Eleicoes2010

Real forte pode trazer crise para o país

Mundo se debate para pôr fim à guerra cambial. Produtos brasileiros perdem competitividade e rombo nas contas externas bate recorde

postado em 10/10/2010 10:56
Altamir Lopes, do Banco Central, acredita que o significativo incremento do país ajudará a atrair dólares de melhor qualidade, voltados para a produçãoO segundo turno das eleições presidenciais no Brasil será decidido em meio a uma guerra cambial. Com o dólar derretendo mundo afora frente a outras moedas, nações exportadoras passaram a travar uma batalha diária para conter a supervalorização de suas divisas e, assim, não perderem espaço no comércio internacional. Com o dólar no menor nível em dois anos, a fatura dessa disputa já está custando caro ao atual governo, mas o problema explodirá realmente no colo do próximo presidente da República. Os postulantes ao cargo, no entanto, são superficiais nas propostas acerca do tema ; o Brasil fechará este ano com o maior deficit nas contas externas desde 1947 ; e coube ao mercado financeiro especular sobre as possíveis linhas de atuação dos candidatos.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tomou os cuidados necessários para não atiçar a fúria do candidato do PSDB, José Serra, em relação ao governo e não alimentar os possíveis ataques à atual política econômica, que, no entender do tucano, está sendo responsável por uma ;desindustrialização do país;. Nos últimos dias, a administração Lula baixou várias medidas para conter a excessiva valorização do real, como a duplicação ; de 2% para 4% ; do Imposto sobre Operação Financeira (IOF) incidente na entrada de dólares no país. Mas, até agora, nada surtiu efeito.

Ciente de que a bomba está prestes a explodir, a candidata petista Dilma Rousseff tratou de difundir o discurso de que o derretimento do dólar é um problema estrutural, devido à fragilidade das economias desenvolvidas em sair do atoleiro no qual se meterem desde setembro de 2008, com o estouro da bolha imobiliária dos EUA.

Para os analistas, a guerra cambial colocou os presidenciáveis em uma encruzilhada, seja quem for o vencedor na disputa a ser travada no 31 de outubro próximo. A se confirmar a necessidade de o Banco Central subir juros no máximo até o segundo trimestre de 2011 para conter a inflação ; de acordo com projeções do mercado ;, a enxurrada de dólares só aumentará, valorizando ainda mais o real e tirando a competitividade dos produtos nacionais no exterior.

Na avaliação de Eduardo Velho, economista-chefe da Prosper Corretora, no caso de Serra ser eleito, o tucano intervirá mais fortemente no câmbio e, de certo modo, seu discurso de austeridade fiscal estaria alinhado com as possíveis soluções para a depreciação do dólar. ;Ele tem um viés que defende um câmbio mais competitivo. Tem uma linha de pensamento que defende um aumento de exportações. Para isso, ele é a favor de corte de gastos e de juros;, diz.

Principal pensador econômico do grupo de Serra, Geraldo Biasoto, diretor executivo da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), tem dito que o BC abandonou o mercado de câmbio em 2003, quando passou a comprar dólares apenas no fim do dia e somente para compor reservas. Segundo o crítico tucano, o banco assumiu uma postura passiva. Mas, a principal queixa do PSDB é em relação às disparidades existentes na política econômica do governo Lula. Enquanto a equipe do BC atua para reduzir a inflação a níveis confortáveis para a população, o Ministério da Fazenda segue em linha oposta, ampliando gastos e liberando em ritmo acelerado crédito para consumo.

Já a petista Dilma Rousseff afirma que para o Brasil superar o problema cambial é preciso aumentar a competitividade da indústria. Ela também defende uma reforma tributária e a diminuição do endividamento público.

Regras para intervenção
Em clima de beligerância, líderes do setor financeiro que participaram da reunião do Fundo Monetário Internacional estão discutindo uma nova cartilha de ;regras da estrada; para a política cambial, estabelecendo diretrizes para intervenções e reformas. Foi o que informou ontem o ministro das Finanças do Canadá, Jim Flaherty. Ele admitiu, porém, que nenhum acordo será fechado agora para pôr fim à guerra cambial. Se houver algum avanço, eles sairão dos próximos encontros do G-20 e das nações em desenvolvimento, em Seul (Coreia do Sul).

Consumo deve esfriar
A despeito do discurso, a petista Dilma Rousseff sabe que a margem para erro é pequena devido aos intensos gastos públicos do governo Lula. De acordo com o Banco Central, o crescimento do país cairá de 7,5% em 2010 para 4,5% no próximo ano. Até 2014, essa expansão se dará de forma sustentada, na casa dos 5% ao ano. Nas projeções do Partido dos Trabalhadores, esse incremento no Produto Interno Bruto (PIB) não pode ser inferior a 5%. Caso contrário, encolher o endividamento será realmente necessário e bastante doloroso ao possível governo Dilma, que tem tendência para desembolsos elevados.

Com a enxurrada de dólares que inunda o país, o deficit externo crescente poderá ser resolvido, na avaliação do chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, com o investimento estrangeiro direto se expandindo acima do PIB. Mas, nessa situação, também seria necessário desacelerar o consumo das famílias e do governo, e por tabela, as importações, o que faria a taxa básica de juros (Selic) cair gradualmente e o câmbio se depreciar sem causar problemas inflacionários.

Ao pesar as possíveis formas de atuação dos dois candidatos, a conclusão de analistas é uma só: eles usarão ferramentas semelhantes caso sejam eleitos. ;É tudo um grande achismo. Não temos clareza de nenhum dos dois lados. O que de fato eles poderiam fazer, além do que o governo já faz hoje, aparentemente é pouco;, avalia Mariana Costa, economista-chefe da Corretora Link Investimentos.

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