Festival de Brasilia 2017

Crítica de 'Era uma vez Brasília' do diretor Adirley Queiroz

Longa trouxe um olhar político da periferia para o festival

Ricardo Daehn
postado em 26/09/2017 13:50
Cena do filme 'Era uma vez Brasília'

Vira e mexe, o cinema brasileiro oferta um filme obscuro, configurado no instinto, no impulso, e sem premeditado traçado racional. Um mal necessário. No caso do celebrado cineasta Adirley Queirós, autor de Era uma vez Brasília, apresentado no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, o ruído parece mais avassalador, visto que o novo longa vem na sequência do monumental Branco sai, preto fica. Comunicativo e popular, aquele título apontava para as maiores das expectativas.

A contundência do promissor cineasta, desta vez, fica difusa e rebate uma dispersão de discurso. Adirley mapeia uma sociedade controlada, em compasso de espera e pouco ativa. Alô, alô W/Brasil! Não acaso, o protagonista chama-se WA4, possivelmente. Ainda seguindo a letra de Ben Jor, que o siderado Brasil se cuide com o disco voador: no caso do filme, há uma nave, em formato de cubículo, que carrega WA4, disposto a justiçar brasileiros contra a casta política.

Com estética que bebe de games como Mortal Kombat e de animações sombrias à la He-Man, o filme examina o desmanche de uma utopia. Desfilam, na telona, engenhocas de ferro-velho, supostamente, avançadas em termos de transporte (outra crítica à retração e solavancos do setor automobilístico?).

A aventura intergaláctica de um viajante do tempo, que compreende acertos de citação, como no caso da Millennium Falcon (a nave de Star Wars) e usos de grades para os personagens da trama (grades incorporadas à própria arquitetura da capital, como apontam as amarelas passarelas de ferro), peca pela falta de transparência no propósito.

Num ambiente soturno, emplastado de discursos dissonantes (a fita acopla literal contraposição das vozes de Dilma e de Temer), Adirley deixa o espectador desnorteado, quando não, sonolento. Paranoia, sexismo, uma comunicação gutural (com uso de criativos objetos de cena) e um estado permanente de conspiração despontam nos primorosos momentos finais do longa. Derrota, apatia e reações vazias, por fim, estouram na tela.

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