Natal 2013

Chefs de restaurantes falam sobre as lembranças de Natal

O Correio visitou as cozinhas de três chefs da cidade para descobrir quais são as memórias sensoriais e sentimentais que os inspiram na hora de preparar a ceia.

postado em 06/12/2013 20:00
Histórias repletas de amor, simplicidade, cheiros deliciosos saindo do fogão das mães. Esses são alguns ingredientes que tornam o Natal tão marcante para os chefs dos restaurantes Versão Tupiniquim, Fabiana Pinheiro; Santé 13, Divino Barbosa, e Due Trattoria e Bruschetteria, Carlos Silva. As lembranças trazidas por essa data são o tempero das ceias natalinas.
Ceia colaborativa

Fabiana Pinheiro é a cabeça de uma família luso-piauiense que celebra o Natal com total empolgação. As festas em sua casa comportam até 60 familiares e agregados, e cada um deles leva um prato para a festa. O resultado é um Natal com sabores que fogem da tradição, mas que enchem a noite e a memória da família de amor e carinho.

O Correio visitou as cozinhas de três chefs da cidade para descobrir quais são as memórias sensoriais e sentimentais que os inspiram na hora de preparar a ceia.

;Eu amo o Natal. Minha família tem sangue português e nordestino, então as noites do dia 24 são sempre com festança e mesa muito farta. Na nossa mesa, por exemplo, não tem peru, nem fio de ovos. Tem a leitoa, o bobó de camarão, o carneiro assado na padaria. Como a celebração é sempre na casa da minha família e como gosto de cozinhar, mal consigo tempo para sentar e comer com calma. No ano passado, passei a festa com a mesma roupa que eu estava durante toda a tarde na cozinha. É tradição da nossa família cada um levar um prato. Até porque tem ano que chega a vir 60 convidados, entre tios, primos, cunhados, primos dos cunhados. Vira uma enorme confraternização.

Tia Beth leva a rabanada; eu sempre faço a torta de coco; tia Vera leva o que chamamos de bacalhau de pobre, com batata palha e bacalhau desfiado; vovó Mariquinha, a ambrosia; tio Arsumar tempera o carneiro; tia Lenice leva o leitão assado, e minha mãe, dona Elsinha, prepara o bobó de camarão e a salada de berinjela frita. Quem não sabe cozinhar leva frutas e bebidas. As crianças quase sempre apresentam uma atração e, à meia-noite, rezamos um pai-nosso e cantamos Noite Feliz. É muito emocionante. Só de cozinhar para vocês o bacalhau e a torta de coco, eu me emocionei na cozinha. É como um filme que passa na nossa cabeça. Os cheiros mexem muito com a emoção e com as memórias da gente".

Natal com sotaque português

Carlos Silva, o chef português do Due Trattoria e Bruschetteria, mora há apenas quatro anos no Brasil. E não é apenas o charmoso sotaque português que revela suas raízes. Há também a nostalgia e as lembranças de um Natal diferente do brasileiro, com neve acumulada na janela da sala da avó, em uma cidadezinha medieval portuguesa.

O Correio visitou as cozinhas de três chefs da cidade para descobrir quais são as memórias sensoriais e sentimentais que os inspiram na hora de preparar a ceia.

[SAIBAMAIS] ;Nasci em Mirandela, no norte de Portugal. Uma cidade medieval, que fica entre duas montanhas, na região de Alto trás-os-Montes. Nosso Natal começava com a expectativa da neve. Eu, meus irmãos e meus primos pendurados na janela, esperando a primeira neve de dezembro. No dia 24, era uma festa. A criançada ia para as ruas fazer guerra de bola de neve, montar bonecos ou escorregar nas ladeiras cobertas com neve com pedaços de papelão. Na noite de Natal, a principal atração era a ceia. Desde menino, eu gostava de participar do processo com minha mãe e minha avó. Via-as preparando tudo e queria ajudar. Elas faziam o bacalhau com batata, cenoura e outros legumes. Comíamos no dia 24 e também no almoço do dia 25.

Tudo acontecia na casa da minha avó. A tradição por lá também era a do peru, mas preferíamos fazer um bom pernil, um contrafilé ou um carneiro. E sempre o bacalhau. Depois, comíamos o bolo rei, que é uma tradição bem portuguesa. É um bolo que lembra um panetone, mas numa forma de pudim. Na hora de preparar o bolo, se jogava uma fava e um brinde na massa, um anel ou alguma outra coisa pequena. Na hora de comer, todo mundo torcia para pegar o pedaço com o brinde. E quem tirasse a fava tinha que levar a comida do ano-novo. Era muito divertido. Aqui em Brasília, comemoro o Natal com minha esposa, que é brasileira, filhos e amigos. Comemos muito, trocamos presentes. Cada um leva um prato. Ainda sonho em levar toda a minha família para um Natal em Portugal, em Mirandela. Quem sabe no ano que vem.;

Leitoa e tutu de feijão no interior de Goiás

Divino cresceu em um sítio com 12 irmãos. Se a casa já era cheia de gente no dia a dia, no Natal, era uma farra. A festa era marcada pela simplicidade e religiosidade da família, e pelos sabores e cheiros das comidas que eles cultivavam e produziam. Há 10 anos trabalhando nas noites de Natal e preparando as ceias de centenas de brasilienses, neste ano, ele finalmente partilhará a ceia à moda antiga. Com a família de Mimoso de Goiás e seus deliciosos quitutes preparados no forno à lenha.

O Correio visitou as cozinhas de três chefs da cidade para descobrir quais são as memórias sensoriais e sentimentais que os inspiram na hora de preparar a ceia.

;O Natal começava quando eu e meus 12 irmãos saíamos no dia anterior para matar a leitoa. A gente escolhia a melhor leitoa, matava e fazia o preparo dela para ser assada. Ela passava a noite secando e no dia seguinte ia pro forno a lenha. Sou do interior de Goiás, de uma família humilde. Nosso Natal não tinha presente, decoração. O foco da festa ficava sempre na ceia e na missa. Era o dia de comer muito bem, de usar os ingredientes nobres e as coisas que a gente plantava. Tinha de tudo naquela época no nosso quintal. Eu sempre gostei de participar de todo o processo. Queria ver minha mãe temperando, cortando os legumes, fritando a farofa, usando aquelas panelas enormes. Gostava de ajudar, de ficar ali no meio de todos aqueles cheiros.

A leitoa pronta, a maionese, a farofa de abacaxi, o tutu de feijão e o kibebe de mandioca com linguiça. Pratos simples, mas muito especiais. Como somos 13 irmãos, a casa sempre estava cheia. Mas, no Natal, apareciam os primos, os tios, os avós. Era uma festa. Aos poucos, fui entendendo o significado da data, a importância da união. Como sou chef, há pelo menos 10 anos não ceio com minha família. Este ano, o restaurante não abre na noite do dia 24, então vou comer a leitoa fresquinha com a família toda em Mimoso de Goiás. Mas não fugirei da tradição de passar o dia na cozinha.;

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