Agência France-Presse
postado em 18/01/2010 17:38
PORTO PRÍNCIPE - O bairro comercial do centro de Porto Príncipe, destruído pelo terremoto, se encontra nesta segunda-feira (18) em poder dos saqueadores, que ante a ausência de autoridades roubam lojas destruídas, constatou um jornalista da AFP.
Na "Rua de centre" os saqueadores encontram uma jóia rara: uma loja de tecidos que ainda não foi roubada. Uma dezena de homens mascarados escalam as ruínas para entrarem na loja. Os grandes rolos de tecido são lançados aos seus companheiros de cima de uma montanha de escombros.
A dez metros do lugar, três vigilantes particulares apontam suas escopetas em direção aos ladrões, para dissuadi-los de atacar a loja de roupa que protegem, uma das poucas que ainda estão de pé.
Os saqueadores vão embora tranquilamente com os rolos de tecido nos ombros. Em uma rua adjacente, soa um disparo. Correm. E voltam, com calma, para terminar o trabalho com total impunidade. Um segundo disparo tampouco os dissuade em seu delito.
Os tecidos roubados estão estampados com a bandeira dos Estados Unidos, dólares e desenhos rosas.
Nos arredores dos ministérios e do palácio presidencial - situados no bairro comercial atingido pelo terremoto - não se vê nenhum policial, socorristas ou soldados norte-americanos que patrulham a periferia da capital em veículos Hummer.
A uns cem metros do Champs-de-Mars, onde milhares de haitianos encontraram refúgio e o odor da morte nas ruínas se faz insuportável, outros saqueadores, desta vez mais jovens, se escondem entre as fendas de um edifício destruído.
Um homem se arrasta entre os escombros de concreto. Com uma das mãos chega a extrair, de uma em uma, até três caixas de papelão que atira na rua.
Seus amigos se lançam sobre o novo tesouro: sapatos novos ainda envoltos em suas capas de plástico. Há sandálias e cópias de chuteiras de futebol da marca Nike. Cinco homens disputam o pacote, que cai vazio em poucos segundos.
No cruzamento das ruas "Rue du centre" e "Rue du Miracle", outro homem se fere com um equipamento de música novo ainda na embalagem, frente a sua companheira, que coleta garrafas de xampu dentre as ruínas de um local de estética.
Um homem mais velho assiste a cena enojado. "Quero recuperar meus bens em minha casa mas os ladrões me impedem. Já me roubaram quase tudo: meu arroz, meus espaguetes, meu leite. Vou fazer tudo para salvar algo assim que possível", conta desanimado.
Outro habitante do bairro se armou com uma tábua de madeira. Ordena que os saqueadores deixem o lugar, sem êxito. "É muito perigoso entrar nas ruínas das lojas que podem desabar. E não há que roubar os bens dos proprietários", explica Cheneil Basile, de 24 anos.
Na frente dele, um jovem revende um dos pares de chuteiras Nike que acaba de roubar. Pede 100 gourdes, o equivalente a três dólares. "Toda a minha família morreu. Já não tenho nada para viver", disse Donald, vestido com uma camiseta azul, calças pretas e sandálias brancas. "Não posso comer nada. É por isso que estou vendendo os sapatos".