Luiz Carlos Azedo
postado em 19/10/2010 08:44
Assessor especial da Presidência da República e responsável pela elaboração do programa de governo da petista Dilma Rousseff (PT), Marco Aurélio Garcia garante que a prioridade da petista, caso vença as eleições, será mesmo acabar com a pobreza. E que, para isso, é fundamental manter a trajetória de recuperação do salário mínimo: ;A política salarial do governo teve efeito mais importante do que o próprio Bolsa Família;. A petista deve divulgar o documento nesta semana. Intitulado Os 13 compromissos programáticos de Dilma Rousseff para debate com a sociedade, o texto não faz menção a antigas propostas do PT, como taxação de grandes fortunas, legalização do aborto e descriminalização dos movimentos sociais.Nesta entrevista concedida ao Correio, Marco Aurélio confirma que a convocação de uma Constituinte exclusiva é uma tese do programa de governo, cujos objetivos seriam as reformas eleitoral e partidária. Ele também defende a formação de uma frente ampla de partidos para dar sustentação à nova administração. ;Ao mesmo tempo, Dilma não pode prescindir de algo que é a sua atribuição. Se fizer uma escolha errada, é ela quem vai pagar, esse é o problema;.
A campanha da Dilma fala em continuidade. Mas um novo governo não se faz só com continuidade...
As coisas que foram obtidas até agora ; independentemente dos resultados que elas trazem em si para a sociedade, a economia e a política ; são fundamentalmente um piso a partir do qual você pode ousar outras tarefas. Agora, todo mundo fala em educação, saúde, combate à violência, melhorar a infraestrutura, entre outros. Mas, se nós não levarmos em consideração as coisas que foram feitas, dificilmente teremos um patamar para avançar.
Isso inclui as realizações de Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, na área econômica?
O governo Fernando Henrique teve uma coisa importante, que foi controlar a inflação. No entanto, ele não conseguiu construir um modelo econômico sustentável. Tanto isso é verdade que ele não teve os ganhos que nós tivemos do ponto de vista de associar o crescimento à distribuição de renda, mas também de associar o crescimento à própria estabilidade macroeconômica.
Onde é que um eventual governo de Dilma avançará no sentido de garantir níveis de crescimento estáveis e mais elevados?
Nós vamos manter, em primeiro lugar, este modelo, que foi um êxito. Os níveis de crescimento de 2008 até a eclosão da crise e os de 2010 são muito elevados e se beneficiam do saneamento anterior que nós fizemos. Se você pegar os níveis de crescimento entre 2003 e 2010, eles são bastante superiores ao nível do governo Fernando Henrique. Mas eu não quero fazer esse tipo de comparação. Criamos condições para que esse crescimento vá se acentuando nos próximos anos. Esse modelo inclui a redução da vulnerabilidade externa e a distribuição de renda, que não foi apenas um bibelô na cristaleira. Foi um elemento essencial.
Falando em reforma política, o que é a proposta de Dilma?
A reforma política deverá ser objeto de um acordo mais amplo, porque, entre outras coisas, nos partidos que estão na base do governo da Dilma, não há uma convergência absoluta. Sobre financiamento público de campanhas eleitorais, eu acho que há um razoável acordo e não é pouca coisa. Porque isso aí desvincula poder econômico da política, e já é um grande avanço. Agora, quanto a mecanismos de representação, tenho simpatia, em princípio, pela tese da lista fechada. Tem alguns setores que falam em combinar isso com o distrital misto. Pode ser.
A Dilma tem uma base muito heterogênea. Isso não dificulta?
Pelo contrário. Eu penso que os partidos se darão conta rapidamente de que serão os principais beneficiados. A grande verdade é que não é possível um partido que não é unido, que só tenha apetite e não tenha cabeça. Não é que não possa funcionar, pode até estabelecer um pacto, mas ele perde peso. Bem ou mal, embora tenha muita briga interna, o PT tem peso porque tem mais ou menos um corpo de definições, militância etc. Todos os partidos brasileiros estão sofrendo essa tentação hoje. E eu acho positivo.
Essa ideia de fazer uma Constituinte exclusiva para aprovar a reforma política não tira o gênio da instabilidade política da garrafa?
Pode ser. Mas, se aparecer uma fórmula melhor, nós aceitamos.
O Congresso não poderia aprovar as emendas à Constituição? Não é arriscado ficar à mercê de maiorias eventuais?
Quando o PT colocou, há um ano e meio, a tese de uma Constituinte exclusiva, ainda que eu considerasse que era uma tese muito difícil de emplacar, eu disse ;bom, vamos por aí;. Nós tentamos há algum tempo um acordo multipartidário, mas não foi possível. A situação agora é outra.
E a reeleição?
Eu acho que essa é uma tese em aberto. Sim ou não. Para acabar com a reeleição, é preciso ter um mandato maior.
Como será a composição do governo se Dilma vencer as eleições?
Veja bem, o governo atual realizou um programa. Eu não tenho nenhum reparo a nenhum ministério pela sua composição política. Eu posso dizer que tal ministério funcionou melhor que o outro, funcionou muito bem, mas isso é outra coisa. Eu não acho que deixou de funcionar bem ou mal porque o seu titular ou a sua equipe pertencia a tal partido político. No próximo governo, nós vamos ter, sem dúvida nenhuma, certo impacto na composição do Congresso porque Dilma governará com base parlamentar mais estável do que se teve até agora.
Vencer é o suficiente para Dilma conseguir formar o governo a partir de escolhas pessoais, ou ela deve aceitar as indicações dos partidos aliados?
Acho que ela vai trabalhar com critérios ecléticos. Deve ser uma composição partidária com base nos resultados das eleições. Ao mesmo tempo, Dilma não pode prescindir de algo que é a sua atribuição. Se fizer uma escolha errada, é ela quem vai pagar, esse é o problema.