postado em 03/10/2010 07:25
Algo de muito estranho acontece entre os senadores eleitos para representar o Distrito Federal. Uma espécie de maldição ou carma acomete os parlamentares e não permite à maioria deles completar os mandatos para os quais foram eleitos. Quem não acredita em superstição, pelo menos, deve concordar que é uma grande coincidência o fato de apenas duas pessoas terem conseguido chegar ao fim dos oito anos no Senado Federal. Desde a primeira legislatura em que um político da capital federal passou a integrar aquela Casa, de 1987 a 1991, 10 senadores foram escolhidos pelos brasilienses, mas por motivos diferentes, 70% acabaram abrindo lugar aos suplentes. Além disso, nenhum deles conseguiu se reeleger.O Senado é composto por 81 membros e renovado parcialmente de quatro em quatro anos. Cada unidade da Federação tem três assentos, com mandatos de oito anos. A cada eleição, parte deles é renovada. Neste ano, os eleitores do DF deverão eleger dois senadores para o lugar de Cristovam Buarque (PDT), que busca a reeleição, e de Adelmir Santana (DEM), que assumiu a vaga no lugar do ex-vice-governador Paulo Octávio (DEM).
Os primeiros parlamentares eleitos por Brasília foram Roberto Pompeu de Souza Brasil (PMDB), João Assis Meira Filho (PMDB) e Maurício Corrêa (PSDB). Para acertar a contagem feita para a substituição no Senado, o terceiro mais votado, Pompeu de Souza, teve mandato de apenas quatro anos. Ele morreu cinco meses depois de deixar o cargo. O lugar já estava ocupado por Valmir Campelo (PTB), que abandonou a cadeira dois anos antes do prazo para assumir vaga como ministro do Tribunal de Contas da União, sendo substituído por Leonel Paiva.
Maurício Corrêa também deixou o Senado para se tornar ministro, mas do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele já havia se licenciado para assumir o Ministério da Justiça no governo de Itamar Franco (1992-1994) e saiu apenas com a nomeação para o STF. Na ausência de Corrêa, a vaga ficou com Pedro Teixeira (PP). Ainda no cargo, ele teria se envolvido em uma tentativa de grilagem de terras. Teixeira teria sido o autor de um bilhete ao então governador Joaquim Roriz (à época no PMDB) sobre a partilha de uma área pública invadida nas proximidades do Palácio da Alvorada.
Quem quase conseguiu cumprir todo o período parlamentar foi Lauro Campos (PDT). Ele assumiu a função em 1; de fevereiro de 1995, aos 66 anos, mas morreu a apenas 18 dias do fim do mandato. Ele sofreu um infarto em 10 de outubro de 2002, no plenário do Senado. Levado às pressas ao hospital, não precisou ser operado, mas ficou muito debilitado e morreu em 13 de janeiro do ano seguinte. Em seu lugar, foi nomeado o advogado Ulisses Ridel (PSDB).
Escândalos
Os políticos do DF conseguiram dar maus exemplos no Senado Federal. O empresário Luiz Estevão (PMDB) deveria permanecer no parlamento de 1999 a 2007, mas conseguiu ser o único senador cassado da história do país. Um ano após a posse, Estevão se envolveu com o juiz Nicolau do Santos Neto em um suposto esquema de desvio de verbas na construção do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo. Ele perdeu o cargo, por 52 votos a 18, por quebra de decoro parlamentar e está inelegível até este ano.
O episódio da cassação rendeu outro momento vexatório para a população local. José Roberto Arruda, eleito pelo PSDB em 1995 e líder do governo na Casa, orquestrou junto a Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) a violação do painel eletrônico para identificar os votos dos colegas na cassação de Estevão. Arruda fez um discurso no plenário negando envolvimento no episódio. Poucos dias depois, voltou à tribuna para confessar o delito. Acabou renunciando em 27 de maio de 2001. No lugar, assumiu Lindberg Cury (PFL), e no de Estevão, o empresário Valmir Amaral (PMDB).
Nas eleições seguintes, em 2002, foram eleitos Paulo Octávio (PFL) e Cristovam Buarque (PT). O petista chegou a exercer o cargo de ministro da Educação no governo Lula. Tempos depois, deixou o partido e ingressou no PDT. Apesar de não ter ficado todo o tempo no cargo, Cristovam pode ser o terceiro a cumprir o mandato até o fim, caso permaneça até dezembro.
*Colaborou Lucas Tolentino
O eleitor fala
Como você se sente diante das mudanças políticas do DF e o que espera destas eleições?
Pedro Campos, 18 anos, universitário de publicidade, morador do Guará II
;É primeira vez que vou para as urnas, mas me lembro que sempre foi do mesmo jeito. Eles prometem, mas não cumprem. As denúncias que surgiram recentemente confirmam a falta de compromisso dos políticos. A corrupção vai sendo combatida pela Justiça aos poucos. A população também pode ajudar nessa limpeza, elegendo as pessoas certas. Vou fazer a minha parte e escolher as pessoas em quem confio. Tenho certeza de que alguns candidatos podem fazer as coisas melhorarem.;
Evangelos Christakou, 56 anos, arquiteto, morador do Lago Sul
;O meu receio era que se elegesse alguém da turma que comandava o DF na época do surgimento dos escândalos. Essa fase passou. Agora, tenho esperança de que ganhem candidatos comprometidos com um governo de qualidade. Confio que teremos resultados positivos e um mandato de renovações e mudanças para Brasília. Alguns pontos importantes, como a questão de invasões de área pública, foram deixados de lado e refletem o descaso que a cidade tem sofrido.;
Vinícius de Araújo, 29 anos, médico, morador do Lago Norte
;As eleições não me trazem qualquer tipo de esperança. Alguns candidatos que desfrutam da preferência da população podem trazer de volta todo aquele esquema de corrupção que chocou Brasília e o país. É preciso que seja feita uma reforma em todos os órgãos públicos e uma sindicância geral para barrar as fraudes que possam existir. Vou usar o meu voto para escolher os candidatos que prometem trabalhar nessa linha e pagar para ver os resultados.;
Maria Lopes, 48 anos, empregada doméstica, moradora do P Sul (Ceilândia)
"Foi uma pouca vergonha ver tanto dinheiro indo pro bolso de corruptos. Quando as filmagens começaram a aparecer, senti que a situação ficou realmente insustentável. Tenho fé de que as minhas escolhas serão as mesmas da maioria dos eleitores e só trarão melhorias para os moradores do DF. Merecemos moradias com mais estrutura e sei que alguns candidatos trabalharão para trazer isso."
Renúncias, quase uma tradição
Por sua vez, Paulo Octávio renunciou ao mandato em dezembro de 2006 para assumir a vice-governadoria do DF. No fim de 2009, teve o nome envolvido na investigação da Caixa de Pandora. No início do ano, ele assumiu o GDF para substituir o então governador, José Roberto Arruda. Ele não suportou a pressão e, diante de tantos escândalos, renunciou.
O último senador eleito foi o que menos permaneceu no cargo. Joaquim Roriz assumiu a cadeira em fevereiro de 2007 e a ocupou por apenas seis meses. A crise teve início com o vazamento de um diálogo entre ele e o presidente do Banco de Brasília sobre a partilha de um cheque do empresário Nenê Constantino no valor de R$ 2,2 milhões. Roriz teria ficado com R$ 300 mil, mas alegou ter sido apenas um empréstimo para a compra de um embrião de uma bezerra. Em virtude disso, o PSol solicitou a abertura de um processo por quebra de decoro parlamentar. Roriz renunciou antes da abertura do caso a fim de fugir de uma possível cassação. Quem passou a ocupar a vaga foi Gim Argello (PTB).