Festival de Brasilia 2016

Confira as críticas dos filmes 'Elon não acredita na morte' e 'Antes o tempo não acabava'

Ricardo Daehn
postado em 26/09/2016 07:33
Elon não acredita na morte ###



Um retrato coerente, e pleno de convencimento, de um surto mental centraliza a dinâmica do longa Elon não acredita na morte. Com afiadas unhas e dentes, o ator Rômulo Braga vive o protagonista Elon, circundado por dúvidas e por um quê de desatino, na busca pela mulher Madalena (Clara Choveaux) que, na trama, está sumida.

A realidade é esquiva no longa que acompanha de perto os corpos dos atores. Na vistosa fotografia de Matheus Rocha, ao lado de assumida inspiração no cinema romeno, Alves Jr. bebe do enervante registro que remete ao cinema francês dos irmãos belgas Dardene, de Robert Guédiguian (A cidade está tranquila) e do polêmico e multicultural Gaspar Noé (Irreversível).

[SAIBAMAIS]No mesmo compasso de espera do ótimo Para minha amada morta, visto em Brasília no ano passado, Elon... conta com produção elaborada, além de som marcante, a cargo de Pablo Lamar. Do rastro de tipos do operariado, fica o contato com casamentos instáveis, desamparo e desconfiança. Vigia, na profissão, Elon perde de vista, numa agitação crescente, o foco da própria vida. Tateando, ele se apega a um passado, em muito, esvanescente. Tenso e intenso.

Antes o tempo não acabava ###



;Não esqueça quem você é; é frase soprada nos ouvidos do protagonista do longa-metragem Antes o tempo não acabava, de Sérgio Andrade e Fábio Baldo. Identidade e aceitação na quebra de paradigmas, com lufada de uma trilha sonora incrementada até por Kraftwerk, dá a partida. Ruptura é palavra de ordem para o protagonista Anderson (Anderson Tikuna), descolado da aldeia de origem.

No enfrentamento com a tradição, pela liberdade pessoal, Anderson, acuado ocasionalmente, por rituais que já não lhe fazem sentido, esbraveja: ;Vocês (índios) preferem recordar do que viver;. Forte, o roteiro leva assinatura de Sérgio Andrade, bem torneado pela direção de arte múltipla (na qual dialogam culturas indígenas e brancas). Com trilha refinada, o longa tem camadas sonoras, no belo trabalho de profissionais como Nicolas Hallet, de O som ao redor e Aquarius.

Adepto de caneta (no lugar de flechas) como instrumento de luta, o periférico povo indígena, na borda de Manaus, usa camiseta do Kiss, remodela tradicionais cortes de cabelo ao estilo penico, e não encoraja lida com ONGs. Instável, no apego a raízes e rituais, Anderson perambula, vazio; bebe, de cerveja a caldeirão contemporâneo de elementos (rap e cosméticos, por exemplo), ao tempo em que naturalmente, e sem militância, adere a todas vertentes de amor e sexo. Original, é um belo poema de descobertas.

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