postado em 03/10/2010 06:06
A petista Dilma Rousseff chega ao dia da eleição presidencial com a chance de conquistar a maioria dos 135,8 milhões de eleitores, superando assim o próprio criador, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, nas duas últimas campanhas, precisou disputar o segundo turno eleitoral. Ao longo de uma corrida de 90 dias, Lula viu a pupila assumir uma posição mais confortável do que a dele em 2002 e em 2006.A vitória ainda é uma incógnita, mas o segundo turno é menos provável. Oito anos atrás, Lula chegou em 6 de outubro com mínimas chances de encerrar a corrida pelo Palácio do Planalto num só turno. Na reta final, o então presidente do PT, José Dirceu, enviou carta aos militantes petistas pregando que deveriam se preparar para mais um mês de campanha.
Esse mesmo espírito abateu-se em 2006, talvez com um pouco mais de desânimo do que quatro anos antes. Durante a disputa, Lula chegou a vislumbrar a vitória em primeiro turno. Mas, depois da avalanche de denúncias do escândalo dos aloprados, acabou por disputar uma nova rodada em 29 de outubro. O presidente chegou a evitar o debate promovido pela TV Globo, tentando diminuir o desgaste.
Dilma foi a seis debates, o maior número que um candidato na dianteira já foi na história política do país. Mesmo depois de ser assombrada por denúncias que custaram o cargo da antiga braço direito Erenice Guerra e pelo espectro do envolvimento petista na criação de um banco de negócios na Receita, Dilma tem chances, segundo os institutos de pesquisa, de sair vitoriosa se aproximando do maior índice válido desde a redemocratização: 54,3% alcançados por Fernando Henrique Cardoso em 1994.
Dilma, José Serra, do PSDB, e Marina Silva, do PV, saberão o resultado ainda na noite de hoje. Pelo menos é a expectativa do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A Justiça está equipada com sistemas de transmissão de dados via satélite para permitir que os votos de locais remotos, como aldeias ribeirinhas, sejam computados rapidamente.
Alguns fatores, no entanto, podem jogar água nas aspirações da campanha petista de comemorar, empurrando a votação para 31 de outubro. O principal ponto de interrogação é o crescimento nas últimas semanas de Marina Silva, que conseguiu absorver votos de conservadores e de religiosos.
A aposta de Lula em Dilma foi feita logo depois da reeleição, em 2006. Quando lançou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em janeiro de 2007, o presidente tinha um plano solitário por achar que a ocupante da Casa Civil era a sucessora natural. Em dezembro de 2007, conversou com o marqueteiro João Santana sobre a possibilidade de lançar Dilma. A avaliação foi a de que o perfil técnico e as responsabilidades que ela recém havia abraçado, incluindo a gestão do modelo de exploração do petróleo da camada pré-sal, poderiam se tornar uma aposta certa.
Além das discussões dentro do Planalto, o nome de Dilma foi citado em conversas informais da antiga cúpula petista e entre ministros. Além dela surgiram Patrus Ananias, Fernando Haddad e Jaques Wagner. Em março de 2008 o presidente verbalizou o movimento favorável à então chefe da Casa Civil ao usar um evento do governo no Rio de Janeiro para chamar Dilma de ;mãe do PAC;. O termo virou motivo de chiste num primeiro instante.
Transformação
Gilberto Carvalho, o chefe de gabinete do presidente, foi um dos primeiros a apoiar a ideia do presidente e disse ser possível transformar a ministra de perfil técnico em política aspirante ao Planalto. A partir daí, o PT preparou agenda específica para Dilma durante a eleição municipal para ela abrir caminho na militância e ganhar força. A aceitação caminhou ao lado de certa resistência. Internamente, Lula deu sinais de que a decisão estava tomada, mas ele só pediu que o PT passasse a trabalhar por Dilma no fim de 2008.
A conversa definitiva de estruturação da pré-campanha só ocorreu em setembro de 2009. Um jantar formal no Palácio da Alvorada reuniu Lula, Dilma, Berzoini, Gilberto Carvalho, o ministro Franklin Martins e João Santana para discutir a candidatura. Até então, Lula nunca havia tido uma conversa definitiva com Dilma, jamais um convite, uma convocação. No primeiro semestre de 2009, os ministros palacianos gracejaram com a sisuda ministra da Casa Civil sobre o fato de ela ser tratada como possível futura candidata sem ter conversado com o presidente. Dilma também nunca disse que aceitava ser a candidata. Nenhum dos dois, Dilma e Lula precisou verbalizar o certo. Sinal de que criador e criatura estavam afinados. Resta saber se eleitoralmente ela consegue superar seu mentor hoje ou se levará a eleição para o segundo turno, à imagem e semelhança de Lula.