postado em 29/07/2012 10:08
Advogados de defesa dos réus do mensalão elaboram uma estratégia orquestrada para atrasar a fase inicial do julgamento. Além do risco de anunciar a troca de defensores em cima da hora, como mostrou ontem o Correio, os representantes dos acusados vão levantar questões processuais logo após a leitura do relatório do ministro Joaquim Barbosa, etapa que antecede a sustentação oral dos advogados, para tumultuar o cronograma dos trabalhos. A defesa do empresário Marcos Valério já tem pronta sua estratégia: o advogado Marcelo Leonardo informou que apresentará questão de ordem contestando a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para julgar Valério, pois ele não tem foro privilegiado e a análise da ação penal pela corte cercearia seu direito constitucional ao duplo grau de jurisdição, caso seja condenado. ;Três réus alegaram a incompetência do Supremo Tribunal Federal. O Supremo vai ter que examinar essa questão, colocada também pelas defesas de José Genoino e José Roberto Salgado. Se não for examinada após a leitura do relatório, será apresentada na forma de questão de ordem;, afirma Marcelo Leonardo, advogado de Valério.Representantes dos réus e ministros da corte ouvidos pelo Correio afirmam que a estratégia de orquestração entre os advogados de defesa dos réus sem foro privilegiado é dada como certa no julgamento do mensalão. Levantando questões de ordem e elementos processuais, os defensores esperam forçar manifestações individuais dos ministros, debate que pode se estender por todo o primeiro dia de julgamento, atrasando a sustentação da acusação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Com o artifício, os advogados de defesa apostam que uma discordância irreconciliável entre os ministros sobre a questão de ordem apresentada force o pedido de vista de algum dos 11 magistrados, adiando o julgamento por tempo indeterminado.
Na prática, a questão de ordem questionando a competência do Supremo em julgar réus sem foro privilegiado tem o mesmo efeito da petição apresentada pelo advogado Márcio Thomaz Bastos solicitando o desmembramento do processo. O advogado de Marcos Valério afirma, no entanto, que quando a corte rejeitou a petição analisou o pedido somente do ponto de vista processual. ;Não foi avaliado na Constituição. Nós temos precedentes de todos os ministros (sobre o duplo grau de jurisdição). Foi formulado o pedido de desmembramento, colocado fora do plano da Constituição.;
Caixa dois
Supostas falhas na denúncia do Ministério Público serão usadas pela defesa de Marcos Valério para ;derrubar; elementos da acusação. Limitações no texto que aborda o crime de lavagem de dinheiro na peça do Ministério Público se tornaram trunfos nas mãos dos advogados do empresário para aliviar a pena de Valério em caso de condenação. De acordo com Marcelo Leonardo, a tese de lavagem de dinheiro não se sustentará no decorrer do julgamento por erro da denúncia do MP. Segundo o advogado do empresário, a peça não estabelece qual é o ;crime antecedente;.
Até maio deste ano, as leis estabeleciam que a caracterização do crime de lavagem de dinheiro ocorreria após um primeiro julgamento apontando o dinheiro em questão como oriundo de fontes ilegais. ;A lei estabelece quais são os crimes antecedentes, de onde viria o dinheiro. A lavagem teria que ter a operação de ocultação do dinheiro e indicar os recursos voltando depois à economia formal;, alega o advogado.
Um magistrado ouvido pelo Correio corroborou a argumentação do advogado de Valério. ;É muito difícil você ter uma lavagem se o Ministério Público não indicar o crime antecedente. No caso da Ação Penal n; 470, o crime antecedente está sendo julgado com o crime de lavagem.; Assim, o advogado avalia que o empresário poderia receber condenação apenas por crime eleitoral. ;O que nós entendemos que aconteceu foi o caixa dois de campanha.;
Nós temos precedentes de todos os ministros (sobre o duplo grau de jurisdição). Foi formulado o pedido de desmembramento, colocado fora do plano da Constituição;
Três réus alegaram a incompetência do STF. O Supremo vai ter que examinar essa questão, colocada também pelas defesas de José Genoino e José Roberto Salgado;, Marcelo Leonardo, advogado de Marcos Valério
Toffoli mantém suspense
A cinco dias do começo do julgamento, o ministro Dias Toffoli ainda não anunciou se participará da análise do caso. Ele tem manifestado a pessoas próximas que pretende julgar o mensalão, mas sofre pressões para se declarar suspeito ou impedido, por ter sido advogado do PT, assessor da Casa Civil durante a gestão de José
Dirceu ; um dos réus do processo ; e, ainda, por ser companheiro da advogada Roberta Rangel, que atuou na defesa de um dos réus do mensalão.
A estratégia é protelar
Táticas de protelação miram brechas na denúncia da Procuradoria-Geral da República
Questões de ordem
Logo após o ministro Joaquim Barbosa fazer a leitura do relatório, advogados de defesa podem apresentar questões de ordem levando o presidente da sessão, ministro Ayres Britto, a decidir sobre a colocação dos representantes dos réus. A questão de ordem pode ser discutida por todos os ministros, atrasando a sustentação da acusação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel.
Falhas processuais
No momento da sustentação oral, os advogados de defesa poderão apontar ;falhas; na tramitação do processo, alegando que o direito de defesa foi cerceado por falta de inclusão de informações que consideram relevantes, como relatórios financeiros e relato de testemunhas.
Lavagem de dinheiro
A defesa enxerga falhas na denúncia em relação à tipificação do crime de lavagem de dinheiro. Segundo os defensores, a acusação não aponta o ;crime antecedente;, elemento jurídico indispensável ao conceito de crime de lavagem de dinheiro até maio deste ano, quando a legislação foi alterada.
Corrupção passiva
Réu do mensalão que não tinha cargo público foi denunciado por corrupção passiva, o que constituiria uma falha, de acordo com a defesa.
Origem do dinheiro
Defensores dos réus apontam brechas em relação à definição da origem dos recursos que abasteciam o suposto esquema do mensalão. Os advogados reforçarão que a maioria do dinheiro apontado na denúncia é de empresas privadas.
Origem dos recursos
Fragilidade das investigações sobre o esquema do mensalão, a blindagem política da CPI criada para apurar as denúncias de cooptação de parlamentares, e a centralização do processo no Supremo Tribunal Federal (STF) podem favorecer a defesa dos 38 réus que serão julgados a partir de quinta-feira. Brechas na acusação, que não conseguiu comprovar todos os pontos da origem do dinheiro, acendem entre os defensores a esperança de derrubar a tese de que o esquema foi abastecido por recursos públicos.
Entre os pontos cegos que os advogados dos réus comemoram está a ausência de provas envolvendo transações diretas entre o Banco do Brasil e empresas comandadas por réus da ação penal e a predominância de bancos privados no cerne do suposto esquema. A decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que considerou regular um contrato entre a agência DNA Propaganda e o Banco do Brasil, que teria rendido R$ 4,4 milhões a Marcos Valério em descontos obtidos com fornecedores, também pesa na sustentação de ausência de dinheiro público no esquema. O Ministério Público apresentou recurso da decisão do TCU.
Outra fragilidade a ser explorada pelos advogados é a caracterização de crime de formação de quadrilha em relação ao chamado ;núcleo político; do mensalão. O conceito de formação de quadrilha é alcançado quando pelo menos quatro acusados admitem ter agido em conjunto buscando uma mesma finalidade ou a denúncia apresenta provas dessa atuação. No caso do núcleo financeiro, informações de movimentação de recursos podem atestar que alguns dos réus agiram em grupo, mas, em relação ao núcleo político, a confirmação carece de elementos mais sólidos, alegam advogados de defesa. (JJ)