O ministro Dias Toffoli, embora tenha considerado que a lei não pode restringir candidaturas nestas eleições, descartou todos os outros argumentos de inconstitucionalidade apontados pelos advogados: os princípios da presunção da inocência, da irretroatividade e da violação de ato jurídico perfeito. ;É o fim do cliclo Roriz. Apesar do impasse, o STF nos deu um grande resultado: validou a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa;, afirma o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Mozart Valadares, que acompanhou todo o julgamento em dois dias de sessões do STF.

De acordo com a Lei da Ficha Limpa, quem renunciou ao mandato quando já havia contra si protocolada uma representação por quebra de decoro parlamentar fica inelegível. O período da sanção é de oito anos a contar do fim do mandato ao qual o político abdicou. Transferindo para o caso de Roriz, que deixou o Senado em 2007 para evitar um processo que poderia levar à cassação, o prazo de inelegibilidade começa a contar a partir de fevereiro de 2015 e vale até 2023. Como depois disso só haverá eleições no DF em 2026, Roriz ficará longe da política pelos próximos 16 anos.

Se o registro da candidatura de dona Weslian for deferido pela Justiça Eleitoral, o grupo azul vai testar pela primeira vez a capacidade de transferência de votos de Roriz. Ele já apoiou outros concorrentes ao GDF, Valmir Campelo (PTB) e Maria de Lourdes Abadia (PSDB), mas nunca mergulhou totalmente nessas campanhas. Agora, a mulher pede votos como se fosse o próprio marido. A coligação Esperança Renovada registrou ontem a candidatura de Weslian no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-DF) como ;Roriz;. Na urna eletrônica, o eleitor ao apertar o número 20 da concorrente vai enxergar a fotografia de Joaquim.

Gravação polêmica
Joaquim Roriz renunciou ao mandato de senador em julho de 2007 depois que vieram à tona gravações de conversas entre o então senador e o ex-presidente do Banco de Brasília (BRB) Tarcísio Franklim de Moura sobre a partilha de um cheque de
R$ 2,2 milhões do empresário Nenê Constantino. O diálogo deixou suspeita de que se tratava de um negócio ilícito. Roriz sustentou que os dois discutiram um empréstimo com Constantino para a compra do embrião de uma bezerra.

É o fim do cliclo Roriz. Apesar do impasse, o STF nos deu um grande resultado: validou a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa
Mozart Valadares, presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros

perfil Joaquim Roriz

Veterano em eleições e em escândalos

Lilian Tahan

Com meio século de vida pública, Roriz tornou-se veterano na disputa pelo poder político. Em 1990, enfrentou seu primeiro percalço na Justiça Eleitoral. Teve a candidatura impugnada, pois o Tribunal Regional Eleitoral considerou que o então concorrente, no exercício do governo por indicação do presidente José Sarney, tentava se reeleger, o que, à época, era proibido. A tese de reeleição, no entanto, foi derrubada nos tribunais superiores 32 dias antes do primeiro turno das eleições. A candidatura de Roriz foi autorizada e ele venceu nas urnas.

Depois de quatro anos no comando do Distrito Federal, Roriz foi substituído, em 1994, pela oposição, liderada por Cristovam Buarque, então filiado ao PT. Mesmo afastado do cenário político, ele reconquistou o GDF em 1998, foi reeleito e só deixou o governo em abril de 2006, quando se desincompatibilizou para disputar o cargo de senador da República. Foram anos conturbados, com muitas denúncias sobre grilagem de terras, favorecimento para a construção de condomínios e desvios de dinheiro na construção da Ponte JK.

600 mil votos
As suspeitas desgastaram o patrimônio político de Roriz, fato que foi materializado durante a apuração das eleições ainda em 2002, em que ele venceu o petista Geraldo Magela com uma vantagem de apenas 15,4 mil votos. Ainda n o PMDB, Roriz terminou o duplo mandato com alto cacife no cenário de sucessão. O apoio dele foi cortejado por todos os grupos nas eleições de 2006. Naquele ano, ele foi formalmente avalista da candidatura de Maria de Lourdes Abadia (PSDB), mas fez um acordo de cooperação extraoficial com o então candidato favorito, José Roberto Arruda, com quem manteve uma relação cordial num primeiro momento da administração. Enquanto esteve no PMDB, Roriz e a filha distrital, Jaqueline, chegaram a indicar nomes para o governo.

O rompimento com Arruda ocorreu em 2008, quando Roriz manifestou o desejo de concorrer às eleições deste ano e cobrou do PMDB garantias de que teria a indicação da legenda. O partido, capitaneado no DF por Tadeu Filippelli, que sempre foi um dos aliados mais próximos do ex-governador, contrariou os planos do político, pois estava mais propenso a apoiar a reeleição de Arruda ; que parecia certa antes da Operação Caixa de Pandora. A negativa da legenda resultou não só na saída de Roriz do PMDB em 2009 e no ingresso no PSC, como também na inimizade com Filippelli, a quem trata publicamente por traidor.

Renúncia ao cargo

Com atuação populista, Roriz conquistou a simpatia das pessoas mais humildes, que abrigou em sete cidades criadas durante suas administrações. Mas afastou boa parte da classe média que não concorda com a política de distribuição de lotes e a expansão desmedida da cidade. Entre apoiadores e críticos, o saldo de Roriz foi positivo em 2006, quando ele obteve mais de 600 mil votos e tornou-se senador da República. Com pouco menos de um ano de mandato, no entanto, Roriz renunciou ao cargo mergulhado num dos escândalos mais marcantes de sua carreira pública. Centro de uma investigação conduzida pelo Ministério Público do DF e Territórios, o ex-governador foi flagrado em um grampo telefônico quando conversava com o ex-presidente do BRB Tarcísio Franklin de Moura sobre a partilha de um cheque no valor de R$ 2,2 milhões.

Roriz afirmou, à época, que se tratava de um empréstimo negociado com o amigo e empresário Nenê Constantino para a compra do um embrião de uma vaca, o que fez o episódio ficar conhecido como o caso da bezerra de ouro. A renúncia para escapar do processo de cassação de mandato tornou-se o principal argumento da Justiça Eleitoral para, em agosto deste ano, negar a Roriz o registro da candidatura ao GDF, dando início ao calvário político do ex-governador. Segundo a legislação, ele só poderá voltar a concorrer novamente em 2023, quando estiver com 90 anos.

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