De todas as tradições do Natal, estar em família é, certamente, a mais forte. Porém, dependendo da quantidade de parentes e da distância entre eles, fazer com que todos se reúnam ou pelo menos dar aquela passadinha para cumprimentá-los pode virar um verdadeiro desafio. Em alguns casos, a noite da véspera passa a ser uma peregrinação que envolve duas, três e até quatro paradas. Geralmente, estão entre os adeptos do Natal itinerante filhos de pais separados, casados, namorados e pessoas com famílias grandes, em que mais de um parente faz questão de receber a família.
Participar de várias ceias tem algumas peculiaridades que precisam ser levadas em consideração. Decidir em qual lugar passar primeiro, por exemplo. "Há que se fazer uma escolha que atenda as preferências da maioria dos membros da família", pondera Lígia Marques, consultora em etiqueta e marketing pessoal. Se há crianças, ela explica, é bom se informar se em alguma das opções de festa haverá Papai Noel e qual é o horário programado para a aparição. O horário da ceia também pode variar, uma vez que nem todo mundo espera a meia-noite para começar a comer.
Ana Flávia Furtado, consultora de imagem, estilo e etiqueta social, frisa que não há uma regra geral para a escolha do itinerário. Para não ter problema, ela sugere prestar atenção a fatores como o grau de intimidade e de importância do anfitrião, a idade de quem dará a festa e a localização do evento. "Pessoas mais idosas normalmente se cansam mais cedo. O mesmo vale para o anfitrião que tenha crianças. Alguns preferem também deitar mais cedo ou ficam incomodados com o barulho." A forma de deslocamento e o local dos eventos também podem ser usados como critério. "Porém, é sempre bom lembrar que as pessoas mais importantes devem ser deixadas por último, pois, assim, você não terá a preocupação de ficar verificando o horário de saída para a outra ceia."
O período do Natal para Isadora Afrodite Ferreira, 35 anos, é como uma gincana. Quando criança, a assessora costumava passar na casa dos melhores amigos dos pais. Os dois se separaram em 2003 e a família precisou encontrar uma alternativa para reunir todo mundo. "A solução que minha mãe achou foi fazer uma festa antecipada no dia 20 e, no dia 24, eu e meus irmãos íamos para a casa dos amigos da família com meu pai", explica. Os filhos do padrasto também compareciam ao Natal antecipado.
Quando Isadora se casou, a coisa ficou ainda mais complicada. Ela e o marido, Fabiano Toni, 46 anos, tiveram que encontrar uma maneira de passar o Natal com as duas famílias. A partir daí, outro fator entrou na equação: a família do marido, Fabiano Toni, 46 anos, mora em São Paulo. Como não seria possível estar em dois estados diferentes, resolveram antecipar o Natal: em meados de dezembro, antes da festa na casa da mãe de Isadora, eles pegam um avião e rumam para terras paulistanas. "Assim, ainda conseguimos fugir da loucura dos aeroportos no fim do ano", completa Isadora.
Este ano, o Natal terá uma nova configuração. Com a morte do pai de Isadora e com o nascimento do primeiro filho dela, em vez da casa dos amigos paternos, o Natal também será comemorado na casa dela. O itinerário está apertado: por volta do dia 15, o casal e o bebê vão para São Paulo. No dia 20, ocorre o Natal antecipado na casa da mãe dela e, no dia 24, a ceia é na casa do casal. "Já estou com algumas ideias para a festa aqui em casa. Pensei no cardápio todo, que vai ter peru, pernil e farofa de castanha portuguesa", anima-se.
A publicitária Camila Eira Fleury dos Santos, 24 anos, também adaptou as festas de Natal quando a filha nasceu. Não que só então ela tenha começado a se dividir para a ceia: desde sempre, Camila conta que sua família tinha pelo menos duas festas para ir. Para não complicar muito, o jantar da véspera era na casa da avó paterna, e o almoço do dia 25, na da avó materna, Maria Alba Eira. Quando a pequena Maria Luiza veio ao mundo, porém, surgiu a necessidade de dividir a noite de Natal também entre a família do marido.
Há três anos, o casal faz a maratona natalina: primeiro, a festa na casa da família dela e, depois, na dele - na ceia e também no almoço do dia seguinte. "Nós combinamos isso porque os dois se preocupam em estar com todo mundo, já que é uma data importante", justifica. Ela conta que não há grandes estresses quanto a isso, nem mesmo quando chega a hora de ir de uma comemoração para outra. "Eles entendem que tem que ser rapidinho". Para dar tempo de ir a todos os lugares, os dois têm uma programação bem esquematizada. A primeira parada é na casa da família dela. O casal fica até a ceia e depois vai para a casa dos familiares dele. "Na minha família, tem muita criança, então, é tudo mais cedo", explica Camila.
Ana Flávia aconselha que o convidado, ao chegar no local, avise ao anfitrião que se sente muito honrado com o convite e que não poderia deixar de ir à festa, porém, terá que se ausentar um pouco mais cedo para ir a uma outra ceia também muito importante para ele. A consultora acrescenta: "Jamais deixe uma festa intimista como uma ceia de Natal sem se despedir do anfitrião. A famosa ;saída à francesa" chega a ser desrespeitosa com o anfitrião".
No caso dos irmãos Pedro e Victor da Cunha, 18 e 15 anos, respectivamente, o Natal passou a ser itinerante depois que os pais se separaram, há quatro anos. Desde então, os dois vão para a casa da avó paterna e, depois, para a da avó materna. "Foi tranquilo decidir para qual irmos primeiro, mas na casa da minha avó paterna tem pouca gente, então, fica estranho quando vamos embora", conta Pedro. Victor explica a programação: por volta das 18h, os irmãos vão para a casa da avó materna. Às 21h, vão para a outra festa. "Nunca rolou nenhum tipo de ciúme entre elas, as duas só querem que a gente vá", explica o estudante.
[SAIBAMAIS]
Com todos os familiares presentes, a festinha na primeira casa conta com cerca de nove pessoas. Sem Pedro, Victor e o outro irmão, sobram apenas seis pessoas para a hora da ceia. A festa da outra avó, a materna, tem mais convidados: 15. Por enquanto, Pedro está com "apenas" esses dois Natais fixos, mas talvez tenha que encontrar mais um espacinho na agenda natalina para a família da namorada. "Comecei a namorar este ano, mas ainda não conversamos sobre o Natal."
Jarbas de Souza Junior, 31 anos, também é filho de pais separados. O administrador conta que, desde que se lembra, passa o Natal em dois lugares diferentes. Na época, o pai era o motorista e carregava Jarbas e a irmã para a casa da ex-mulher. "Na casa do meu pai, tudo acontecia antes da meia-noite. Íamos na minha mãe depois, porque o pessoal era mais animado, então, a festa começava mais tarde."
Até hoje, ele faz o mesmo trajeto: primeiro a casa do pai, depois, a da mãe, Celma Aparecida de Andrade, e da avó materna, Antônia Pereira de Souza. Mesmo quando está namorando, a casa da mãe é sempre o ponto final da viagem."É onde tem mais gente e é a festa que vai até mais tarde. Lá, as coisas começam à 1h." Os outros primos seguem o exemplo e migram para a casa da mãe de Jarbas, todos os anos, depois da meia-noite. Além da barricada de parentes, há a ceia. Para ele, essa é a questão mais complicada de resolver, já que fica feio não comer nem uma rabanada na casa da primeira avó. "Você tem que comer em todos os lugares, senão a pessoa pode achar que você está fazendo uma desfeita."
A hora de deixar a primeira festa é também a hora do ciuminho de avó. Também não é legal chegar atrasado na primeira festa e ficar só um pouquinho. "Acho uma falta de educação ficar 10 minutos. É melhor nem ir." Mas ele admite: o trajeto é cansativo. Ter que atravessar a cidade para chegar de uma festa a outra e não poder relaxar, com medo de se atrasar, são os fatores que fazem com que a noite se torne complicada. "Já aconteceu de eu ter que ir na casa da família da namorada, que era longe. Praticamente passei na frente da casa da minha avó materna e depois tive que voltar. Tomei uma multa meia-noite. Foi meu presente de Natal."
A divisão de tempo entre sua família e a da namorada fez com que Thiago Moura da Silva, 24 anos, resolvesse juntar as duas para uma única festa. Mas por dois natais não foi tão fácil. Junto há quatro anos, o casal não conseguiu fugir do vaivém no início. Às 19h, ela ia se encontrar na casa dele e, às 21h, já tinha que voltar para a festa da própria família. Por volta das 23h30, era a vez de ele ir para lá. No terceiro ano de namoro, eles tentaram algo diferente. "Levei minha família para a casa dela", resume o gerente comercial. O esquema deu tão certo que eles pretendem repetir este ano. Para Thiago, a mistura acontece de maneira natural. "Minha família é pequena aqui em Brasília." Já a família da namorada é grande e acolhedora: quase 40 pessoas reunidas. A proximidade das duas casas é outra vantagem. Se alguém ficar cansado, é só ir embora, sem nem precisar de carro.