Ivan Iunes
postado em 01/11/2010 09:06
Brasília e São Paulo ; José Serra admitiu, às 22h40 de ontem, uma derrota que começou a ser desenhada há quase um ano. Desde que o ex-governador paulista titubeou sobre as chances de sucesso da própria candidatura, ainda no fim do ano passado, pouco antes de decidir desafiar a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas urnas, a segunda tentativa do tucano em chegar ao Palácio do Planalto começou a ganhar contornos de fracasso. Pressionado pelos números ; e pela ameaça de retorno de Lula em 2014 ;, Serra entendeu que, aos 68 anos, teria a chance derradeira de chegar à Presidência. Abandonou a reeleição certa ao Palácio dos Bandeirantes para tentar o cargo para o qual havia ;se preparado a vida inteira;. Derrotado ontem, deve manter grande influência sobre os rumos do PSDB nos bastidores, mas dificilmente retornará ao papel de protagonista.No campo da costura política, o fracasso pode ser explicado, em especial, à divisão interna na aliança em torno de Serra. Os dois principais partidos da oposição, PSDB e DEM, nunca sentaram à mesma mesa desde o início da corrida eleitoral. A centralização excessiva do comando de campanha nas mãos dos tucanos fez com que a sigla ficasse isolada na tarefa de eleger o candidato. Pelo quadro mostrado nas urnas na noite de ontem, o revés revelou-se na incapacidade de Serra em ganhar terreno nos três principais nós detectados ao fim do primeiro turno: a ampla vantagem de Dilma Rousseff (PT) no Nordeste, em Minas Gerais e no Rio de Janeiro.
A estratégia de escalar o senador recém-eleito Aécio Neves (PSDB-MG) e o novo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), para visitar diversos estados serviu mais para pavimentar uma futura candidatura de ambos à Presidência do que para reduzir a vantagem da petista. Para o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), a demora do partido em escolher o presidenciável também teve contribuição decisiva para a derrota. ;Agora, o próximo nome do PSDB à Presidência será escolhido dois anos antes do pleito, ou seja, em 2012;, anunciou Guerra.
Logo depois de votar no Colégio Santa Cruz, em Pinheiros, zona oeste da capital paulista, ao meio-dia de ontem, as primeiras pesquisas de boca de urna entregues ao tucano já apontavam a derrota. Ele assistiu ao fim da apuração na casa do secretário de Cultura paulista e colaborador da campanha, Andrea Mattarazzo. Mesmo com o resultado sendo considerado irreversível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) às 20h, ele só fez a primeira tentativa de falar com a adversária para admitir a derrota duas horas depois, quando Dilma fazia o discurso de vitória. Às 22h40, sem ter conseguido falar com a presidente eleita, ele fez o pronunciamento oficial da derrota, que durou 16 minutos. Somente depois da fala, Serra conversou com a petista.
Papel restrito
Com o naufrágio do projeto de chegar à Presidência, Serra deve se inserir na oposição em papel mais restrito ao partido, semelhante ao exercido pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no próprio PSDB e pelo ex-senador Jorge Bornhausen, no DEM. Os dois atuam hoje como eminências pardas nas legendas. Com o novo revés, Serra perde espaço na sigla para lideranças mais novas e com discurso moderno, como Aécio e Alckmin.
A projeção inicial de políticos tucanos é que a dupla deve ser a responsável, nos próximos anos, por imprimir um novo modelo de oposição. Além dos dois, esse processo de renovação ainda terá o suporte dos governadores oposicionistas recém-eleitos, já que, no Congresso, essas legendas ficaram ainda mais enfraquecidas. É exatamente a partir do comando nos estados que a oposição deve trabalhar, já a partir de janeiro, para conseguir um bom resultado nas eleições municipais de 2012. Somente com a eleição de um número satisfatório de prefeitos o caminho para um retorno ao Palácio do Planalto daqui a quatro anos estará pavimentado.
Além de Alckmin e Aécio, emergem das urnas como governadores claramente oposicionistas e com força no quadro político Marconi Perillo (PSDB-GO), Beto Richa (PSDB-PR) e Raimundo Colombo (DEM-SC). ;Diminuímos nossa posição tanto na Câmara quanto no Senado, e DEM, PSDB e PPS perderam quadros importantes nas duas Casas. Essa discrepância entre as forças é um golpe muito forte, ruim para a oposição, para o governo e até para a democracia. Os partidos terão de se refundar, moldar novos programas e novas imagens para sobreviver;, opina o líder da minoria na Câmara dos Deputados, Gustavo Fruet (PSDB-PR).
CONFIANÇA ABALADA
>> Ullisses Campbell
São Paulo ; Ao meio-dia, José Serra (PSDB) votou em São Paulo e disse que estava confiante na vitória. Em discurso logo após votar, falou em alternância de poder. O tucano levou a família ao Colégio Santa Cruz, no bairro Alto de Pinheiros, além de correligionários e do governador paulista eleito em 3 de outubro, Geraldo Alckmin (PSDB). ;O povo vota, escolhe e decide. O que vamos fazer agora é aguardar essa decisão. O elemento fundamental é a confiança que eu sentia nas ruas, no abraço das pessoas;, disse Serra, sob aplausos.
Ao votar, também em São Paulo, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) disse que, independentemente de quem ganhasse a eleição, o PT e o PSDB deveriam começar a trabalhar por uma reforma política. ;Já está mais do que na hora;, ressaltou. Ele também comentou as declarações de Dilma sobre a criação de alianças após as eleições para viabilizar o processo político. ;O governo Lula e o PT foram dinamitadores de pontes;, criticou. E continuou: ;O governo Lula se caracterizou pela intolerância. Espero que isso mude;, disse, antecipando a vitória de Dilma.
MARINA RECORRE A PROVÉRBIO
>> Carolina Khodr
A senadora Marina Silva (PV-AC) parabenizou, na noite de ontem, a petista Dilma Rousseff pela vitória na corrida pelo Palácio do Planalto e por ser a primeira mulher eleita para o cargo. ;Aquela que foi durante todo esse processo eleitoral a candidata de uma parte, a partir deste momento passa a ser a escolhida pela sociedade brasileira para, como presidente da República, representar todos nós;, disse. Marina afirmou que vencer as eleições no segundo turno significa ser escolhido duas vezes, e desejou boa sorte à futura presidente citando um provérbio da Bíblia. ;Que ela possa ter a simplicidade das pombas e a sagacidade das serpentes;, disse.
A ex-adversária de Dilma ainda refutou a possibilidade de voltar ao Ministério do Meio Ambiente. ;Contribuí durante cinco anos e cinco meses com o governo do presidente Lula, com conquistas e desafios importantes, mas já dei a minha contribuição. Acho que a melhor forma de contribuir agora é voltando para a sociedade e lutar pela sustentabilidade ambiental do nosso país, além do grande desafio da educação de qualidade;, afirmou, acrescentando que voltará a atuar no Senado pela aprovação de projetos que considera importantes e contra os que acha nocivos, como o que pretende alterar o Código Ambiental.
Após 31 de janeiro, quando acaba seu mandato parlamentar, Marina pretende continuar atuando à frente do Instituto Democracia e Sustentabilidade. A ex-presidenciável não revelou em quem votou no segundo turno das eleições. ;A minha posição de ser independente foi a melhor para a democracia.;